quinta-feira, 13 de agosto de 2015

COMO SURGIU A NOÇÃO DE NÚMERO

Como surgiu a noção de número

Profª Denise F B Marquesin

Profª Maria da Graça Torres Bagne


IFRAH, Georges. Os Números: História de uma grande invenção. 10ª ed. São Paulo: Globo, 2001. p. 31-71.


Há cerca de 10.000 anos atrás...
Os pastores de ovelhas tinham necessidades de controlar os rebanhos. Precisavam saber se não faltavam ovelhas. Como os pastores podiam saber se alguma ovelha se perdera ou se outras haviam se juntado ao rebanho?

Alguns vestígios indicam que os pastores faziam o controle de seu rebanho usando conjuntos de pedras. Ao soltar as ovelhas, o pastor separava uma pedra para cada animal que passava e guardava o monte de pedras.


Quando os animais voltavam, o pastor retirava do monte uma pedra para cada ovelha que passava. 

Se sobrassem pedras, ficaria sabendo que havia perdido ovelhas. Se faltassem pedras, saberia que o rebanho havia aumentado. Desta forma mantinha tudo sob controle.
Uma ligação do tipo: para cada ovelha, uma pedra chama-se, em Matemática, correspondência um a um. 




Correspondência um a um
●Fazer correspondência um a um é associar a cada objeto de uma coleção um objeto de outra coleção. Como você vê, o homem resolveu seus primeiros problemas de cálculo usando a correspondência um a um. A correspondência um a um foi um dos passos decisivos para o surgimento da noção de número.

Os primeiros registros de números
● Nos museus de todo o mundo há inúmeros objetos com marcas, pertencentes a épocas antigas. São pedaços de pau com talhos, pedaços de barro com marcas e cordas com nós. Existem cavernas em cujas paredes podemos ver marcas talhadas ou pintadas.

●Isso parece indicar que o homem sentiu necessidade de registrar o total de objetos que contava. E como se fazia isso? Para registrar o total de objetos ele usava também a correspondência um a um: uma marca para cada objeto 








Como contar sem saber contar
Imaginemos um grupo de indígenas. Eles ainda não são capazes de conceber os números abstratos, mas conseguem contornar o problema, obtendo resultados satisfatórios quando se trata de quantidades relativamente reduzidas. Para tanto, recorrem a todo tipo de meios concretos. Mas na maioria das vezes eles “contam visualmente” segunda a técnica corporal a seguir:

Toca-se sucessivamente um por um os dedos da mão direita a partir do menor, em seguida o pulso, o cotovelo, o ombro, a orelha e o olho do lado direito. Depois se toca o nariz, a boca, o olho, a orelha, o ombro, o cotovelo e o pulso do lado esquerdo, acabando no dedo mindinho da mão esquerda. Chega-se assim ao número 22. Se isto não basta, acrescenta-se primeiramente os seios, os quadris e o sexo, depois os joelhos, os tornozelos e os dedos dos pés direito e esquerdo.
O que permite atingir dezenove unidades suplementares, ou seja, 41 no total.






Uma expedição militar foi recentemente levada a cabo por estes grupos indígenas contra uma aldeia vizinha que se revoltou, submetendo-se em seguida. Ao fim da reunião do conselho de guerra, o chefe decide exigir uma reparação, e encarrega vários de seus comandados de cobrar o resgate junto aos habitantes desta aldeia.

“Para cada guerreiro perdido no combate” – diz o chefe _ “deverão dar-nos tantos colares de pérolas quantos existem desde o dedo mindinho da mão direita até o olho do mesmo lado. Em seguida, tantas peles quantas existirem desde o dedo mínimo da mão esquerda até a boca. Finalmente, tantos cestos de alimento quantos podem haver o mindinho da mão direita até o pulso esquerdo.”

O chefe explica então aos seus homens que a punição infligida aos rebeldes foi fixada em:



●10 colares de pérolas
●12 peles de animais
●17 cestos de alimentos
●Para cada guerreiro morto em combate.


Nesta batalha, nossos indígenas perderam dezesseis homens. Evidentemente, eles não conhecem o número dezesseis, mas dispõem no caso de um meio infalível para determiná-lo. Antes da expedição, cada guerreiro coloca um pedrinha num monte e a retira na volta. Assim, as pedras restantes correspondem exatamente ao número de perdas no combate.


Um dos enviados do chefe pega então dezesseis pedrinhas, que são substituídas por um monte de pauzinhos de mesmo número, mais fáceis de transportar. O chefe verifica se seus mensageiros assimilaram e guardaram bem todas as instruções, e eles partem para a aldeia rebelde.


A noção de ordem já está aí presente, mesmo não sendo verdadeiramente conhecida.


Registrando grandes quantidades
Depois que o homem teve a ideia de fazer agrupamentos para facilitar a contagem, surgiu o problema de registrar os agrupamentos usando algum tipo de marca. Veja porque isso era necessário:
Imagine que uma pessoa usasse traços para representar cada ovelha. Por exemplo: um homem tinha | | | | | | | | | | | | | | | | | | | | | | | ovelhas.
Não seria nada prático, não é mesmo? Talvez a solução encontrada tenha sido separar grupos de marcas.
Um homem tinha | | | | | | | | | | | | | | | | | | | | | | | | ovelhas
Neste caso, as marcas estão agrupadas de dez em dez.


A invenção da base
Dez, a base mais comum.
Como a humanidade aprendeu a contar nos dedos da mão, esta preferência quase geral pelos grupos de dez foi comandada por este “acidente da natureza” que é a anatomia das nossas duas mãos.

  
Imaginem um rebanho de 627 animais. Como contar?

Uma outra solução: a base cinco

Encontrada em diversas regiões da África e da Oceania e que vários comerciantes indianos da região de Bombaim ainda empregam até hoje para atender às necessidades mais correntes.




Vinte dedos para contar.
Outros povos preferiram adotar a base vintesimal.


Foi, por exemplo, o caso dos malinké do Alto Senegal e da Guiné, dos yébu e dos ioruba da Nigéria, dos banda da África central, dos tamara do Orinoco (aos pés do planalto das Guianas na Venezuela), dos esquimós da Groelândia, dos aino da ilha Sakhalin 9próximo às costas da àsia oriental, entre o mar do Japão e o mar de Okhotsk), dos maias e dos astecas da América Central pré-colombiana etc.






Muito mais difundida é a base duodecimal, que, se tivesse evoluído, poderia ter dado origem a uma numeração completa de base doze, o que nos teria dado um sistema mais cômodo que a nossa numeração decimal, sendo o número doze divisível ao mesmo tempo por 2, 3, 4 e 6.
Foi empregada em antigos sistemas comerciais, dos quais temos o testemunho das nossas dúzia e grosa (dúzia de dúzias), que ainda conservamos para os ovos e as bananas, por exemplo.

A enigmática base sessenta:
Esta base, difícil de guardar na memória, foi primeiramente empregada pelos sumérios, que tinham o hábito de contar por base sessenta e potências de 60. Em seguida foi transmitida aos matemáticos e astrônomos babilônios (sucessores dos sumérios na Mesopotâmia), que dela se serviram para elaborar um avançado sistema de numeração, antes de nos legá-la por intermédio dos astrônomos gregos e árabes.


Nossa própria cultura guardou seus vestígios, pois a utilizamos ainda para exprimir a medida do tempo em horas, minutos e segundos, ou a dos arcos e dos ângulos em graus, minutos e segundos. 


O sistema de numeração egípcio
Essa ideia de agrupar marcas foi utilizada nos sistemas mais antigos de numeração.
Os egípcios da Antiguidade criaram um sistema muito interessante para escrever números, baseado em agrupamentos.
  

O sistema de numeração romana


Vamos lembrar como eram escritos alguns números:



●Para não repetir 4 vezes um mesmo símbolo, os romanos utilizavam subtração.

●Observe alguns números que seriam escritos com 4 símbolos e como os romanos passaram a escrevê-los:



Em alguns relógios o 4 são quatro pauzinhos (IIII) e não com um pauzinho e um “v” (IV),  porque IV também é a primeira sílaba de IVPITER, Júpiter em latim. E como Júpiter era o deus mais importante dos antigos romanos, achavam desrespeitoso usar essas iniciais para designar o número 4, que nem é um número muito importante. Por isso, eles escreviam o 4 com quatro I.
Somente na Idade Média é que começou a escrever IV, mas os relógios mantiveram a tradição romana antiga.

A civilização do Vale do Indo

O rio Indo está localizado onde hoje é o Paquistão: próximo à Índia atual.
Em seu vale, há mais de 4000 anos, foram construídas várias cidades, com ruas, calçadas, sistemas de fornecimento de água e canalizações de esgoto. Possuíam piscinas para banhos públicos e casas construídas com tijolos de barro. Seus habitantes praticavam um comércio bastante intenso, inclusive trocando mercadorias com outros povos.
·Como não poderia deixar de ser, numa sociedade com este nível de organização, os habitantes da região possuíam uma linguagem escrita e um sistema numérico. Entretanto, este não era ainda o sistema de numeração que usamos hoje. Muitos séculos se passaram até que os hindus desenvolvessem o sistema de numeração decimal. Não há muitos documentos sobre a Matemática conhecida pelos hindus da Antiguidade. Por isto é impossível saber, com exatidão, quando e como os hindus chegaram ao sistema de numeração decimal posicional. Ao que parece é que, por volta do século V, eles já o utilizavam.
·Entretanto, uma coisa é certa: os hindus tiveram contato com muitas outras civilizações. Influenciaram-nas e foram influenciadas por elas. O princípio posicional, presente na numeração hindu, também aparece no sistema numérico dos babilônios, e sabemos que houve contato entre esses povos. A base dez, que é uma das características do sistema hindu, também era usada pelos egípcios e chineses. Isto pode ser explicado pelo fato de todos terem dez dedos nas mãos, mas, talvez, também seja devido ao intercâmbio que houve entre eles.
·O zero, que é outra característica importante da numeração dos hindus, talvez também não seja uma criação deles. Há indícios de que, na fase final da civilização babilônia, já era usado um símbolo para o nada.
·Entretanto, um grande mérito deve ser creditado aos hindus: o de reunir estas diferentes características num mesmo sistema numérico.
·O intercâmbio cultural entre os povos da Antiguidade também se revela no uso do ábaco, cuja origem não é conhecida, mas que, sabemos, era usado pelos chineses, hindus e romanos. É certo que o ábaco teve grande importância na criação do nosso sistema de numeração, como procuramos mostrar na segunda parte da lição.

O Império Muçulmano e a difusão da numeração hindu
Enquanto os hindus, que habitavam o vale do rio Indo e tinham contatos com muitos outros povos, iam pouco a pouco juntando os fios e preparando a trama do nosso sistema de numeração; grandes acontecimentos tiveram início na Península Arábica.
Esta era uma região desértica habitada principalmente por tribos nômades que se deslocavam em grandes caravanas entre os poucos centros de comércio existentes. Nesse ambiente viveu Maomé, o criador da religião islâmica (ou religião muçulmana) no início do século VII da era cristã.
Maomé não foi apenas líder religioso, mas também grande chefe guerreiro que submeteu ao seu governo toda a Península Arábica. Seus sucessores empreenderam muitas guerras de conquista, ampliando a área de influência do islamismo e estabelecendo um grande império que, um século depois da morte de Maomé, atingia, a leste, a região do rio Indo e, a oeste, o norte da África e a Península Ibérica.
Os árabes não foram apenas guerreiros. Ao contrário, tiveram um papel importantíssimo no campo da cultura e da ciência, especialmente na Matemática. A grande extensão do Império Islâmico permitiu aos estudiosos árabes entrar em contato com as mais variadas culturas.
 Seus sábios estudaram e traduziram as obras dos filósofos e matemáticos gregos, preservadas na célebre biblioteca de Alexandria, no Egito. Não fossem as traduções para o árabe, essas obras teriam sido perdidas para sempre com a destruição daquela biblioteca, no final do século VII.
No extremo oriental do seu império, os árabes entraram em contato com a cultura hindu e interessaram-se especialmente pela astronomia, a aritmética e a álgebra, muito desenvolvidas naquela civilização. Estudaram sobretudo o sistema numérico hindu, reconhecendo sua simplicidade e praticidade. Esses conhecimentos já eram dominados pelos hindus há vários séculos, mas não haviam se difundido entre os povos do ocidente.
Os árabes, que haviam penetrado na Europa e dominavam a Península Ibérica, foram os introdutores da ciência oriental na Europa medieval. Entre os séculos VIII e XIII, por iniciativa dos árabes, foram criadas muitas universidades e bibliotecas, desde Bagdá, no Oriente Médio, até Granada e Córdoba, na atual Espanha. Nesses centros, as obras dos hindus foram traduzidas para o árabe e difundidas entre os estudiosos.

Entretanto, na Europa Medieval houve grande resistência à introdução do saber oriental, sobretudo ao sistema de numeração hindu e à maneira de realizar as operações nesse sistema. Estabeleceu-se um conflito entre os partidários do velho ábaco, herança dos romanos, e os que reconheciam as vantagens do método hindu. Esse confronto ficou conhecido como a contenda entre "abacistas" e "algoristas", e terminou com a vitória final destes últimos, já em pleno Renascimento.

"al-Khowarizmi" virou "algarismo"
Os dez símbolos do nosso sistema de numeração são chamados dígitos ou algarismos. Dizemos, por exemplo, que 507 é um número de três dígitos ou três algarismos.
A palavra dígito vem da palavra latina "digitus", que significa dedo. É claro que isto tem a ver com o uso dos dedos nas contagens.
É curiosa a origem da palavra algarismo. Durante o reinado do califa al-Mamun, no século IX, viveu um matemático e astrônomo árabe, que se tornou famoso. Chamava-se Mohammed ibm-Musa al-Khowarizmi. Ele escreveu vários livros. Num deles, intitulado "Sobre a arte hindu de calcular", ele explicava minuciosamente o sistema de numeração hindu. Na Europa, este livro foi traduzido para o latim e passou a ser muito consultado por aqueles que queriam aprender a nova numeração. Apesar de al-Khowarizmi, honestamente, explicar que a origem daquelas idéias era hindu, a nova numeração tornou-se conhecida como a de al-Khowarizmi. Com o tempo, o nome do matemático árabe foi modificado para algorismi que, na língua portuguesa, acabou virando algarismo.



O sistema numérico criado pelos romanos foi usado na europa durante muitos séculos. Isto aconteceu, sobretudo, devido ao grande poder da igreja católica apostólica romana durante toda a idade média (do século v ao século xv, aproximadamente). O sistema de numeração decimal, como vimos, chegou à europa, levado pelos árabes, por volta do século viii. Portanto, quando a numeração hindu chegou à europa, os europeus estavam acostumados com a numeração romana.
para nós, que conhecemos os dois sistemas, é muito fácil perceber as enormes vantagens que o sistema numérico decimal tem sobre a numeração romana. Isto poderia nos fazer concluir que a numeração hindu-arábica tenha sido prontamente aceita pelos europeus, em vista de sua superioridade. Entretanto, não foi isso que aconteceu.
foram necessários alguns séculos para que as novas idéias triunfassem definitivamente. Isto só aconteceu no século xvi.
durante muitos anos, uma verdadeira batalha foi travada entre os adeptos do novo sistema e os defensores do sistema antigo. Os numerais hindu-arábicos chegaram a ser proibidos nos documentos oficiais, mas eram usados na clandestinidade.
a perseguição, contudo, não conseguiu impedir a disseminação do novo sistema, que se impôs pelas suas qualidades.

A resistência ao novo
O sistema numérico criado pelos romanos foi usado na europa durante muitos séculos. Isto aconteceu, sobretudo, devido ao grande poder da igreja católica apostólica romana durante toda a idade média (do século v ao século xv, aproximadamente). O sistema de numeração decimal, como vimos, chegou à europa, levado pelos árabes, por volta do século viii. Portanto, quando a numeração hindu chegou à europa, os europeus estavam acostumados com a numeração romana.
Para nós, que conhecemos os dois sistemas, é muito fácil perceber as enormes vantagens que o sistema numérico decimal tem sobre a numeração romana. Isto poderia nos fazer concluir que a numeração hindu-arábica tenha sido prontamente aceita pelos europeus, em vista de sua superioridade. Entretanto, não foi isso que aconteceu.
Foram necessários alguns séculos para que as novas idéias triunfassem definitivamente. Isto só aconteceu no século xvi.
Durante muitos anos, uma verdadeira batalha foi travada entre os adeptos do novo sistema e os defensores do sistema antigo. Os numerais hindu-arábicos chegaram a ser proibidos nos documentos oficiais, mas eram usados na clandestinidade.
A perseguição, contudo, não conseguiu impedir a disseminação do novo sistema, que se impôs pelas suas qualidades.

 Mudanças na escrita dos algarismos
●Antes da invenção da imprensa, que ocorreu no século XV, os livros eram copiados manualmente, um a um. Como cada copista tinha a sua caligrafia, durante os longos séculos de copiagem manual as letras e os símbolos para representar números sofreram muitas modificações. Além disso, como o sistema de numeração criado pelos hindus foi adotado pelos árabes e passado aos europeus, é natural que, nesse percurso, a forma de escrever os dez algarismos sofresse alterações.
●Por volta do século IV, os hindus representavam os algarismos assim:


 Não havia ainda um símbolo para o nada.
 No século IX, já com o zero, a representação evoluiu para:


 No século XI os hindus representavam os dez dígitos assim:


 No mesmo século XI, os árabes que estavam no Ocidente representaram assim:

                                       
 No século XVI os árabes orientais empregavam esta representação

                                        
Veja as formas usadas pelos europeus nos séculos XV e XVI:

                                           

 Hoje a representação é esta:

                                                                      2 3 4 5 6 7 8 9 0


Após a invenção da imprensa, as variações foram pequenas. Os tipos foram sendo padronizados. Mas, mesmo assim, as modificações são inevitáveis. No visor das calculadoras eletrônicas e dos relógios digitais, os dez algarismos são representados assim: 

 Senso numérico
Vamos fazer uma experiência.

Observe as figuras :



Agora veja estas figuras :



Em qual dos dois casos foi mais fácil perceber onde há mais pessoas?
No primeiro bastou uma simples olhada, não é mesmo? Mas no segundo, provavelmente, você precisou contar.
Somos capazes de distinguir visualmente pequenas quantidades (até quatro, cinco...talvez seis objetos). Entretanto este senso numérico não nos permite distinguir quantidades maiores.
Um fato curioso: alguns animais também parecem ter esta capacidade de distinguir pequenas quantidades. Sobre isso, há um caso interessante relatado por Tobias Dantzig, no livro que indicamos nas sugestões de leitura. 

A história é mais ou menos essa :

Um fazendeiro decidiu matar um corvo, pois este fizera o ninho na chaminé de sua lareira, impedindo a saída da fumaça. Por várias vezes o homem tentou pegá-lo de surpresa, mas sempre que se aproximava o corvo fugia.






Um dia o fazendeiro resolveu enganar a ave. Duas pessoas entraram no galpão próximo à chaminé e, depois de algum tempo, apenas uma saiu. O animal não se deixou enganar: fugiu e só voltou ao ninho após a saída do segundo homem.
A experiência foi repetida nos dias seguintes, com três e, depois, quatro pessoas. Não adiantou: a ave só voltou ao ninho depois da saída de todos.
Finalmente, com cinco pessoas, o corvo "perdeu a conta". Não percebendo a diferença entre cinco (que entraram) e quatro (que saíram) ele voltou ao ninho assim que o quarto homem se retirou. Pobre corvo! Passou desta para melhor!

E as crianças? Será que elas têm senso numérico como o corvo da história?
Em crianças pequenas, de 2 ou 3 anos de idade, o senso numérico, às vezes, é menos desenvolvido do que o do corvo. Entretanto essa percepção limitada é o ponto de partida para o desenvolvimento da noção de número. Essa noção, que se desenvolve na mente da criança e que os animais não têm, está vários passos à frente do senso numérico.
O desenvolvimento da noção de número depende das experiências que são vividas pela criança. Mas atenção: Nem todas as crianças vivem as mesmas experiências e, às vezes, encontramos crianças de 5, 6 ou mesmo 7 anos que não têm uma noção adequada de número.

Há crianças que escrevem os números e os recitam até trinta ou quarenta. Apesar disso, se você pedir que elas tragam cinco lápis, elas não acertam.
Isto quer dizer que, na verdade, essas crianças não entendem os números.
É possível ajudar as crianças a formar a ideia de número, mas não devemos nos iludir: somente explicações não levam a criança à noção de número.

Pense em um treinador que ensina um menino a jogar futebol da seguinte maneira: ele explica o que é drible, trave, gol, chute etc; faz o menino decorar tudo isso e depois manda o menino jogar e marcar gols.
Será que o menino vai jogar bem?
Só com explicações, é quase impossível. Aprende-se a jogar futebol jogando, tendo contatos, experiências com a bola, o campo, os companheiros, o adversário. Só depois é que as explicações do treinador podem ser úteis. Podem contribuir para desenvolver o conhecimento sobre o jogo e, talvez, até transformar o aprendiz em craque.

Com as crianças e os números acontece a mesma coisa. Para entender bem os números, as crianças precisam ter vivido certas experiências. Só depois disso que os nossos ensinamentos serão úteis.
A criança começa a formar a ideia de número a partir de situações que envolvem quantidades. A criança pode viver essas situações em casa ou brincando com amigos, antes mesmo de ir à escola. Mas existem crianças que nunca passaram por essas situações.
Por isso, antes de ensinar a escrever números e a contar, devemos criar situações para o aluno ter experiências com quantidades.

Referência Bibliográfica

FRABETTI, Carlo. Alice no País dos números. São Paulo: Editora Ática, 2002. p.42.
 IFRAH, Georges. Os Números: História de uma grande invenção. 10ª ed. São Paulo: Globo, 2001. p. 31-71.

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