As ONGs: origens e (des)caminhos
Joana
Coutinho∗
Resumo:
Abordagem
histórica do surgimento das ONGs (Organizações Não Governamentais)
no Brasil, na década de 1970, e de como, de modo geral, se
(re) configuraram nos anos 90 do século XX.
Introdução
Embora o termo “ONG” tenha sido
utilizado na década de 1940,pela ONU, para designar diferentes entidades
executoras de projetos humanitários ou de interesse público (Landim, 1993;
1998; Vieira, 2001) no Brasil, a expressão se referia, principalmente, às
organizações de “Cooperação Internacional1“, formada por Igrejas (católica e
protestante), organizações de solidariedade, ou governos de vários países.
Essas organizações priorizavam a ajuda às organizações e movimentos sociais nos
países do sul, com o intuito de “consolidar a democracia”.
Nas décadas de 1960/70 surgiram
vários centros de “educação popular” e de assessorias a movimentos sociais, com
ênfase na “conscientização” e “transformação social”. A “educação popular”, fundamentada
no método de Paulo Freire, era utilizada no sentido organizativo-conscientizador,
e palavras de ordem como “democracia de base” e “autonomia” constituíam o eixo
de seu repertório. Grupos, já existentes, abandonaram práticas
assistenciais-filantrópicas e outros foram criados para incentivar a “organização
popular” (Doimo, 1995:129, 130).
A maioria desses “centros de
assessoria” (as “proto-ONGs”) era considerada parte do campo progressista
(Doimo, 1995; Gohn, 1997; 1998), pois, financiados pelas “ONGs/Agências”
internacionais, denunciava internamente as violações dos direitos humanos e a
pauperização da população. Não menos importante, foi a atuação da Igreja, por
meio das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), cujo embasamento para sua militância
é buscada nos princípios da Teologia da Libertação, que coloca o povo como “sujeito”
da história. Com a Teologia da Libertação,
a velha aliança entre a igreja
Católica, o Estado e as classes dominantes da América Latina foi desafiada, se não pela
Igreja enquanto instituição, por um número crescente de padres, freiras e leigos, através de
suas práticas pastorais. (...) a Teologia da Libertação recomendou que o
∗ Doutora em Ciências Sociais (Política) pela PUC-SP,
professora no Departamento de Ciências
Sociais da UFSCAR e pesquisadora do NEILS.
1 Organizações,
tais como o Comité Catholique Contre la Faim et pour le Développement (CCFD), francesa; o Serviço das Igrejas Evangélicas da Alemanha para
o Desenvolvimento (EED), alemão; a Organização Interclesiástica para a Cooperação
ao Desenvolvimento (ICCO) e a Organização para a Cooperação Internacional
de Desenvolvimento (NOVIB), holandesas; OXFAM, inglesa.
trabalho pastoral deveria ser
endereçado preferencialmente às pessoas oprimidas da América Latina [os pobres, as mulheres, as crianças e jovens, os negros e os índios], e organizado como
meio de conscientização e luta (Scherer-Warren,1993:38).
O termo se generalizou, as ONGs
se multiplicaram e a expressão serve para designar tanto as de “Cooperação
Internacional”, as ONGs Internacionais (européias financiadoras de projetos
específicos) ou nacionais, e todas as organizações não-estatais -genericamente
consideradas “não governamentais”. O marco para a divisão e a popularização do
termo no Brasil, ocorreu na década de 1990, mais precisamente com a ECO-922 .
As ONGs
dos anos 1990.
Se na década de 1970
associavam-se aos movimentos sociais, a partir dos anos 1990, as ONGs estão
submetidas a uma outra lógica:
priorizam trabalhos em “parceria”
com o Estado e/ou empresas; proclamam-se “cidadãs”; exaltam o fato de atuarem
sem fins lucrativos. Desenvolvem um perfil de “filantropia empresarial”; mantêm
relações estreitas com o Banco Mundial e com agências financiadoras ligadas ao
grande capital, como é o caso das Fundações Ford, Rockfeller, Kellogg,
MacArthur, entre outras.
Diferentemente dos “centros de
assessoria” da década de 1970, a ênfase não seria mais a formação política, mas
o “desenvolvimento autosustentável”.
As palavras de ordem dos anos
1970, que nortearam a atuação dos movimentos populares, como “educação popular”,
“autonomia”, “autoorganização”, “independência”, “direitos humanos”, etc. foram
substituídas por “ecologia”, “democratização”, “diversidade cultural”, “geração
de renda”, “gênero”, “direitos de cidadania”,etc.
Essa terminologia foi adotada
pelas ONGs quando, num recuo da Igreja Católica, as CEBs perdiam espaço para uma
linha mais “espiritualista” como a Renovação Carismática, os grupos de esquerda
passavam a assumir compromissos com o sistema partidário e com a reforma do
Estado (Doimo,1995; Gohn, 1997). Inicialmente, tais mudanças favoreceram uma imediata
diminuição do emprego formal, com a redução de filiações e poder de mobilização
dos sindicatos; direcionamento das políticas econômicas para as atividades na
economia informal; favorecimento da abertura de negócios com custos reduzidos
para contratação de mão-de-obra não filiada a sindicatos e sem direitos
trabalhistas; desenvolvimento da idéia de uma “economia comunitária”, que
encontrará nas ONGs um terreno fértil para sua disseminação (Gohn, 1997).
Em suma, as ONGs cresciam na
medida em que os movimentos sociais perdiam sua força mobilizadora e adotavam
uma política “integradora” (diferente da contestadora dos anos 1970), através
de “parcerias” com o poder público que, “na maioria dos casos, mantém o
2 Conferência
da ONU sobre Meio Ambiente, realizada na cidade do Rio de Janeiro.
controle dos processos
deflagrados enquanto avalista dos recursos econômico-monetários” (Gohn,
1997:297).
O momento específico da
transmutação dos “centros” em ONGs, a partir de 1979, coincide com a volta dos
exilados políticos, principalmente os cristãos e os marxistas, que chegam aos “centros”
com um “capital que os coloca muito bem situados com relação às propriedades
classificatórias que, na prática do meio, legitimam, identificam e
hierarquizam. E vários chegam com ONGs na mala” (Landim, 1998:43).
Os gerentes das ONGs,
geralmente pós-marxistas, tornaram-se atores políticos. Mas os seus projetos,
ou sua participação em treinamentos e reuniões com o Banco Mundial ou “ONGs/Agências”,
não produzem qualquer efeito econômico significativo no Produto Interno Bruto
(PIB) ou na diminuição da pobreza. Funcionam como veículo de “mobilidade
vertical” para aqueles que abandonaram3 suas “excursões iniciais dos movimentos
sociais esquerdistas, pobremente recompensados, por uma carreira lucrativa dirigindo
uma ONG, levando com eles habilidades organizacionais e retóricas e um certo
vocabulário populista” (Petras, 2000:178).
O impacto substantivo de suas
ações converge para desviar “o povo da luta de classes para formas inofensivas
e ineficientes de colaboração com os seus opressores” (1999:41). Elas
despolitizam e desmobilizam os pobres com suas ações focadas na “auto-ajuda”.
Debruçam sobre temas como “excluídos”, “discriminação racial”, “relações de
gênero” sem ir além do sintoma superficial, para engajar o sistema social que
produz essas condições. Incorporando os pobres à economia neoliberal através da
simples “ação voluntária privada”, as ONGs geram um mundo político onde a aparência
da solidariedade e da ação social disfarça a conformidade conservadora com a
estrutura de poder internacional e nacional (Petras, 1999).
Como salientou Ellen Wood
(2003:14), num mundo fragmentado composto “por ‘sujeitos descentrados’ no qual
conhecimentos totalizadores são impossíveis e indesejáveis”, esse tipo de
política aparece como uma espécie de “radicalização descentrada e
intelectualizada do pluralismo liberal. Esse pensamento representa uma fuga da
confrontação com o capitalismo”, sistema mais totalizador que o mundo já
conheceu. Uma fuga que se concretiza pela rejeição do conhecimento totalizador:
3 Neste texto, Petras compara os
líderes das ONGs com uma espécie de “compradore”, ou seja à “burguesia
compradora” que, na China pré-revolucionária, atuava como intermediária dos
exportadores imperialistas e se encarregavam dos empregados nativos sem
possuirem mercadoria alguma. Hoje, afirma o autor, “existem milhares de
dirigentes de ONGs que conduzem carros-esporte de 40.000 dólares de sua
confortável casa ou apartamento de subúrbio para seu escritório ou prédio,
deixando seus filhos e tarefas domésticas nas mãos de empregados, seu jardim
aos cuidados de jardineiros. Estão tão mais familiarizados e gastam mais tempo
com lugares no exterior, onde acontecem suas conferências internacionais sobre
pobreza (Washington, Bancoque, Tóquio, Bruxelas, Roma, etc.) do que com suas
lamacentas aldeias de seu próprio país” (2000:178).
Existiria, na prática,
obstáculo maior a qualquer coisa além das resistências locais e particulares ao
poder global e totalizante do capitalismo do que o sujeito fragmentado e
descentrado? Existiria desculpa melhor para a situação à force mejeure do
capitalismo do que a convicção de que seu poder, ainda que difuso, não tem
origem sistêmica, não tem lógica unificadora, nem raízes identificáveis? (Wood,
2003:14).
Na estranha crença de poderem
manter uma relação de longa duração com as congêneres multinacionais, muitas
destas ONGs limitam-se ao atendimento de suas exigências.
O financiamento: uma relação
embolada.
Ao analisar a relação entre as “ONGs
financiadoras” e as “ONGs financiadas”, deve-se levar em conta o debate em
torno da “globalização” e do imperialismo. Segundo Paul Hirst e Grahame
Thompson (1998) o efeito-chave da noção ideológica de globalização consiste em
paralisar estratégias nacionais de reformas radicais, apresentando-as como
inviáveis diante do julgamento e da sanção dos mercados internacionais. Longe
de ser processo inexorável, a globalização é sobretudo um mito, pois: 1) A
atual economia, altamente internacionalizada, tem precedentes: é uma das
diversas conjunturas ou estados da economia internacional que existiram desde
que uma economia baseada na tecnologia industrial moderna começou a ser
generalizada, a partir dos anos 1860; 2) Empresas genuinamente transnacionais
parecem ser relativamente raras. A maior parte das empresas tem uma forte base
nacional e comercializa multinacionalmente, fundada em uma maior localização nacional
da produção e das vendas, e não parece haver uma maior tendência de crescimento
das empresas realmente internacionais; 3) A mobilidade do capital não está
produzindo uma transferência maciça de investimentos e de empregos dos países
avançados para os países em desenvolvimento. Ao contrário, o investimento
externo direto é altamente concentrado nas economias industriais avançadas, e o
“Terceiro Mundo” continua marginalizado, tanto em relação aos investimentos
quanto às trocas, exceto uma pequena minoria de países industrializados; 4)
Como admitem alguns dos defensores extremados da globalização, a economia
mundial está longe de ser genuinamente “global”. Ao contrário os fluxos de
comércio, do investimento financeiro estão concentrados na Tríade Europa, Japão
e América do Norte; 5) Portanto, essas grandes potências econômicas têm a capacidade
de exercer fortes pressões de governabilidade sobre os mercados financeiros e
outras tendências econômicas. De modo algum estão fora da regulação e do
controle, ainda que o alcance atual e os objetivos da governabilidade econômica
sejam limitados pelos interesses divergentes das grandes potências e pelas
doutrinas econômicas que prevalecem em suas elites (Hirst e Thompson, 1998:15).
O mito da “globalização”
permite que os mercados dominem sem qualquer ameaça de um projeto político
contrário, pressupondo o fim dos “modelos”:
a social-democracia ocidental e o socialismo do bloco soviético.
A crença na inexorabilidade da
globalização atingiu os militantes das ONGs, apesar de suspeitarem de seus
efeitos (aumento do desemprego, da pobreza, etc.). Por ser “um fato que não
pode ser ignorado” (Derksen, 2003:21), tornou-se o grande dilema para as
pessoas – ONGs – preocupadas com os problemas da “pobreza, exclusão e
discriminação, guerra e conflitos, assim como violações dos direitos humanos”
se devem rejeitá-la ou abraçá-la (Derksen, 2003:21).
Como devem prestar contas a
suas financiadoras, e encaminhar relatórios periódicos para suas mantenedoras
(em relações simbióticas com os seus governos), a autonomia dessas organizações
é, no mínimo, questionável.
Em situação diferente estão os
movimentos sociais organizados, como o Movimento dos Sem Terra no Brasil e o
dos camponeses indígenas no Estado de Chiapas no México: o uso e desuso das “doações”
que recebem das ONGs estrangeiras estão vinculados às ações diretas do
movimento, e não a um trabalho específico e focalizado.
A tendência de atuação sobre
determinados temas das ONGs nacionais segue a lógica do financiamento das ONGs
financiadoras.
Embora as décadas das ONGs
sejam 1980 e 1990, sua posição como “atores” internacionais é mais recente.
Para Esther Barbé (1995), este é um fenômeno que existe desde a antiguidade4, e
um processo histórico que pode ser observado em três períodos. No primeiro
período (até o século XIX), a ONG vincula-se à vida religiosa (criação de
monastérios, ordens hospitalares, etc.). No segundo (a partir do século XIX),
caracteriza-se pelo espírito liberal, individualismo dominante e caridade
cristã: os indivíduos deveriam se organizar sem contar com o poder público,
frente às injustiças sociais geradas pela revolução industrial – mas poderiam
contar com a Cáritas (criada na Alemanha, em 1897) ou o Exército de Salvação
(Londres, em 1865). No terceiro período (desde o fim do século XIX), tem-se uma
multiplicidade de organizações de alcance internacional, com agendas bem diversificadas:
os desastres da guerra, as condições de vida do “Terceiro Mundo”, a defesa dos
direitos humanos, ajuda sanitária, meio ambiente, questão de gênero, etc.
O conselho Econômico e Social
das Nações Unidas (Ecosoc) define as ONGs de modo amplo5: qualquer organização
que não foi criada por via de acordos intergovernamentais se considerará “(...)
como organização não
4 Organizações como o Comitê
Internacional da Cruz Vermelha, surgida em 1863, a Ordem de Rosacruz, em 1649,
são consideradas como embriões das atuais ONGs.
5 Mas essa (in)definição permite,
teoricamente, que qualquer organização que esteja fora do aparelho de Estado
seja considerada não-governamental e, portanto, ONG. Como expressa João
Protássio F. D. de Vargas, no texto, Organizações Não- Governamentais e a
defesa da cidadania: “uma ONG pode ser uma empresa, um sindicato, uma ordem, um
conselho, uma congregação, uma associação, uma sociedade ou um simples grupo de
pessoas” (Vargas, 1998) na página www.direito.ufrgs.br.
governamental. Inclui aquelas
que aceitam membros designados por autoridades governamentais” (Barbé,
1995:174). Entretanto, não hesita em acrescentar que uma ONG não deve almejar
lucro com a associação.
As ONGs são consideradas, como as empresas multinacionais, uma importante
força internacional. Mas a questão é identificar as ONGS internacionais e o
papel que exercem nas decisões políticas dos governos do “Primeiro Mundo”. É
importante ressaltar que as ONGs internacionais ou nacionais “se crean en el
marco de legislaciones nacionales: no existe ninguna convención universal que
otorgue a las ONGs internacionales personalidad y capacidad jurídica em todos
aquellos países en los que tengan secciones nacionales o en los que ejercen sus
actividades (Beigbeder,1992:4; apud Barbé, 1995:175). Portanto, elas são sempre
nacionais e podem, na medida do seu alcance e enfoque, serem consideradas (como
as empresas) “multinacionais”6. Algumas nações (França, Bélgica, Inglaterra, Alemanha, Itália) abrigam
considerável número de ONGs “internacionais” – em virtude da
presença de pessoas (físicas ou jurídicas) representantes de vários países –
caso da Anistia Internacional e do Greenpeace, organizados em níveis locais ou
nacionais e com escritórios em vários países. Pelo fato de organizações como a
ONU, o BIRD, ou a UNESCO reconhecerem a importância de seu trabalho, adquirem
maior legitimidade para executar programas previstos por essas mesmas
organizações.
A análise de Hirst e Thompson
sobre o crescimento e amadurecimento dessas instituições também destaca a
importante dimensão nacional das ONGs/Multinacionais: “elas preservam uma
nítida base de origem nacional; estão sujeitas à regulação nacional do
país-mãe, e de modo geral são efetivamente controladas por aquele país de
origem” (Hirst e Thompson, 2002:25).
Göran Therborn (2001:73) afirma
que uma recente ação global combinada (ONU, suas organizações especiais,
conferências globais e convenções monitoradas) criou uma rede mundial geradora
de ONGs. Outra ação global combinada seria a de um capitalismo transnacional institucionalizado,
“isto é, o do Banco Mundial e do FMI, o fiscal global e a fiscalização
monetária que tem sido intensificada e estreitada muito significativamente nos
últimos anos”. As ONGs/Multinacionais mantêm com suas “parceiras locais” uma
relação ambígua: a existência das multinacionais depende do cumprimento de suas
determinações, pelas locais.
Hardt e Negri (2001) situam-nas
como agentes do que chamam de Império. Fazem parte do arsenal de “forças
legítimas” da intervenção imperial, que incluem a intervenção militar, a
jurídica e a moral. O arsenal moral seria
6 O termo internacional dá uma idéia
de que as relações entre as ONGs dos países desenvolvidos são neutras, ou estão
em posição simétrica frente às suas congêneres dos países do “Terceiro Mundo”,
o que não é bem o caso. São profundamente nacionais e raramente tomam
iniciativas que contrariem os interesses de seus países de origem. A este
respeito, ver Petras (1999; 2001), Chossudovsky (1999), Vargas (1998).
praticado hoje por uma
variedade de entidades, incluindo os meios de comunicação e organização
religiosos, mas os mais importantes talvez sejam as chamadas organizações
não-governamentais (ONGs), as quais justamente por não serem administradas
diretamente por governos, entende-se que agem a partir de imperativos éticos ou
morais (Hardt e Negri, 2001:55).
Como o termo serve a uma
infinidade de organizações, os autores esclarecem que se referem às
organizações globais, regionais e locais que se dedicam à proteção de direitos
humanos, como a Anistia Internacional, Oxfam e Médicos sem Fronteiras. Essas e
as ONGs humanitárias em geral, por mais que contrariem os desejos dos
participantes7, são de fato “as mais poderosas armas de paz da nova ordem
mundial -as campanhas de caridade e ordens medicantes do Império”. Movem
verdadeiras “guerras justas”, sem armas, sem violência, sem fronteiras. (..)
Por meio de sua linguagem e de sua ação, elas primeiro definem o inimigo como
privação (na esperança de impedir graves perdas) e depois reconhecem o inimigo
como pecado.
Dentro desse contexto lógico,
não é estranho, mas muito natural que em sua tentativa de reagir às privações
essas ONGs sejam levadas a denunciar publicamente os pecadores (Hardt e Negri,
2001:54).
Como estão mergulhadas no
contexto biopolítico da constituição do Império, antecipam o poder de sua
intervenção pacificadora e produtiva da justiça – e fascinam muitos teóricos
quando se declaram sem objetivos financeiros – e voltadas a ajudar o próximo na
sua penúria. Entretanto, os “fins lucrativos” aparecem na busca frenética por
financiamentos e garantia de emprego.
Sabe-se que muitas das ONGs de
desenvolvimento, em larga medida, estão na folha de pagamento dos seus
governos:
todos los gobiernos de los
países de la OCDE -entre ellos España- tienen sistema para ‘cofinanciar’ las
ONGs, sumándose así a los recursos privados (cuotas, donaciones, colecta de
fondos, venta de materiales, etc.) y a la financiación pública de una ONG,
sobre todo de las ONGD, se lleva a cabo por diversas vías: subvenciones
globales, de carácter periódico; subvenciones para financiar un proyecto
individual;
subcontratos que convierten a
la ONG em agente ejecutivo del programa de acción (Barbé, 1995:179).
7 Do ponto de vista dos diretamente
atingidos pela ação de algumas ONGs, todo o seu trabalho pode ser considerado
positivo. Porém, sob perspectiva de classe, seu efeito é exatamente contrário:
suas ações de auto-ajuda são desenvolvidas, em cada comunidade, por um tempo
determinado. Findado o prazo, findam-se também o financiamento e o projeto.
Ficam os “beneficiados”, e lá vai a ONG continuar sua peregrinação por um “projeto
piloto” e novos empreendedores, noutra comunidade.
Conclusão
As ONGs que se imaginam no
campo progressista acreditam na possibilidade de conciliar pragmatismo com
conscientização e, por isso, se diferenciariam daquelas que colaboram com as
políticas neoliberais. Mas a linha que as separa é muito tênue. Muita ONG “progressista”
sucumbe ao apelo do assistencialismo/filantropia para se manter na ativa, mesmo
porque é essa a lógica de seus financiadores.
A despeito de se colocarem como
agentes capazes de oferecer uma alternativa de emprego e trabalho para os “excluídos”,
essas ONGs (como outras organizações do chamado “terceiro setor”) são uma fonte
de emprego, sobretudo para a classe média. Há muitos destes cargos subsidiados,
sem qualquer controle pelo Estado e, menos ainda, pela população que é o “alvo”
de suas ações.
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Os Estados Unidos após as eleições
Entrevista de Samir Amin
Correspondência:
6, avenue
Mathurin Moreau
75 167 Paris
cedex 19
End. Eletrônico:
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http: www.Espaces-Marx.org
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