quarta-feira, 23 de julho de 2014

CONTAR HISTÓRIA

                        Manual de atividades lúdicas:
                                     contar Histórias
                                                                         Marisol Montero Sendin



Maktub! — Estava escrito na alma do contador de histórias.
                                                                                                                        Valdir Cimino


Contar uma história é a passagem para o mundo mágico, onde a cada segredo revelado traz a possibilidade da realização de milagres, podemos inclusive afirmar que a força de uma boa história tem o poder de solucionar dificuldades, harmonizar ambientes e dar continuidade a história do mundo.
Desde que o homem se reconhece como ser humano Homo sapiens (“homem sábio”, em latim), unico da espécie a possuir cérebro altamente desenvolvido, com capacidades multiplas associadas a mente e ao corpo, contextualiza em introspecções, reflexões, raciocinio abstrato e tendo a linguagem como ferramenta para transformar desde os tempos mais remotos a conquista, o respeito e a veneração dos seus semelhantes.
Na Idade Média o contador de história era sempre bem vindo e respeitado em toda parte pelo prazer que as suas histórias proporcionavam, sendo elas recitadas, cantadas, declamadas, encantavam e envolviam de reis, príncipes e princesas às classes mais populares, e de aldeia em aldeia os trovadores, os segréis, os jograis, os bardos e os menestréis obtinham admiração popular, e assim, pouco a pouco, até os dias de atuais, a civilização global, têm utilizado a história como veículo para eternizar verdades, conservando assim as tradições e promoção de novas ideias.
Não há como ignorar a influencia poderosa que as histórias têm exercido em todas as reformas sociais que a humanidade tem vivenciado, o “Era uma vez...” palavras, proferidas dentro da forma clássica, representam eficiente recurso para o estimulo imaginação da criança afastando-a das distrações e garantindo ao interlocutor a importância da história como recurso positivo no processo formativo e ao mesmo tempo informativo.
A importância da história decorre de sua universalidade; de sua influência; dos recursos que oferece aos educadores, pais, avós, etc e dos benefícios que poderá proporcionar à existência sustentável da humanidade.
Histórias gravam-se, em nossas mentes e corações, o conhecimento e ensinamentos passam a fazer parte do patrimônio moral e social dos seres que a vivenciam. Nas situações do dia a dia muitas vezes nos depararmos com cenas idênticas, e assim somos levados a agir de acordo com a experiência, somos espelho para o outro e o outro também passa a ser nosso espelho.
A experiência tem provado que pais e educadores bem orientados empregam a história como meio eficaz para ensinar bons costumes, promover ética e valores, corrigir falhas na formação do caráter e premiar atitudes nobres e justas.
A história é um grande divertimento para o espírito, principalmente se o narrador se preparar para o ato: há de se ter um bom início, com a apresentação dos perfis dos personagens e o âmbito onde atuaram; um ponto culminante onde vida e o inesperado se digladiam a fim de conquistar e cativar a audiência, e um desfecho imprevisível agradável, que proporcione à alívio da tensão emocional.
Para completar a diversão, o uso de teatrinho de fantoches, sombra, origamis e dramatização espontânea, fortalece a empatia com audiência.
A história pode educar crianças, moços e velhos, elas ficam guardadas no tempo e na nossa memória e podem servir como uma lição, uma advertência ou como um conselho.
A história é elemento de primeira grandeza na educação da criança e o uso intencional da mesma pode auxiliar e despertar o desejo de praticar o bem, de cuidar de sua existência fortalecendo conceitos e ensinamentos sobre higiene corporal, alimentação, prevenção da saúde e do meio ambiente, e resgatar a importância da educação e o cuidado na conservação das escolas e dos livros.
Os aspectos educativos, visamos com as histórias à expansão da linguagem enriquecendo o vocabulário, a expressão e a articulação; estímulo à criatividade, imaginação e inteligência; alargando horizontes e ampliando o conhecimento; socialização e identificação dos âmbitos e encontros; através da imitação de bons exemplos e situações decorrentes das histórias, valorizar a diversidade e as diferenças individuais; cultivar a memória de uma sociedade.
Para Monteiro Lobato a compreensão da Aritmética aplicada através de cálculos e frações se fez mais
compreendida sob a forma de história, já Julio Verne encantou e encanta até hoje uma legião de adolescentes, o próprio Santos Dumont o teve como inspiração para a criação e construção do avião.
A história passa a ser elemento essencial no desenvolvimento intelectual e na linguagem infantil, instrui e facilita a aquisição de novos conhecimentos, a partir de cenas da vida real, educacional, doméstica e lazer.
Desenvolve gosto artístico observado nas artes cênicas e à educação religiosa dos povos.
As histórias exercem ações benéficas sobre o corpo e a mente humana, muitas pessoas enfermas, passam a sentir-se melhor quando no tratamento médico e tecnológico agrega se uma boa história, isto é acolhimento humanizado.
No caso de uma criança adoecida, sempre existe espaço para o mundo do “ faz de conta”, a história canaliza a imaginação e tudo que é estático pode se transformar em dinâmico, um brinquedo pode ganhar vida, falar, pensar e se expressar. Brinquedos tem o poder de contar histórias e ajudam a resolver conflitos emocionais. Jamais subestime a imaginação de uma criança, mesmo que ela seja especial, pois seu espaço está sempre povoado de formas, sentimentos, movimentos, cores e sons.
Uma história só encantará e fidelizará a atenção do sujeito se for narrada com verdadeiro êxito e se estiver rigorosamente adequada à imaginação do mesmo, vale conhecer alguns dos segredos que competem à arte de contar histórias; estar aberto para amar a leitura e ter interesse pelo nosso folclore, identidade nacional que garante e fortalece nossa cultura; estudar o conto e o propósito do autor, narrar a verdade, assim o personagem se faz real no drama ; ler constantemente o mundo da crianças, jornais, revistas, almanaques, quadrinhos e livros, muitos livros, se possível crie os seus, leia inclusive os sobre Psicologia da Criança e do Adolescente que nos revela conhecimento e noções elementares e fundamentais para o fortalecimento as relações interpessoais; assista aos desenhos animados, comédias, filmes e vá ao teatro; navegar na internet já faz parte do cotidiano de nossas crianças e jovens, aprenda com eles, na globalização o que vale é o que se aprende; depois da vivencia faça as suas anotações fantásticas do que foi lido, visto, ouvido, tocado e sentido, assim terá certeza que Maktub!
Reflexão: se no final do dia, após as obrigações como exercícios físicos, cursos e trabalhos escolares a criança ainda receber uma história que alimente o espírito seu sono será tranquilo e o repouso saudável, preparando a para um novo dia de aprendizagem.

A palavra Maktub quer dizer “carta” em árabe, contudo foi traduzida como “está escrito”.


Por QuE as crianÇas brincaM?

Porque gostam de fazê-lo – isto é um fato indiscutível. As crianças usufruem de todas as experiências de brincadeira – física e emocional.
As crianças dão escoamento ao ódio e à agressão nas brincadeiras. A criança aprecia concluir que os impulsos agressivos podem exprimir-se num meio conhecido, sem o retorno do ódio e da violência de volta para a criança, ou seja, sem retaliação do meio.
As crianças também brincam para dominar angústias e para controlar idéias ou impulsos que conduzirão à angústia se não forem dominadas.
A criança adquire experiência brincando. O brincar é uma parcela importante da vida da criança. As experiências, tanto internas quanto externas são importantes para o adulto, mas para a criança essa riqueza se encontra principalmente no brincar e na fantasia.
A personalidade dos adultos se desenvolve através de suas experiências de vida e a das crianças evolui por intermédio de suas próprias brincadeiras e das invenções de brincadeiras feitas por outras crianças e por adultos.




o brincar É a Prova EvidEntE E constantE da caPacidadE criativa.

“A brincadeira que é universal e que é própria da saúde:
o brincar facilita o crescimento e, portanto, a saúde;
o brincar conduz aos relacionamentos grupais; o brincar pode ser uma forma de comunicação na psicoterapia;
finalmente a psicanálise foi desenvolvida como forma altamente especializada do brincar, a serviço da comunicação consigo mesmo e com os outros” (Winnicott, 1971).
“Os adultos contribuem pelo reconhecimento do grande lugar que cabe ao brincar e pelo ensino de brincadeiras tradicionais, mas sem obstruir nem adulterar a iniciativa própria da criança” (Donald Woods Winnicott, 1971).
“Assim como a poesia, o conto tem um valor grande e exatamente humano. Expressa, por meios simples, as imagens e os sentimentos que vive a humanidade inteira.” (Van Gennep, 1910).


As histórias, assim como o brincar, por serem um  instrumento lúdico e transicional, permitem ao sujeito, criança ou adulto, encontrar um sentido para suas experiências e, assim, integrar partes do si - mesmo. As histórias, como os contos de fadas, são a expressão mais simples e pura dos processos psíquicos. Freud já percebera que os contos não são fundamentalmente distintos dos sonhos e falam uma linguagem simbólica idêntica, a das fantasias inconscientes do homem.
Para a criança a linguagem cotidiana não é a linguagem natural do sentimento, que é a da imagem e da metáfora, como em histórias e sonhos. A criança não fala com facilidade, nem com naturalidade sobre seus sentimentos problemáticos. E, as poucas palavras que escolhem para expressar sentimentos tendem a levara uma compreensão muito restrita por parte dos adultos a quem são dirigidas. Além disso, as crianças não falam de sentimentos com seus amiguinhos.

Assim, a história pode ir diretamente ao âmago da questão, em três áreas:
1. O uso da história reconhece que é limitado falar sobre sentimentos com a criança na linguagem cotidiana, que é a linguagem do pensamento. Falar por meio de uma história, fazer uma encenação com bonecos ou fantoches, desenhar ou modelar em barro é usar a linguagem da imaginação, que é a linguagem natural da criança. A história fala às crianças num nível mais profundo e imediato que a
linguagem cotidiana. 2. 3. 1999).
As histórias contadas por adultos para crianças ou as histórias contadas para adultos por crianças, por meio de desenhos, pinturas ou encenações, falam de sentimentos com uma surpreendente
riqueza. Na verdade, a psique fala naturalmente de questões emocionais por meio das histórias, como nos sonhos. Nos sonhos, a psique “escolhe” a imagem e a metáfora para processar sentimentos intensos do passado ou do presente, assim como medos e esperanças para o futuro. Uma história é como sonhar acordado.
Assim como as crianças, muitos adultos ficam presos nos becos sem saída dos rótulos convenientes ao descrever os próprios sentimentos.
As palavras abrandadas, as referências oblíquas ou minimizadas, as experiências ou estados emocionais intensos são parte de uma cultura submetida a recalcamento.
“A Terra não é chata e a realidade também não. A realidade é contínua, múltipla, simultânea, complexa, abundante e parcialmente invisível. Só a imaginação pode compreendê-la e revelar suas profundezas(Winterson1999).


FunÇÕEs da contaÇÃo dE histórias

1. Suscitar o imaginário.
2. Ter a curiosidade respondida em relação a tantas perguntas.
3. Encontrar outras idéias para solucionar questões (como os personagens fazem...).
4. Possibilidade de descobrir o mundo dos conflitos, dos impasses.
 5. Sentir emoções importantes(através dos personagens).
 6.Viver profundamente tudo o que a narrativa provoca.
7. Ajudar a construir uma ponte entre o mundo interno
8. Compartilhar momentos de intimidade, de cumplicidade e, portanto, contribuir para o relacionamento,tornando-o mais próximo.
9. Acolher a criança em sua integridade, com suas emoções, que fazem parte da natureza humana.
10. Promover uma atitude positiva em relação à escuta.

Contar histórias também tem importantes FUNÇÕES TERAPÊUTICAS, calcadas na dimensão lúdica, muito importante na área da saúde. Os contos são, em função de sua estrutura, objetos lúdicos comparáveis ao brincar, pois oferecem personagens familiares em situações abertas que as crianças podem utilizar conforme as suas necessidades.

EFEITOS TERAPÊUTICOS DAS HISTÓRIAS
1. Possibilidade que oferecem à criança de criar para si pontos de referência reais, que poderá interiorizar;
2. A possibilidade que as histórias dão de pensar os conflitos que propõem e que são, no fundo, os conflitos da própria criança, postos à distância pela metáfora;
3. A possibilidade que ela terá, em função desses processos, de adquirir uma capacidade de lidar com a própria angústia.
Ler ou ouvir contos e histórias pode significar continuar pensando sobre nós mesmos, no momento em que entramos em contato com sentimentos e conflitos difíceis de serem suportados e que, sem esse filtro da narrativa, poderiam paralisar nossa capacidade associativa ou, ainda nos causar sintomas.
“...as diversas imagens e figuras narrativas representam as fantasias que o Inconsciente dos ouvintes acolhe e elabora secretamente.”(N. Belmonte, 1999) .



bEnEFÍcios das histórias tEraPÊuticas 
Uma história terapêutica pode funcionar como um “ingresso” para o mundo interior da criança.
 Quando a história é bem escolhida, a criança ouve com atenção porque se entra no mundo interno dela com cuidado e compreensão. É muito importante que se escolha bem o livro a ser oferecido para a criança, respeitando sua idade, seu desenvolvimento cognitivo e afetivo-emocional, além de seu
nível social e cultural.
Mas não podemos saber em que idade um conto específico será mais importante para uma criança específica. Isso só a criança pode determinar e revelar pela força com que reage emocionalmente àquilo que um conto evoca na sua mente consciente e inconsciente.
Para que uma história realmente prenda a atenção da criança deve entretê-la e despertar sua curiosidade. Contudo, para enriquecer sua vida, deve estimular-lhe a imaginação, ajudá-la a desenvolver seu intelecto e a tornar claras suas emoções, estar em harmonia com suas ansiedades e aspirações, reconhecer plenamente suas dificuldades e, ao mesmo tempo, sugerir soluções para os problemas que a perturbam.



1. Contar uma história é muito mais respeitoso e menos invasivo do que abordar os problemas da criança diretamente.
2. Uma história fala de questões e problemas emocionais comuns, mas fala dentro do domínio da imaginação e não dentro do domínio da cognição.
3. Uma história fala com empatia e precisão sobre a questão ou problema emocional que a criança está enfrentando. Ela fala por meio de imagens carregadas e expressivas e, com isso, captura o quadro completo, a realidade mais profunda da experiência emocional da criança. É uma forma profunda de descrição e evocação do mundo interno da criança. A história, com suas imagens e sentimentos, permite que a criança veja, ouça, entenda e sinta com mais clareza.
4. Uma história mostra à criança que o mecanismo que ela está usando para enfrentar seus problemas pode ter um preço muito alto como:
• Represar sentimentos muito difíceis.
• Explodir.
• Desistir.
• Não ligar.
• Tornar-se dura, valente para não sentir dor.
• Aguentar o abuso ou crueldade sem falar para ninguém.
• Entregar sua vida a alguma coisa ou a alguém que a magoa demais.
5. A história apresenta esperança e possibilidades em forma de modos de ser e de mecanismos para enfrentar problemas, que sejam mais saudáveis e criativos:
• Apresenta opções sobre o que fazer diante de um grande obstáculo.
• Apresenta novas possibilidades e soluções criativas para superar problemas aparentemente insuperáveis.
• Mostra como lidar de modo mais eficaz e menos doloroso com problemas emocionais comuns.
• Mostra que novas maneiras de ser são possíveis.
Essas novas maneiras podem não ter influência sobre a vida da criança naquele momento mas são como uma semente plantada na psique da criança, um recurso que poderá ser plenamente usado no futuro.

6. Uma história oferece à criança novos modos de pensar sobre seus sentimentos difíceis. A história apresenta sentimentos que já foram rigorosamente pensados pelo autor e isso é extremamente útil para a criança, que teve esses sentimentos problemáticos sem conseguir pensar direito sobre eles. A história permite que a criança assuma u novo modo de ver a situação, de conhecê-la  ou de se relacionar com alguém ou com algo em sua vida. Com isso ela tem tempo para refletir sobre sua situação, seus sentimentos e seu modo de ser.   


7. Uma história faz com que a criança seja capaz de conviver com seus sentimentos perturbadores, intensos ou dolorosos demais, por um tempo que lhe permita pensar sobre o que está acontecendo. Isso é possível porque a imagem metafórica proporciona à criança meios para observar seus sentimentos de uma “distância segura”.
8. Uma história inclui mensagens psicológicas muito importantes que envolvem dilemas, problemas ou crises existenciais comuns na vida da criança, como:
• Se abrir para o amor e, ao mesmo tempo, se defender das pessoas que querem magoá-la.
• Amar de modo a sentir mais felicidade do que dor, quem amar e como acabar com a dependência de alguém que não pode amá-la.
• Mudar sua maneira fundamental de ser.
• Quando deixar de lado e quando disputar e confrontar.
• Até que ponto ir atrás do que se quer na vida e até que ponto se contentar com o status quo.
9. Uma história traz mensagens psicológicas importantes sobre permissões:
• Você tem direito de dizer “não” ou “eu me importo, sim”
 • Você pode ser diferente;
• Você pode perseguir um sonho;
• Você pode mudar sua maneira de sentir;
• Você pode se livrar da ansiedade;
• Você pode deixar para lá.



O grande valor das histórias está exatamente na oportunidade de apresentar à criança algumas idéias sobre os seus conflitos e, ainda assim, respeitar seu tempo, seu período de hesitação. Assim, a criança pode optar quando reconhecer que alguns dos aspectos descritos na história pertencem à sua realidade psíquica, sem que se sinta invadida por um conteúdo brusco interpretativo, frente ao qual necessita reagir, perdendo assim a oportunidade de maior integração de si – mesma.
Mesmo que se adivinhe corretamente a razão pela qual a criança se envolve emocionalmente com uma determinada história é melhor que se guarde esse conhecimento para si. As experiências e reações mais importantes da criança pequena são, em sua maior parte, pré-conscientes e devem permanecer assim até que ela atinja uma idade e compreensão mais maduras. É tão importante para o bem-estar da criança sentir que o adulto compartilha suas emoções com a mesma história quanto ver que seus pensamentos não são conhecidos, até que ela decida revelá-los. Se o adulto indica que já os conhece, a criança é impedida de dar o presente mais precioso, o de compartilhar com ele o que, até então, ela tinha como secreto e privado. E, além disso, o adulto é muito mais poderoso que a criança, seu domínio parece ilimitado e, em consequência, destrutivamente assoberbante – caso ele pareça capaz de ler pensamentos secretos, de conhecer os sentimentos mais recônditos, mesmo antes de ela própria se tornar ciente deles.
As interpretações adultas, por mais corretas que sejam, roubam da criança a oportunidade de sentir que ela, por conta própria, por meio de repetidas audições e ruminações acerca da história, enfrentou com êxito uma situação difícil. 

Quando a criança fala de seus sentimentos ela se abre e se entrega e, por isso, se torna vulnerável. É muito importante estar atento, sem julgar ou tentar reprimir os sentimentos da criança, mudando de assunto, pois essa atitude poderá torná-la resistente a compartilhar seus sentimentos em outras situações, ficando em uma posição defensiva, achando que a sinceridade e a coragem de ser vulnerável são um engano.
A criança costuma expressar seus sentimentos de forma não-verbal, não utilizando a linguagem cotidiana.
Comunica-se através de imagens ou de metáforas, o que muitas vezes, dificulta a compreensão do adulto – não habituado a esse tipo de linguagem. Dessa forma muitas vezes sente-se sozinha em suas angústias. A história como uma forma de brincar, pode funcionar como uma forma de transformar a realidade, propiciando um novo meio de expressão para metaforizar angústias.
É característico dos contos colocarem um dilema existencial de maneira breve e incisiva. Isso permite à criança apreender o problema em sua forma mais essencial, enquanto que uma trama mais complexa a confundiria. O conto simplifica todas as situações. Suas
personagens são esboçadas claramente, os detalhes, exceto os  mais importantes, são eliminados e todas as personagens são típicas. As personagens não são ambivalentes: não são ao mesmo tempo boas e más. A justaposição de personagens opostas não tem o propósito de frisar o comportamento correto, mas a apresentação de polarização de caráter permite à criança compreender facilmente a diferença entre ambas, o que não poderia fazer prontamente se as personagens fossem retratadas com todas as complexidades que caracterizam as pessoas reais.
O conto leva muito a sério as angústias e dilemas existenciais e se dirige diretamente a eles: o amor pela vida e o medo da morte. Ademais, oferece soluções de modos tais que sejam passíveis de apreensão pela criança no seu nível de compreensão. Toda criança gosta de ouvir histórias. Sua curiosidade natural é aguçada por narrativas que abordam temas conhecidos, ligados ao seu cotidiano, e desconhecidos, universos fantásticos que as atraem e encantam.

“A literatura não é, como tantos supõem, um passatempo.
É uma nutrição. A Crítica, se existisse, e em relação aos livros infantis, deveria discriminar as qualidades de formação humana que apresentam os livros em condições de serem manuseados pelas crianças. Deixando sempre uma determinada margem para o mistério, que a infância descobre pela genialidade de sua intuição.” (Cecília Meireles, 1979).
A relação com o livro se transforma a cada etapa da vida da criança. Para os bebês e crianças até dois anos os livros não são exclusivamente para olhar, mas para mastigar, amassar e sacudir. Desde então gostam de escutar histórias (ainda que nesse estágio sejam apenas palavras soltas) e logo começará a apontar e nomear as figuras.
Esse convívio, que para a criança é uma brincadeira, é muito favorável ao desenvolvimento da linguagem.
Com cerca de dois anos a criança já entende praticamente tudo o que os adultos falam e é capaz de acompanhar uma história curta, onde pode reconhecer o mundo que lhe é familiar seja em situações (casa, escola, médico, parque) seja em objetos do dia-a-dia (flores, carros, brinquedos, alimentos). Histórias que falam de crianças e de animais são muito bem aceitas, assim como as que se referem aos fenômenos da natureza, como chuva ou lagarta que vira borboleta.
Entre 3 e 4 anos a linguagem da criança já está mais desenvolvida. Ela começa a apreciar o ritmo e as rimas e se diverte com jogos de palavras. As crianças sentem grande atração pelos fenômenos da natureza e fatos reais, que alimentam sua enorme curiosidade sobre o mundo.
Cinco, seis, sete anos, começa a se aproximar a idade em que a criança deixa de ser simplesmente um ouvinte para se tornar um leitor. Da mesma forma que o adulto, a criança também tem um gosto pessoal, tem suas preferências e restrições. O livro não só pode como deve agradar a criança. Um livro deve corresponder ao seu gosto pessoal (e sua necessidade interna) e à sua fase de desenvolvimento, da mesma forma que se passa com o brinquedo. No mundo da imaginação, não só nos libertamos das realidades enfadonhas da vida cotidiana como nos entregamos aos prazeres catárticos de derrotar aqueles gigantes, madrastas, bichos-papões, ogros, monstros e trolls, estes também conhecidos como adultos.
“É mais fácil falar sobre bruxas do que sobre os aspectos negativos de uma mãe.” (Allan Guggenbuhl, 1991).
“Se esperamos viver não apenas de momento a momento, mas sim verdadeiramente conscientes de nossa existência, nossa maior necessidade e mais difícil realização será encontrar um significado em nossas vidas. É sobejamente sabido que muitos perderam o desejo de viver e pararam de tentar, porque tal significado lhes escapou.” (Bruno Bettelheim, 1976).














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