POLÍTICA EDUCACIONAL
Entende‐se
por política educacional as decisões que o Poder Público, isto é, o Estado,
toma em relação à educação. No Brasil, ela é marcada por uma sucessão de
reformas que visam solucionar os problemas encontrados na área, e acabam por
caracterizá‐la
como descontínua e pouco efetiva (SAVIANI, 2008).
Estudos apontam que as políticas públicas
destinadas à educação são reflexos da contradição própria do ajuste neoliberal
que tem norteado a educação latino-americana e brasileira, especialmente após o
chamado Consenso de Washington (1989). Tal contradição se manifesta quando o
Estado se torna mínimo no que concerne à gestão dos recursos e à
descentralização financeiro-administrativa. No entanto, este mesmo Estado
mínimo cumpre o papel de agente regulador e controlador dos serviços públicos,
como a educação, na medida em que norteia o trabalho e o currículo realizado
pelos professores, realiza avaliações, por meio das quais supostamente verifica
a qualidade da Educação e distribui prêmios para as escolas e docentes com
melhor desempenho nestas avaliações, praticando uma política meritocrática, que
em nada contribui para as reais condições de trabalho dos professores e nem
para a melhoria da qualidade da educação para os educandos.
Ao propor que a educação, assim como tantos
outros elementos, é uma mercadoria, o neoliberalismo também interfere nas
práticas pedagógicas, no entanto, não cria nada de novo neste campo, apenas
recria o produtivismo, o escolanovismo, o construtivismo e o tecnicismo (Saviani
2007)
Como o importante no momento é dar aos
indivíduos o status de empregabilidade basta uma formação superficial e de
caráter utilitarista, portanto, os professores estão sendo formados sob esta
lógica e formam seus alunos da Educação Básica sob o mesmo parâmetro. Portanto,
o neoliberalismo já imprimiu suas marcas na educação brasileira e suas
contradições se fazem presentes cada dia mais em nossas escolas.
A partir da década de 1990, políticas
educacionais semelhantes e homogeinizadoras têm sido aplicadas a diferentes
países da América Latina, sem levar em conta as suas especificidades e com o
apoio das elites locais, conforme afirma Saviani (2007).
Outro aspecto importante desta nova lógica
que mercantiliza um direito social como a educação, se manifesta em novas
formas de atuação pedagógica que recriam o antigo e o condiciona à nova lógica.
Estamos nos referindo àquilo que Saviani (2007) nomeou como neoprodutivismo,
neo-escolanivismo, neoconstrutivismo.
Saviani analisa como os preceitos da
pós-modernidade e do neoliberalismo se manifestam nas ideias pedagógicas. O
autor parte da alteração que ocorreu, a partir da década de 1990, nas bases
produtivas, ou seja, na substituição do modelo fordista/taylorista pelo modelo
toyotista, e explica como isso se manifesta na educação. Assim, no atual modelo
produtivo, no qual já não existe mais a estabilidade no emprego, nem a
instalação de grandes conglomerados industriais com produção em larga escala
visando à estocagem de produtos, o que prevalece é o Just in time, ou seja, um
sistema produtivo que requer trabalhadores polivalentes que trabalhem sob a
dependência da chamada flexibilidade e da empregabilidade – flexibilidade que
esvazia os direitos trabalhistas e empregabilidade que força o trabalhador a se
tornar competitivo no mercado de trabalho, ou seja, o trabalhador precisa o
tempo todo buscar adquirir as novas competências que o mercado oferece para
manter-se empregado.
Como a educação, na ótica neoliberal é
encarada como um produto a ser consumido com retorno no mercado de trabalho e
não como um direito social, a escolarização passou a ser adequada a esse novo
paradigma, ou seja, à escola cabe a tarefa de oferecer a seus alunos um
“preparo polivalente apoiado no domínio de conceitos gerais, abstratos, de modo
especial aqueles de ordem matemática” (SAVIANI, 2007, p.427).
Essa
busca pela empregabilidade via escolarização, é o que Saviani (2007) denomina
de neoprodutivismo, que, por sua vez é uma consequência da exclusão que o
capitalismo gera – não existe emprego para todos e o crescimento econômico pode
perfeitamente coexistir com altas taxas de desemprego – assim é, pois, que se
configura a chamada “pedagogia da exclusão”.
O que
diferencia o construtivismo do neoconstrutivismo na análise de Saviani (2007) é
que enquanto o primeiro se pautava na compreensão científica do desenvolvimento
da inteligência, o segundo, em sintonia com a pósmodernidade, valoriza
essencialmente o pragmatismo e o espontaneísmo. Daí o verdadeiro abandono de
muitos professores neoconstrutivistas para com seus alunos, os quais se vêem
obrigados a “construir” sozinhos o seu próprio conhecimento – como se isso
fosse possível. O neoconstrutivismo também se manifesta na formação de
professores – tanto na formação inicial quanto na continuada. É do
neoconstrutivismo que emerge, por exemplo, a “teoria do professor reflexivo”.
Tal teoria considera mais importante o refletir sobre a prática cotidiana do
que a aquisição de pressupostos teóricos na formação do professor. daí os
muitos cursos de formação continuada serem fundamentalmente reflexões sobre a
prática cotidiana em sala de aula. Talvez nem coubesse o termo reflexão para
muitos dos cursos e reuniões que dizem contribuir para a formação continuada e
em serviço dos professores, reflexão é um processo de esforço e coerência em
relação a uma determinada ação. A partir desta noção de reflexão, fica claro
que muitas ações de formação continuada que dizem estimular a reflexão não
passam de simples desabafos e trocas de experiências e não estimulam a reflexividade
do professor sobre sua ação e sua prática.
Mais uma vez, o objetivo é a adaptação do
sujeito às forças produtivas que se encontram no jogo de mercado. Mais uma vez
a ênfase está na aquisição individual das tais competências que habilitam o
indivíduo a encontrar espaço no disputado mercado de trabalho e, mais uma vez,
o sucesso ou o fracasso escolar, profissional e pessoal são colocados como
problemas individuais e não sociais.
Originalmente, o tecnicismo, tem como base a
racionalidade e maximização dos resultados com o mínimo de recursos e tempo. No
Brasil, tal função foi posta como responsabilidade do Estado entre os anos de
1970 e 1990, porém com a adoção do neoliberalismo como política de Estado, o
desenvolvimento de técnicas de produção foi transferido para a iniciativa
privada e para as organizações não-governamentais – dessa forma o Estado se
minimizava, bem como as suas responsabilidades para com o setor social. Em
Educação, esta passagem do tecnicismo para o neotecnicismo fica clara em
programas e propagandas do próprio Governo Federal que estimulam a participação
da sociedade civil, o trabalho voluntário e parcerias de escolas com empresas,
ou seja, a sociedade civil assume “voluntariamente” responsabilidades que
seriam do Estado e as empresas investem recursos e desenvolvem técnicas em um
espaço que é público tendo em vista um retorno privado. Outro reflexo do
neotecnicismo está no deslocamento do processo para o resultado (Saviani,
2007), ou seja, o Estado não tem mais tanta responsabilidade em financiar o
desenvolvimento do setor educacional, pois divide esta responsabilidade com
outras instâncias como a sociedade civil, as empresas, as ONGs, os organismos
multilaterais, etc., mas tem em suas mãos os resultados deste processo por meio
das avaliações que aplica sobre todo o sistema educacional em nome da qualidade
do ensino, vale dizer, da “qualidade total” – termo tomado do setor de produção
de mercadorias e que para os neoliberais pode tranquilamente ser aplicado à
avaliação da educação, pois, estes têm “... a tendência a considerar aqueles
que ensinam como prestadores de serviço, os que aprendem como clientes e a
educação como produto que pode ser produzido com qualidade variável. No
entanto, sob a égide da qualidade total, o verdadeiro cliente das escolas é a
empresa ou a sociedade e os alunos são produtos que os estabelecimentos de
ensino fornecem a seus clientes. (SAVIANI, 2007, p.438)
Novamente a educação, a escola, os
educadores, os alunos são postos à mercê da força do mercado, que, com sua
“mão-invisível”, exerce enorme peso, ao ponto de ofuscar o educador quando o
transforma em mero treinador e de fazer da educação um trabalho de doutrinação,
convencimento e treinamento para a eficácia no mercado de trabalho, quando na
verdade, a função da educação é realizar um trabalho de esclarecimento, de
abertura das consciências (SAVIANI, 2007).
SAVIANI, Dermeval. História das Idéias
Pedagógicas no Brasil. Campinas: Autores e Associados, 2007.
Nenhum comentário:
Postar um comentário