segunda-feira, 16 de maio de 2016

O CONHECIMENTO MATEMÁTICO


O conhecimento matemático
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS

A Matemática, surgida na Antiguidade por necessidades da vida cotidiana, converteu-se em um imenso sistema de variadas e extensas disciplinas. Como as demais ciências, reflete as leis sociais e serve de poderoso instrumento para o conhecimento do mundo e domínio da natureza.
Mesmo com um conhecimento superficial da Matemática, é possível reconhecer certos traços que a caracterizam: abstração, precisão, rigor lógico, caráter irrefutável de suas conclusões, bem como o extenso campo de suas aplicações.
A abstração matemática revela-se no tratamento de relações quantitativas e de formas espaciais, destacando-as das demais propriedades dos objetos. A Matemática move-se quase exclusivamente no campo dos conceitos abstratos e de suas inter-relações. Para demonstrar suas afirmações, o matemático emprega apenas raciocínios e cálculos.
É certo que os matemáticos também fazem constante uso de modelos e analogias físicas e recorrem a exemplos bem concretos, na descoberta de teoremas e métodos. Mas os teoremas matemáticos são rigorosamente demonstrados por um raciocínio lógico.
Os resultados matemáticos distinguem-se pela sua precisão e os raciocínios desenvolvem-se num alto grau de minuciosidade, que os torna incontestáveis e convincentes.
Mas a vitalidade da Matemática deve-se também ao fato de que, apesar de seu caráter abstrato, seus conceitos e resultados têm origem no mundo real e encontram muitas aplicações em outras ciências e em inúmeros aspectos práticos da vida diária: na indústria, no comércio e na área tecnológica. Por outro lado, ciências como Física, Química e Astronomia têm na Matemática ferramenta essencial.
Em outras áreas do conhecimento, como Sociologia, Psicologia, Antropologia, Medicina, Economia Política, embora seu uso seja menor que nas chamadas ciências exatas, ela também constitui um subsídio importante, em função de conceitos, linguagem e atitudes que ajuda a desenvolver.
Em sua origem, a Matemática constituiu-se a partir de uma coleção de regras isoladas, decorrentes da experiência e diretamente conectadas com a vida diária. Não se tratava, portanto, de um sistema logicamente unificado.
A Aritmética e a Geometria formaram-se a partir de conceitos que se interligavam. Talvez, em conseqüência disso, tenha se generalizado a idéia de que a Matemática é a ciência da quantidade e do espaço, uma vez que se originou da necessidade de contar, calcular, medir, organizar o espaço e as formas.
O desenvolvimento da Geometria e o aparecimento da Álgebra marcaram uma ruptura com os aspectos puramente pragmáticos da Matemática e impulsionaram a sistematização dos conhecimentos matemáticos, gerando novos campos: Geometria Analítica, Geometria Projetiva, Álgebra Linear, entre outros. O estudo das grandezas variáveis deu origem ao conceito de função e fez surgir, em decorrência, um novo ramo: a Análise Matemática.
A Matemática transforma-se por fim na ciência que estuda todas as possíveis relações e interdependências quantitativas entre grandezas, comportando um vasto campo de teorias, modelos e procedimentos de análise, metodologias próprias de pesquisa, formas de coletar e interpretar dados.
Embora as investigações no campo da Matemática se situem ora dentro do campo da chamada matemática pura, ora dentro da chamada matemática aplicada, elas se influenciam mutuamente; dessa forma, descobertas dos chamados “matemáticos puros” revelam mais tarde um valor prático inesperado, assim como o estudo de propriedades matemáticas em acontecimentos particulares conduzem às vezes ao chamado conhecimento matemático teórico.
Se Matemática pura e aplicada não se contrapõem, também a característica de exatidão não diminui a importância de teorias como das probabilidades, nem de procedimentos que envolvem a estimativa e a aproximação.
O conhecimento matemático é fruto de um processo de que fazem parte a imaginação, os contra-exemplos, as conjecturas, as críticas, os erros e os acertos. Mas ele é apresentado de forma descontextualizada, atemporal e geral, porque é preocupação do matemático comunicar resultados e não o processo pelo qual os produziu.
A Matemática desenvolve-se, desse modo, mediante um processo conflitivo entre muitos elementos contrastantes: o concreto e o abstrato, o particular e o geral, o formal e o informal, o finito e o infinito, o discreto e o contínuo. Curioso notar que tais conflitos encontram-se também no âmbito do ensino dessa disciplina.

O PAPEL DA MATEMÁTICA NO ENSINO FUNDAMENTAL

A Matemática comporta um amplo campo de relações, regularidades e coerências que despertam a curiosidade e instigam a capacidade de generalizar, projetar, prever e abstrair, favorecendo a estruturação do pensamento e o desenvolvimento do raciocínio lógico. Faz parte da vida de todas as pessoas nas experiências mais simples como contar, comparar e operar sobre quantidades. Nos cálculos relativos a salários, pagamentos e consumo, na organização de atividades como agricultura e pesca, a Matemática se apresenta como um conhecimento de muita aplicabilidade.
Também é um instrumental importante para diferentes áreas do conhecimento, por ser utilizada em estudos tanto ligada às ciências da natureza como às ciências sociais e por estar presente na composição musical, na coreografia, na arte e nos esportes.
Essa potencialidade do conhecimento matemático deve ser explorada, da forma mais ampla possível, no ensino fundamental.
Para tanto, é importante que a Matemática desempenhe, equilibrada e indissociavelmente, seu papel na formação de capacidades intelectuais, na estruturação do pensamento, na agilização do raciocínio dedutivo do aluno, na sua aplicação a problemas, situações da vida cotidiana e atividades do mundo do trabalho e no apoio à construção de conhecimentos em outras áreas curriculares.

MATEMÁTICA E CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA

O papel que a Matemática desempenha na formação básica do cidadão brasileiro norteia estes Parâmetros. Falar em formação básica para a cidadania significa falar da inserção das pessoas no mundo do trabalho, das relações sociais e da cultura, no âmbito da sociedade brasileira.
A pluralidade de etnias existente no Brasil, que dá origem a diferentes modos de vida, valores, crenças e conhecimentos, apresenta-se para a educação matemática como um desafio interessante.
Os alunos trazem para a escola conhecimentos, idéias e intuições, construídas através das experiências que vivenciam em seu grupo sociocultural. Eles chegam à sala de aula com diferenciadas ferramentas básica para, por exemplo, classificar, ordenar, quantificar e medir. Além disso, aprendem a atuar de acordo com os recursos, dependências e restrições de seu meio.
A par desses esquemas de pensamentos e práticas, todo aluno brasileiro faz parte de uma sociedade em que se fala a mesma língua, se utiliza o mesmo sistema de numeração, o mesmo sistema de medidas, o mesmo sistema monetário; além disso, recebe informações veiculadas por meio de mídias abrangentes, que se utilizam de linguagens e recursos gráficos comuns, independentemente das características particulares dos grupos receptores.
Desse modo, um currículo de Matemática deve procurar contribuir, de um lado, para a valorização da pluralidade sociocultural, impedindo o processo de submissão no confronto com outras culturas; de outro, criar condições para que o aluno transcenda um modo de vida restrito a um determinado espaço social e se torne ativo na transformação de seu ambiente.
A compreensão e a tomada de decisões diante de questões políticas e sociais também dependem da leitura e interpretação de informações complexas, muitas vezes contraditórias, que incluem dados estatísticos e índices divulgados pelos meios de comunicação. Ou seja, para exercer a cidadania, é necessário saber calcular, medir, raciocinar, argumentar, tratar informações estatisticamente, etc.
Da mesma forma, a sobrevivência numa sociedade que, a cada dia, torna-se mais complexa, exigindo novos padrões de produtividade, depende cada vez mais de conhecimento.
Uma característica contemporânea marcante é que na maioria dos campos profissionais o tempo de um determinado método de produção não vai além de cinco a sete anos, pois novas demandas surgem e os procedimentos tornam-se superados. Isso faz com que o profissional tenha que estar num contínuo processo de formação e, portanto, “aprender a aprender” é também fundamental.
Novas competências demandam novos conhecimentos: o mundo do trabalho requer pessoas preparadas para utilizar diferentes tecnologias e linguagens (que vão além da comunicação oral e escrita), instalando novos ritmos de produção, de assimilação rápida de informações, resolvendo e propondo problemas em equipe.
Para tanto, o ensino de Matemática prestará sua contribuição à medida que forem exploradas metodologias que priorizem a criação de estratégias, a comprovação, a justificativa, a argumentação, o espírito crítico, e favoreçam a criatividade, o trabalho coletivo, a iniciativa pessoal e a autonomia advinda do desenvolvimento da confiança na própria capacidade de conhecer e enfrentar desafios.
É importante destacar que a Matemática deverá ser vista pelo aluno como um conhecimento que pode favorecer o desenvolvimento do seu raciocínio, de sua capacidade expressiva, de sua sensibilidade estética e de sua imaginação.

MATEMÁTICA E OS TEMAS TRANSVERSAIS

A interação do ensino de Matemática com os Temas Transversais é uma questão bastante nova. Centrado em si mesmo, limitando-se à exploração de conteúdos meramente acadêmicos, de forma isolada, sem qualquer conexão entre seus próprios campos ou com outras áreas de conhecimento, o ensino dessa disciplina pouco tem contribuído para a formação integral do aluno, com vistas à conquista da cidadania.
No intuito de reverter esse quadro, a alternativa do desenvolvimento de projetos vem sendo praticada por muitas escolas.
Os projetos proporcionam contextos que geram a necessidade e a possibilidade de organizar os conteúdos de forma a lhes conferir significado. É importante identificar que tipos de projetos exploram problemas cuja abordagem pressupõe a intervenção da Matemática, e em que medida ela oferece subsídios para a compreensão dos temas envolvidos.
Tendo em vista o estabelecimento de conexões entre a Matemática e os Temas Transversais, algumas considerações devem ser ponderadas.

Ética

A formação de indivíduos éticos pode ser estimulada nas aulas de Matemática ao direciona-se o trabalho ao desenvolvimento de atitudes no aluno, como, por exemplo, a confiança na própria capacidade e na dos outros para construir conhecimentos matemáticos, o empenho em participar ativamente das atividades em sala de aula e o respeito à forma de pensar dos colegas.
Isso ocorrerá na medida em que o professor valorizar a troca de experiências entre os alunos como forma de aprendizagem, promover o intercâmbio de idéias como fonte de aprendizagem, respeitar ele próprio o pensamento e a produção dos alunos e desenvolver um trabalho livre do preconceito de que Matemática é um conhecimento direcionado apenas para poucos indivíduos talentosos.
A construção de uma visão solidária de relações humanas a partir da sala de aula contribuirá para que os alunos superem o individualismo e valorizem a interação e a troca, percebendo que as pessoas se complementam e dependem umas das outras.

Orientação Sexual

Acomodar num mesmo patamar os papéis desempenhados por homens e mulheres na construção da sociedade contemporânea ainda encontra barreiras ancoradas em expectativas bastante diferenciadas com relação ao papel futuro de meninos e meninas. No entanto, como importante instituição formadora de cidadãos, a escola não pode estabelecer qualquer tipo de diferença em relação à capacidade de aprendizagem entre alunos de diferentes sexos.
Ao ensino de Matemática cabe fornecer os mesmos instrumentos de aprendizagem e de desenvolvimento de aptidões a todos, valorizando a igualdade de oportunidades sociais para homens e mulheres.

Meio Ambiente

A compreensão das questões ambientais pressupõe um trabalho interdisciplinar em que a Matemática está inserida. A quantificação de aspectos envolvidos em problemas ambientais favorece uma visão mais clara deles, ajudando na tomada de decisões e permitindo intervenções necessárias (reciclagem e reaproveitamento de materiais, por exemplo).
A compreensão dos fenômenos que ocorrem no ambiente — poluição, desmatamento, limites para uso dos recursos naturais, desperdício — terá ferramentas essenciais em conceitos (médias, áreas, volumes, proporcionalidade, etc.) e procedimentos matemáticos (formulação de hipóteses, realização de cálculos, coleta, organização e interpretação de dados estatísticos, prática da argumentação, etc.).

Saúde

As informações sobre saúde, muitas vezes apresentadas em dados estatísticos, permitem o estabelecimento de comparações e previsões, que contribuem para o autoconhecimento, possibilitam o autocuidado e ajudam a compreender aspectos sociais relacionados a problemas de saúde.
O acompanhamento do próprio desenvolvimento físico (altura, peso, musculatura) e o estudo dos elementos que compõem a dieta básica são alguns exemplos de trabalhos que podem servir de contexto para a aprendizagem de conteúdos matemáticos e também podem encontrar na Matemática instrumentos para serem mais bem compreendidos.

Pluralidade Cultural

A construção e a utilização do conhecimento matemático não são feitas apenas por matemáticos, cientistas ou engenheiros, mas, de formas diferenciadas, por todos os grupos socioculturais, que desenvolvem e utilizam habilidades para contar, localizar, medir, desenhar, representar, jogar e explicar, em função de suas necessidades e interesses.
Valorizar esse saber matemático, intuitivo e cultural, aproximar o saber escolar do universo cultural em que o aluno está inserido, é de fundamental importância para o processo de ensino e aprendizagem.
Por outro lado, ao dar importância a esse saber, a escola contribui para a superação do preconceito de que Matemática é um conhecimento produzido exclusivamente por determinados grupos sociais ou sociedades mais desenvolvidas.
Nesse trabalho, a História da Matemática, bem como os estudos da Etnomatemática, são importantes para explicitar a dinâmica da produção desse conhecimento, histórica e socialmente.

Outros temas

Além dos temas apresentados, cada escola pode desenvolver projetos envolvendo outras questões consideradas de relevância para a comunidade. Temas relacionados à educação do consumidor, por exemplo, são contextos privilegiados para o desenvolvimento de conteúdos relativos a medida, porcentagem, sistema monetário, e, desse modo, podem merecer especial atenção no planejamento de Matemática.

APRENDER E ENSINAR MATEMÁTICA NO ENSINO FUNDAMENTAL

O estudo dos fenômenos relacionados ao ensino e à aprendizagem da Matemática pressupõe a análise de variáveis envolvidas nesse processo — aluno, professor e saber matemático —, assim como das relações entre elas.
Numa reflexão sobre o ensino da Matemática é de fundamental importância ao professor:
• identificar as principais características dessa ciência, de seus métodos, de suas ramificações e aplicações;
• conhecer a história de vida dos alunos, sua vivência de aprendizagens fundamentais, seus conhecimentos informais sobre um dado assunto, suas condições sociológicas, psicológicas e culturais;
• ter clareza de suas próprias concepções sobre a Matemática, uma vez que a prática em sala de aula, as escolhas pedagógicas, a definição de objetivos e conteúdos de ensino e as formas de avaliação estão intimamente ligadas a essas concepções.

O aluno e o saber matemático

As necessidades cotidianas fazem com que os alunos desenvolvam uma inteligência essencialmente prática, que permite reconhecer problemas, buscar e selecionar informações, tomar decisões e, portanto, desenvolver uma ampla capacidade para lidar com a atividade matemática.
Quando essa capacidade é potencializada pela escola, a aprendizagem apresenta melhor resultado. No entanto, apesar dessa evidência, tem-se buscado, sem sucesso, uma aprendizagem em Matemática pelo caminho da reprodução de procedimentos e da acumulação de informações; nem mesmo a exploração de materiais didáticos tem contribuído para uma aprendizagem mais eficaz, por ser realizada em contextos pouco significativos e de forma muitas vezes artificial.
É fundamental não subestimar a capacidade dos alunos, reconhecendo que resolvem problemas, mesmo que razoavelmente complexos, lançando mão de seus conhecimentos sobre o assunto e buscando estabelecer relações entre o já conhecido e o novo.
O significado da atividade matemática para o aluno também resulta das conexões que ele estabelece entre ela e as demais disciplinas, entre ela e seu cotidiano e das conexões que ele percebe entre os diferentes temas matemáticos.
Ao relacionar idéias matemáticas entre si, podem reconhecer princípios gerais, como proporcionalidade, igualdade, composição e inclusão e perceber que processos como o estabelecimento de analogias, indução e dedução estão presentes tanto no trabalho com números e operações como em espaço, forma e medidas.
O estabelecimento de relações é tão importante quanto a exploração dos conteúdos matemáticos, pois, abordados de forma isolada, os conteúdos podem acabar representando muito pouco para a formação do aluno, particularmente para a formação da cidadania.

O professor e o saber matemático

O conhecimento da história dos conceitos matemáticos precisa fazer parte da formação dos professores para que tenham elementos que lhes permitam mostrar aos alunos a Matemática como ciência que não trata de verdades eternas, infalíveis e imutáveis, mas como ciência dinâmica, sempre aberta à incorporação de novos conhecimentos.
Além disso, conhecer os obstáculos envolvidos no processo de construção de conceitos é de grande utilidade para que o professor compreenda melhor alguns aspectos da aprendizagem dos alunos.
O conhecimento matemático formalizado precisa, necessariamente, ser transformado para se tornar passível de ser ensinado/aprendido; ou seja, a obra e o pensamento do matemático teórico não são passíveis de comunicação direta aos alunos. Essa consideração implica rever a ideia, que persiste na escola, de ver nos objetos de ensino cópias fiéis dos objetos da ciência.
Esse processo de transformação do saber científico em saber escolar não passa apenas por mudanças de natureza epistemológica, mas é influenciado por condições de ordem social e cultural que resultam na elaboração de saberes intermediários, como aproximações provisórias, necessárias e intelectualmente formadoras. É o que se pode chamar de contextualização do saber.
Por outro lado, um conhecimento só é pleno se for mobilizado em situações diferentes daquelas que serviram para lhe dar origem. Para que sejam transferíveis a novas situações e generalizados, os conhecimentos devem ser descontextualizados, para serem contextualizados novamente em outras situações. Mesmo no ensino fundamental, espera-se que o conhecimento aprendido não fique indissoluvelmente vinculado a um contexto concreto e único, mas que possa ser generalizado, transferido a outros contextos.

As relações professor-aluno e aluno-aluno

Tradicionalmente, a prática mais freqüente no ensino de Matemática era aquela em que o professor apresentava o conteúdo oralmente, partindo de definições, exemplos, demonstração de propriedades, seguidos de exercícios de aprendizagem, fixação e aplicação, e pressupunha que o aluno aprendia pela reprodução. Considerava-se que uma reprodução correta era evidência de que ocorrera a aprendizagem.
Essa prática de ensino mostrou-se ineficaz, pois a reprodução correta poderia ser apenas uma simples indicação de que o aluno aprendeu a reproduzir mas não apreendeu o conteúdo.
É relativamente recente, na história da Didática, a atenção ao fato de que o aluno é agente da construção do seu conhecimento, pelas conexões que estabelece com seu conhecimento prévio num contexto de resolução de problemas.
Naturalmente, à medida que se redefine o papel do aluno perante o saber, é preciso redimensionar também o papel do professor que ensina Matemática no ensino fundamental.
Numa perspectiva de trabalho em que se considere a criança como protagonista da construção de sua aprendizagem, o papel do professor ganha novas dimensões. Uma faceta desse papel é a de organizador da aprendizagem; para desempenhá-la, além de conhecer as condições socioculturais, expectativas e competência cognitiva dos alunos, precisará escolher o(s) problema(s) que possibilita(m) a construção de conceitos/procedimentos e alimentar o processo de resolução, sempre tendo em vista os objetivos a que se propõe atingir.
Além de organizador, o professor também é consultor nesse processo. Não mais aquele que expõe todo o conteúdo aos alunos, mas aquele que fornece as informações necessárias, que o aluno não tem condições de obter sozinho. Nessa função, faz explanações, oferece materiais, textos, etc.
Outra de suas funções é como mediador, ao promover a confrontação das propostas dos alunos, ao disciplinar as condições em que cada aluno pode intervir para expor sua solução, questionar, contestar. Nesse papel, o professor é responsável por arrolar os procedimentos empregados e as diferenças encontradas, promover o debate sobre resultados e métodos, orientar as reformulações e valorizar as soluções mais adequadas. Ele também decide se é necessário prosseguir o trabalho de pesquisa de um dado tema ou se é o momento de elaborar uma síntese, em função das expectativas de aprendizagem previamente estabelecidas em seu planejamento.
Atua como controlador ao estabelecer as condições para a realização das atividades e fixar prazos, sem esquecer de dar o tempo necessário aos alunos.
Como um incentivador da aprendizagem, o professor estimula a cooperação entre os alunos, tão importante quanto a própria interação adulto/criança. A confrontação daquilo que cada criança pensa com o que pensam seus colegas, seu professor e demais pessoas com quem convive é uma forma de aprendizagem significativa, principalmente por pressupor a necessidade de formulação de argumentos (dizendo, descrevendo, expressando) e a de comprová-los (convencendo, questionando).
Além da interação entre professor e aluno, a interação entre alunos desempenha papel fundamental na formação das capacidades cognitivas e afetivas. Em geral, explora-se mais o aspecto afetivo dessas interações e menos sua potencialidade em termos de construção de conhecimento.
Trabalhar coletivamente, por sua vez, supõe uma série de aprendizagens, como:
• perceber que além de buscar a solução para uma situação proposta devem cooperar para resolvê-la e chegar a um consenso;
• saber explicitar o próprio pensamento e tentar compreender o pensamento do outro;
• discutir as dúvidas, assumir que as soluções dos outros fazem sentido e persistir na tentativa de construir suas próprias idéias;
• incorporar soluções alternativas, reestruturar e ampliar a compreensão acerca dos conceitos envolvidos nas situações e, desse modo, aprender.
Essas aprendizagens só serão possíveis na medida em que o professor proporcionar um ambiente de trabalho que estimule o aluno a criar, comparar, discutir, rever, perguntar e ampliar ideias.
É importante atentar para o fato de que as interações que ocorrem na sala de aula — entre professor e aluno ou entre alunos — devem ser regulamentadas por um “contrato didático” no qual, para cada uma das partes, sejam explicitados claramente seu papel e suas responsabilidades diante do outro.

Alguns caminhos para “fazer Matemática” na sala de aula

É consensual a ideia de que não existe um caminho que possa ser identificado como único e melhor para o ensino de qualquer disciplina, em particular, da Matemática. No entanto, conhecer diversas possibilidades de trabalho em sala de aula é fundamental para que o professor construa sua prática. Dentre elas, destacam-se algumas.

O RECURSO À RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS

Resolução de problemas é um caminho para o ensino de Matemática que vem sendo discutido ao longo dos últimos anos.
A História da Matemática mostra que ela foi construída como resposta a perguntas provenientes de diferentes origens e contextos, motivadas por problemas de ordem prática (divisão de terras, cálculo de créditos), por problemas vinculados a outras ciências (Física, Astronomia), bem como por problemas relacionados a investigações internas à própria Matemática.
Todavia, tradicionalmente, os problemas não têm desempenhado seu verdadeiro papel no ensino, pois, na melhor das hipóteses, são utilizados apenas como forma de aplicação de conhecimentos adquiridos anteriormente pelos alunos.
A prática mais freqüente consiste em ensinar um conceito, procedimento ou técnica e depois apresentar um problema para avaliar se os alunos são capazes de empregar o que lhes foi ensinado.
Para a grande maioria dos alunos, resolver um problema significa fazer cálculos com os números do enunciado ou aplicar algo que aprenderam nas aulas.
Desse modo, o que o professor explora na atividade matemática não é mais a atividade, ela mesma, mas seus resultados, definições, técnicas e demonstrações.
Conseqüentemente, o saber matemático não se apresenta ao aluno como um sistema de conceitos, que lhe permite resolver um conjunto de problemas, mas como um interminável discurso simbólico, abstrato e incompreensível.
Nesse caso, a concepção de ensino e aprendizagem subjacente é a de que o aluno aprende por reprodução/imitação.
Ao colocar o foco na resolução de problemas, o que se defende é uma proposta que poderia ser resumida nos seguintes princípios:
• o ponto de partida da atividade matemática não é a definição, mas o problema. No processo de ensino e aprendizagem, conceitos, idéias e métodos matemáticos devem ser abordados mediante a exploração de problemas, ou seja, de situações em que os alunos precisem desenvolver algum tipo de estratégia para resolvê-las;
• o problema certamente não é um exercício em que o aluno aplica, de forma quase mecânica, uma fórmula ou um processo operatório. Só há problema se o aluno for levado a interpretar o enunciado da questão que lhe é posta e a estruturar a situação que lhe é apresentada;
• aproximações sucessivas ao conceito são construídas para resolver um certo tipo de problema; num outro momento, o aluno utiliza o que aprendeu para resolver outros, o que exige transferências, retificações, rupturas, segundo um processo análogo ao que se pode observar na história da Matemática;
• o aluno não constrói um conceito em resposta a um problema, mas constrói um campo de conceitos que tomam sentido num campo de problemas. Um conceito matemático se constrói articulado com outros conceitos, por meio de uma série de retificações e generalizações;
• a resolução de problemas não é uma atividade para ser desenvolvida em paralelo ou como aplicação da aprendizagem, mas uma orientação para a aprendizagem, pois proporciona o contexto em que se pode apreender conceitos, procedimentos e atitudes matemáticas.
Considerados esses princípios, convém precisar algumas características das situações que podem ser entendidas como problemas.
Um problema matemático é uma situação que demanda a realização de uma seqüência de ações ou operações para obter um resultado. Ou seja, a solução não está disponível de início, no entanto é possível construí-la.
Em muitos casos, os problemas usualmente apresentados aos alunos não constituem verdadeiros problemas, porque, via de regra, não existe um real desafio nem a necessidade de verificação para validar o processo de solução.
O que é problema para um aluno pode não ser para outro, em função do seu nível de desenvolvimento intelectual e dos conhecimentos de que dispõe.
Resolver um problema pressupõe que o aluno:
• elabore um ou vários procedimentos de resolução (como, por exemplo, realizar simulações, fazer tentativas, formular hipóteses);
• compare seus resultados com os de outros alunos;
• valide seus procedimentos.
Resolver um problema não se resume em compreender o que foi proposto e em dar respostas aplicando procedimentos adequados. Aprender a dar uma resposta correta, que tenha sentido, pode ser suficiente para que ela seja aceita e até seja convincente, mas não é garantia de apropriação do conhecimento envolvido.
Além disso, é necessário desenvolver habilidades que permitam pôr à prova os resultados, testar seus efeitos, comparar diferentes caminhos, para obter a solução. Nessa forma de trabalho, o valor da resposta correta cede lugar ao valor do processo de resolução.
O fato de o aluno ser estimulado a questionar sua própria resposta, a questionar o problema, a transformar um dado problema numa fonte de novos problemas, evidencia uma concepção de ensino e aprendizagem não pela mera reprodução de conhecimentos, mas pela via da ação refletida que constrói conhecimentos.

O RECURSO À HISTÓRIA DA MATEMÁTICA

A História da Matemática, mediante um processo de transposição didática e juntamente com outros recursos didáticos e metodológicos, pode oferecer uma importante contribuição ao processo de ensino e aprendizagem em Matemática.
Ao revelar a Matemática como uma criação humana, ao mostrar necessidades e preocupações de diferentes culturas, em diferentes momentos históricos, ao estabelecer comparações entre os conceitos e processos matemáticos do passado e do presente, o professor tem a possibilidade de desenvolver atitudes e valores mais favoráveis do aluno diante do conhecimento matemático.
Além disso, conceitos abordados em conexão com sua história constituem-se veículos de informação cultural, sociológica e antropológica de grande valor formativo. A História da Matemática é, nesse sentido, um instrumento de resgate da própria identidade cultural. Em muitas situações, o recurso à História da Matemática pode esclarecer idéias matemáticas que estão sendo construídas pelo aluno, especialmente para dar respostas a alguns “porquês” e, desse modo, contribuir para a constituição de um olhar mais crítico sobre os objetos de conhecimento.

O RECURSO ÀS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO

As técnicas, em suas diferentes formas e usos, constituem um dos principais agentes de transformação da sociedade, pelas implicações que exercem no cotidiano das pessoas.
Estudiosos do tema mostram que escrita, leitura, visão, audição, criação e aprendizagem são capturados por uma informática cada vez mais avançada. Nesse cenário, insere-se mais um desafio para a escola, ou seja, o de como incorporar ao seu trabalho, apoiado na oralidade e na escrita, novas formas de comunicar e conhecer.
Por outro lado, também é fato que o acesso a calculadoras, computadores e outros elementos tecnológicos já é uma realidade para parte significativa da população.
Estudos e experiências evidenciam que a calculadora é um instrumento que pode contribuir para a melhoria do ensino da Matemática. A justificativa para essa visão é o fato de que ela pode ser usada como um instrumento motivador na realização de tarefas exploratórias e de investigação.
Além disso, ela abre novas possibilidades educativas, como a de levar o aluno a perceber a importância do uso dos meios tecnológicos disponíveis na sociedade contemporânea. A calculadora é também um recurso para verificação de resultados, correção de erros, podendo ser um valioso instrumento de auto-avaliação.
Como exemplo de uma situação exploratória e de investigação que se tornaria imprópria sem o uso de calculadora, poder-se-ia imaginar um aluno sendo desafiado a descobrir e a interpretar os resultados que obtém quando divide um número sucessivamente por dois (se começar pelo 1, obterá 0,5; 0,25; 0,125; 0,0625; 0,03125; 0,015625). Usando a calculadora, terá muito mais condições de prestar atenção no que está acontecendo com os resultados e de construir o significado desses números.
O fato de, neste final de século, estar emergindo um conhecimento por simulação, típico da cultura informática, faz com que o computador seja também visto como um recurso didático cada dia mais indispensável.
Ele é apontado como um instrumento que traz versáteis possibilidades ao processo de ensino e aprendizagem de Matemática, seja pela sua destacada presença na sociedade moderna, seja pelas possibilidades de sua aplicação nesse processo.
Tudo indica que seu caráter lógico-matemático pode ser um grande aliado do desenvolvimento cognitivo dos alunos, principalmente na medida em que ele permite um trabalho que obedece a distintos ritmos de aprendizagem.
Embora os computadores ainda não estejam amplamente disponíveis para a maioria das escolas, eles já começam a integrar muitas experiências educacionais, prevendo-se sua utilização em maior escala a curto prazo. Isso traz como necessidade a incorporação de estudos nessa área, tanto na formação inicial como na formação continuada do professor do ensino fundamental, seja para poder usar amplamente suas possibilidades ou para conhecer e analisar softwares educacionais.
Quanto aos softwares educacionais é fundamental que o professor aprenda a escolhê-los em função dos objetivos que pretende atingir e de sua própria concepção de conhecimento e de aprendizagem, distinguindo os que se prestam mais a um trabalho dirigido para testar conhecimentos dos que procuram levar o aluno a interagir com o programa de forma a construir conhecimento.
O computador pode ser usado como elemento de apoio para o ensino (banco de dados, elementos visuais), mas também como fonte de aprendizagem e como ferramenta para o desenvolvimento de habilidades. O trabalho com o computador pode ensinar o aluno a aprender com seus erros e a aprender junto com seus colegas, trocando suas produções e comparando-as.

O RECURSO AOS JOGOS

Além de ser um objeto sociocultural em que a Matemática está presente, o jogo é uma atividade natural no desenvolvimento dos processos psicológicos básicos; supõe um “fazer sem obrigação externa e imposta”, embora demande exigências, normas e controle.
No jogo, mediante a articulação entre o conhecido e o imaginado, desenvolve-se o autoconhecimento — até onde se pode chegar — e o conhecimento dos outros — o que se pode esperar e em que circunstâncias.
Para crianças pequenas, os jogos são as ações que elas repetem sistematicamente mas que possuem um sentido funcional (jogos de exercício), isto é, são fonte de significados e, portanto, possibilitam compreensão, geram satisfação, formam hábitos que se estruturam num sistema. Essa repetição funcional também deve estar presente na atividade escolar, pois é importante no sentido de ajudar a criança a perceber regularidades.
Por meio dos jogos as crianças não apenas vivenciam situações que se repetem, mas aprendem a lidar com símbolos e a pensar por analogia (jogos simbólicos): os significados das coisas passam a ser imaginados por elas. Ao criarem essas analogias, tornam-se produtoras de linguagens, criadoras de convenções, capacitando-se para se submeterem a regras e dar explicações.
Além disso, passam a compreender e a utilizar convenções e regras que serão empregadas no processo de ensino e aprendizagem. Essa compreensão favorece sua integração num mundo social bastante complexo e proporciona as primeiras aproximações com futuras teorizações.
Em estágio mais avançado, as crianças aprendem a lidar com situações mais complexas (jogos com regras) e passam a compreender que as regras podem ser combinações arbitrárias que os jogadores definem; percebem também que só podem jogar em função da jogada do outro (ou da jogada anterior, se o jogo for solitário). Os jogos com regras têm um aspecto importante, pois neles o fazer e o compreender constituem faces de uma mesma moeda.
A participação em jogos de grupo também representa uma conquista cognitiva, emocional, moral e social para a criança e um estímulo para o desenvolvimento do seu raciocínio lógico.
Finalmente, um aspecto relevante nos jogos é o desafio genuíno que eles provocam no aluno, que gera interesse e prazer. Por isso, é importante que os jogos façam parte da cultura escolar, cabendo ao professor analisar e avaliar a potencialidade educativa dos diferentes jogos e o aspecto curricular que se deseja desenvolver.

OBJETIVOS GERAIS DE MATEMÁTICA PARA O ENSINO FUNDAMENTAL

As finalidades do ensino de Matemática indicam, como objetivos do ensino fundamental, levar o aluno a:
• identificar os conhecimentos matemáticos como meios para compreender e transformar o mundo à sua volta e perceber o caráter de jogo intelectual, característico da Matemática, como aspecto que estimula o interesse, a curiosidade, o espírito de investigação e o desenvolvimento da capacidade para resolver problemas;
• fazer observações sistemáticas de aspectos quantitativos e qualitativos do ponto de vista do conhecimento e estabelecer o maior número possível de relações entre eles, utilizando para isso o conhecimento matemático (aritmético, geométrico, métrico, algébrico, estatístico, combinatório, probabilístico); selecionar, organizar e produzir informações relevantes, para interpretá-las e avaliá-las criticamente;
• resolver situações-problema, sabendo validar estratégias e resultados, desenvolvendo formas de raciocínio e processos, como dedução, indução, intuição, analogia, estimativa, e utilizando conceitos e procedimentos matemáticos, bem como instrumentos tecnológicos disponíveis;
• comunicar-se matematicamente, ou seja, descrever, representar e apresentar resultados com precisão e argumentar sobre suas conjecturas, fazendo uso da linguagem oral e estabelecendo relações entre ela e diferentes representações matemáticas;
• estabelecer conexões entre temas matemáticos de diferentes campos e entre esses temas e conhecimentos de outras áreas curriculares; • sentir-se seguro da própria capacidade de construir conhecimentos matemáticos, desenvolvendo a auto-estima e a perseverança na busca de soluções;
• interagir com seus pares de forma cooperativa, trabalhando coletivamente na busca de soluções para problemas propostos, identificando aspectos consensuais ou não na discussão de um assunto, respeitando o modo de pensar dos colegas e aprendendo com eles.

OS CONTEÚDOS DE MATEMÁTICA NO ENSINO FUNDAMENTAL

A discussão sobre a seleção e a organização de conteúdos tem como diretriz a consecução dos objetivos arrolados no item precedente e seu caráter de essencialidade ao desempenho das funções básicas do cidadão brasileiro.
Assim sendo, trata-se de uma discussão complexa que não se resolve com a apresentação de uma listagem de conteúdos comuns a serem desenvolvidos nacionalmente.

Seleção de conteúdos

Há um razoável consenso no sentido de que os currículos de Matemática para o ensino fundamental devam contemplar o estudo dos números e das operações (no campo da Aritmética e da Álgebra), o estudo do espaço e das formas (no campo da Geometria) e o estudo das grandezas e das medidas (que permite interligações entre os campos da Aritmética, da Álgebra e da Geometria).
O desafio que se apresenta é o de identificar, dentro de cada um desses vastos campos, de um lado, quais conhecimentos, competências, hábitos e valores são socialmente relevantes; de outro, em que medida contribuem para o desenvolvimento intelectual do aluno, ou seja, na construção e coordenação do pensamento lógico-matemático, da criatividade, da intuição, da capacidade de análise e de crítica, que constituem esquemas lógicos de referência para interpretar fatos e fenômenos.
Um olhar mais atento para nossa sociedade mostra a necessidade de acrescentar a esses conteúdos aqueles que permitam ao cidadão “tratar” as informações que recebe cotidianamente, aprendendo a lidar com dados estatísticos, tabelas e gráficos, a raciocinar utilizando idéias relativas à probabilidade e à combinatória.
Embora nestes Parâmetros a Lógica não se constitua como bloco de conteúdo a ser abordado de forma sistemática no ensino fundamental, alguns de seus princípios podem ser tratados de forma integrada aos demais conteúdos, desde as séries iniciais. Tais elementos, construídos por meio de exemplos relativos a situações-problema, ao serem explicitados, podem ajudar a compreender melhor as próprias situações.
Assim, por exemplo, ao estudarem números, os alunos podem perceber e verbalizar relações de inclusão, como a de que todo número par é natural; mas observarão que a recíproca dessa afirmação não é verdadeira, pois nem todo número natural é par. No estudo das formas, mediante a observação de diferentes figuras triangulares, podem perceber que o fato de um triângulo ter ângulos com medidas idênticas às medidas dos ângulos de um outro triângulo é uma condição necessária, embora não suficiente, para que os dois triângulos sejam congruentes.
Também algumas idéias ou procedimentos matemáticos, como proporcionalidade, composição e estimativa, são fontes naturais e potentes de inter-relação e, desse modo, prestam-se a uma abordagem dos conteúdos em que diversas relações podem ser estabelecidas.
A proporcionalidade, por exemplo, está presente na resolução de problemas multiplicativos, nos estudos de porcentagem, de semelhança de figuras, na matemática financeira, na análise de tabelas, gráficos e funções. O fato de que vários aspectos do cotidiano funcionam de acordo com leis de proporcionalidade evidencia que o raciocínio proporcional é útil na interpretação de fenômenos do mundo real. Ele está ligado à inferência e à predição e envolve métodos de pensamento qualitativos e quantitativos (Essa resposta faz sentido? Ela deveria ser maior ou menor?).
Para raciocinar com proporções é preciso abordar os problemas de vários pontos de vista e também identificar situações em que o que está em jogo é a não-proporcionalidade.
Finalmente, a seleção de conteúdos a serem trabalhados pode se dar numa perspectiva mais ampla, ao procurar identificar não só os conceitos mas também os procedimentos e as atitudes a serem trabalhados em classe, o que trará certamente um enriquecimento ao processo de ensino e aprendizagem.

Blocos de conteúdos

NÚMEROS E OPERAÇÕES

Ao longo do ensino fundamental os conhecimentos numéricos são construídos e assimilados pelos alunos num processo dialético, em que intervêm como instrumentos eficazes para resolver determinados problemas e como objetos que serão estudados, considerando-se suas propriedades, relações e o modo como se configuram historicamente.
Nesse processo, o aluno perceberá a existência de diversas categorias numéricas criadas em função de diferentes problemas que a humanidade teve que enfrentar — números naturais, números inteiros positivos e negativos, números racionais (com representações fracionárias e decimais) e números irracionais. À medida que se deparar com situações-problema — envolvendo adição, subtração, multiplicação, divisão, potenciação e radiciação —, ele irá ampliando seu conceito de número.
Com relação às operações, o trabalho a ser realizado se concentrará na compreensão dos diferentes significados de cada uma delas, nas relações existentes entre elas e no estudo reflexivo do cálculo, contemplando diferentes tipos — exato e aproximado, mental e escrito.
Embora nas séries iniciais já se possa desenvolver uma pré-álgebra, é especialmente nas séries finais do ensino fundamental que os trabalhos algébricos serão ampliados; trabalhando com situações-problema, o aluno reconhecerá diferentes funções da álgebra (como modelizar, resolver problemas aritmeticamente insolúveis, demonstrar), representando problemas por meio de equações (identificando parâmetros, variáveis e relações e tomando contato com fórmulas, equações, variáveis e incógnitas) e conhecendo a “sintaxe” (regras para resolução) de uma equação.

ESPAÇO E FORMA

Os conceitos geométricos constituem parte importante do currículo de Matemática no ensino fundamental, porque, por meio deles, o aluno desenvolve um tipo especial de pensamento que lhe permite compreender, descrever e representar, de forma organizada, o mundo em que vive.
A Geometria é um campo fértil para se trabalhar com situações-problema e é um tema pelo qual os alunos costumam se interessar naturalmente. O trabalho com noções geométricas contribui para a aprendizagem de números e medidas, pois estimula a criança a observar, perceber semelhanças e diferenças, identificar regularidades e vice-versa.
Além disso, se esse trabalho for feito a partir da exploração dos objetos do mundo físico, de obras de arte, pinturas, desenhos, esculturas e artesanato, ele permitirá ao aluno estabelecer conexões entre a Matemática e outras áreas do conhecimento.

GRANDEZAS E MEDIDAS

Este bloco caracteriza-se por sua forte relevância social, com evidente caráter prático e utilitário. Na vida em sociedade, as grandezas e as medidas estão presentes em quase todas as atividades realizadas. Desse modo, desempenham papel importante no currículo, pois mostram claramente ao aluno a utilidade do conhecimento matemático no cotidiano.
As atividades em que as noções de grandezas e medidas são exploradas proporcionam melhor compreensão de conceitos relativos ao espaço e às formas. São contextos muito ricos para o trabalho com os significados dos números e das operações, da ideia de proporcionalidade e escala, e um campo fértil para uma abordagem histórica.

TRATAMENTO DA INFORMAÇÃO

A demanda social é que leva a destacar este tema como um bloco de conteúdo, embora pudesse ser incorporado aos anteriores. A finalidade do destaque é evidenciar sua importância, em função de seu uso atual na sociedade.
Integrarão este bloco estudos relativos a noções de estatística, de probabilidade e de combinatória.
Evidentemente, o que se pretende não é o desenvolvimento de um trabalho baseado na definição de termos ou de fórmulas envolvendo tais assuntos.
Com relação à estatística, a finalidade é fazer com que o aluno venha a construir procedimentos para coletar, organizar, comunicar e interpretar dados, utilizando tabelas, gráficos e representações que aparecem freqüentemente em seu dia-a-dia.
Relativamente à combinatória, o objetivo é levar o aluno a lidar com situações-problema que envolvam combinações, arranjos, permutações e, especialmente, o princípio multiplicativo da contagem.
Com relação à probabilidade, a principal finalidade é a de que o aluno compreenda que grande parte dos acontecimentos do cotidiano é de natureza aleatória e é possível identificar prováveis resultados desses acontecimentos. As noções de acaso e incerteza, que se manifestam intuitivamente, podem ser exploradas na escola, em situações nas quais o aluno realiza experimentos e observa eventos (em espaços equiprováveis).

Organização de conteúdos

Uma vez selecionados os conteúdos para o ensino fundamental, eles se organizam em ciclos e, posteriormente, em projetos que cada professor realizará ao longo de um ano letivo.
A organização de conteúdos pressupõe, portanto, que se analise:
• A variedade de conexões que podem ser estabelecidas entre os diferentes blocos, ou seja, ao planejar suas atividades, o professor procurará articular múltiplos aspectos dos diferentes blocos, visando possibilitar a compreensão mais fundamental que o aluno possa atingir a respeito dos princípios/ métodos básicos do corpo de conhecimentos matemáticos (proporcionalidade, equivalência, dedução, etc.); além disso, buscará estabelecer ligações entre a Matemática, as situações cotidianas dos alunos e as outras áreas do conhecimento.
• A ênfase maior ou menor que deve ser dada a cada item, ou seja, que pontos merecem mais atenção e que pontos não são tão fundamentais; assim, por exemplo, o estudo da representação decimal dos números racionais é fundamental devido à disseminação das calculadoras e de outros instrumentos que a utilizam.
• Os níveis de aprofundamento dos conteúdos em função das possibilidades de compreensão dos alunos, isto é, levando em conta que um mesmo tema será explorado em diferentes momentos da aprendizagem e sua consolidação se dará pelo número cada vez maior de relações estabelecidas, é preciso identificar o nível de aprofundamento adequado a cada ciclo.
O detalhamento de conteúdos por ciclos, que será feito na seqüência deste documento, não implica sua imediata transposição para a prática da sala de aula. É fundamental ressaltar que, ao serem reinterpretados regionalmente (nos Estados e Municípios) e localmente (nas unidades escolares), os conteúdos, além de incorporarem elementos específicos de cada realidade, serão organizados de forma articulada e integrada ao projeto educacional de cada escola.

Avaliação em Matemática

Mudanças na definição de objetivos para o ensino fundamental, na maneira de conceber a aprendizagem, na interpretação e na abordagem dos conteúdos matemáticos implicam repensar sobre as finalidades da avaliação, sobre o que e como se avalia, num trabalho que inclui uma variedade de situações de aprendizagem, como a resolução de problemas, o trabalho com jogos, o uso de recursos tecnológicos, entre outros.
Alguns professores têm procurado elaborar instrumentos para registrar observações sobre os alunos.
Um exemplo são as fichas para o mapeamento do desenvolvimento de atitudes, que incluem questões como: Procura resolver problemas por seus próprios meios? Faz perguntas? Usa estratégias criativas ou apenas as convencionais? Justifica as respostas obtidas? Comunica suas respostas com clareza? Participa dos trabalhos em grupo? Ajuda os outros na resolução de problemas? Contesta pontos que não compreende ou com os quais não concorda?
Os resultados expressos pelos instrumentos de avaliação, sejam eles provas, trabalhos, postura em sala, constituem indícios de competências e como tal devem ser considerados. A tarefa do avaliador constitui um permanente exercício de interpretação de sinais, de indícios, a partir dos quais manifesta juízos de valor que lhe permitem reorganizar a atividade pedagógica.
Ao levantar indícios sobre o desempenho dos alunos, o professor deve ter claro o que pretende obter e que uso fará desses indícios. Nesse sentido, a análise do erro pode ser uma pista interessante e eficaz.
Na aprendizagem escolar o erro é inevitável e, muitas vezes, pode ser interpretado como um caminho para buscar o acerto. Quando o aluno ainda não sabe como acertar, faz tentativa, à sua maneira, construindo uma lógica própria para encontrar a solução.
Ao procurar identificar, mediante a observação e o diálogo, como o aluno está pensando, o professor obtém as pistas do que ele não está compreendendo e pode interferir para auxiliá-lo.
Diferentes fatores podem ser causa de um erro. Por exemplo, um aluno que erra o resultado da operação 126 - 39 pode não ter estabelecido uma correspondência entre os dígitos ao “armar” a conta; pode ter subtraído 6 de 9, apoiado na ideia de que na subtração se retira o número menor do número maior; pode ter colocado qualquer número como resposta por não ter compreendido o significado da operação; pode ter utilizado um procedimento aditivo ou contar errado; pode ter cometido erros de cálculo por falta de um repertório básico.
Quando o professor consegue identificar a causa do erro, ele planeja a intervenção adequada para auxiliar o aluno a avaliar o caminho percorrido. Se, por outro lado, todos os erros forem tratados da mesma maneira, assinalando-se os erros e explicando-se novamente, poderá ser útil para alguns alunos, se a explicação for suficiente para esclarecer algum tipo particular de dúvida, mas é bem provável que outros continuarão sem compreender e sem condições de reverter à situação.

MATEMÁTICA
2ª PARTE

PRIMEIRO CICLO
Ensino e aprendizagem de Matemática no primeiro ciclo

As crianças que ingressam no primeiro ciclo, tendo passado ou não pela pré-escola, trazem consigo uma bagagem de noções informais sobre numeração, medida, espaço e forma, construídas em sua vivência cotidiana. Essas noções matemáticas funcionarão como elementos de referência para o professor na organização das formas de aprendizagem.
As coisas que as crianças observam (a mãe fazendo compras, a numeração das casas, os horários das atividades da família), os cálculos que elas próprias fazem (soma de pontos de um jogo, controle de quantidade de figurinhas que possuem) e as referências que conseguem estabelecer (estar distante de, estar próximo de) serão transformadas em objeto de reflexão e se integrarão às suas primeiras atividades matemáticas escolares.
Desse modo, é fundamental que o professor, antes de elaborar situações de aprendizagem, investigue qual é o domínio que cada criança tem sobre o assunto que vai explorar, em que situações algumas concepções são ainda instáveis, quais as possibilidades e as dificuldades de cada uma para enfrentar este ou aquele desafio.
É importante salientar que partir dos conhecimentos que as crianças possuem não significa restringir-se a eles, pois é papel da escola ampliar esse universo de conhecimentos e dar condições a elas de estabelecerem vínculos entre o que conhecem e os novos conteúdos que vão construir, possibilitando uma aprendizagem significativa.
Uma característica marcante dos alunos deste ciclo é que sua participação nas atividades tem um caráter bastante individualista, que os leva a não observar a produção dos colegas; nesse sentido, é fundamental a intervenção do professor, socializando as estratégias pessoais de abordagem de um problema, sejam elas semelhantes ou diferentes, e ensinando a compartilhar conhecimentos.
Eles também se utilizam de representações tanto para interpretar o problema como para comunicar sua estratégia de resolução. Essas representações evoluem de formas pictóricas (desenhos com detalhes nem sempre relevantes para a situação) para representações simbólicas, aproximando- se cada vez mais das representações matemáticas. Essa evolução depende de um trabalho do professor no sentido de chamar a atenção para as representações, mostrar suas diferenças, as vantagens de algumas, etc.
Ao explorarem as situações-problema, os alunos deste ciclo precisam do apoio de recursos como materiais de contagem (fichas, palitos, reprodução de cédulas e moedas), instrumentos de medida, calendários, embalagens, figuras tridimensionais e bidimensionais, etc.
Contudo, de forma progressiva, vão realizando ações, mentalmente, e, após algum tempo, essas ações são absorvidas. Assim, por exemplo, se mostram a certa altura capazes de encontrar todas as possíveis combinações aditivas que resultam 10, sem ter necessidade de apoiar-se em materiais e é importante que isso seja incentivado pelo professor.
Um aspecto muito peculiar a este ciclo é a forte relação entre a língua materna e a linguagem matemática. Se para a aprendizagem da escrita o suporte natural é a fala, que funciona como um elemento de mediação na passagem do pensamento para a escrita, na aprendizagem da Matemática a expressão oral também desempenha um papel fundamental.
Falar sobre Matemática, escrever textos sobre conclusões, comunicar resultados, usando ao mesmo tempo elementos da língua materna e alguns símbolos matemáticos, são atividades importantes para que a linguagem matemática não funcione como um código indecifrável para os alunos.

Objetivos de Matemática para o primeiro ciclo

Neste ciclo, o ensino de Matemática deve levar o aluno a:
• Construir o significado do número natural a partir de seus diferentes usos no contexto social, explorando situações-problema que envolvam contagens, medidas e códigos numéricos.
• Interpretar e produzir escritas numéricas, levantando hipóteses sobre elas, com base na observação de regularidades, utilizando-se da linguagem oral, de registros informais e da linguagem matemática.
• Resolver situações-problema e construir, a partir delas, os significados das operações fundamentais, buscando reconhecer que uma mesma operação está relacionada a problemas diferentes e um mesmo problema pode ser resolvido pelo uso de diferentes operações.
• Desenvolver procedimentos de cálculo — mental, escrito, exato, aproximado — pela observação de regularidades e de propriedades das operações e pela antecipação e verificação de resultados.
• Refletir sobre a grandeza numérica, utilizando a calculadora como instrumento para produzir e analisar escritas.
• Estabelecer pontos de referência para situar-se, posicionar-se e desloca-se no espaço, bem como para identificar relações de posição entre objetos no espaço; interpretar e fornecer instruções, usando terminologia adequada.
• Perceber semelhanças e diferenças entre objetos no espaço, identificando formas tridimensionais ou bidimensionais, em situações que envolvam descrições orais, construções e representações.
• Reconhecer grandezas mensuráveis, como comprimento, massa, capacidade e elaborar estratégias pessoais de medida.
• Utilizar informações sobre tempo e temperatura.
• Utilizar instrumentos de medida, usuais ou não, estimar resultados e expressá-los por meio de representações não necessariamente convencionais.
• Identificar o uso de tabelas e gráficos para facilitar a leitura e interpretação de informações e construir formas pessoais de registro para comunicar informações coletadas.

Conteúdos de Matemática para o primeiro ciclo

No primeiro ciclo as crianças estabelecem relações que as aproximam de alguns conceitos, descobrem procedimentos simples e desenvolvem atitudes perante a Matemática.
Os conhecimentos das crianças não estão classificados em campos (numéricos, geométricos, métricos, etc.), mas sim interligados. Essa forma articulada deve ser preservada no trabalho do professor, pois as crianças terão melhores condições de apreender o significado dos diferentes conteúdos se conseguirem perceber diferentes relações deles entre si.
Desse modo, embora o professor tenha os blocos de conteúdo como referência para seu trabalho, ele deve apresentá-los aos alunos deste ciclo da forma mais integrada possível.
Em função da própria diversidade das experiências vivenciadas pelas crianças também não é possível definir, de forma única, uma seqüência em que conteúdos matemáticos serão trabalhados nem mesmo o nível de aprofundamento que lhes será dado.
Por outro lado, o trabalho a ser desenvolvido não pode ser improvisado, pois há objetivos a serem atingidos. Embora seja possível e aconselhável que em cada sala de aula sejam percorridos diferentes caminhos, é importante que o professor tenha coordenadas orientadoras do seu trabalho;
os objetivos e os blocos de conteúdos são excelentes guias.
Uma abordagem adequada dos conteúdos supõe uma reflexão do professor diante da questão do papel dos conteúdos e de como desenvolvê-los para atingir os objetivos propostos.
Com relação ao número, de forma bastante simples, pode-se dizer que é um indicador de quantidade (aspecto cardinal), que permite evocá-la mentalmente sem que ela esteja fisicamente presente. É também um indicador de posição (aspecto ordinal), que possibilita guardar o lugar ocupado por um objeto, pessoa ou acontecimento numa listagem, sem ter que memorizar essa lista integralmente. Os números também são usados como código, o que não tem necessariamente ligação direta com o aspecto cardinal, nem com o aspecto ordinal (por exemplo, número de telefone, de placa de carro, etc.).
No entanto, essas distinções não precisam ser apresentadas formalmente, mas elas serão identificadas nas várias situações de uso social que os alunos vivenciam e para as quais o professor vai lhes chamar a atenção.
É a partir dessas situações cotidianas que os alunos constroem hipóteses sobre o significado dos números e começam a elaborar conhecimentos sobre as escritas numéricas, de forma semelhante ao que fazem em relação à língua escrita.
As escritas numéricas podem ser apresentadas, num primeiro momento, sem que seja necessário compreendê-las e analisá-las pela explicitação de sua decomposição em ordens e classes (unidades, dezenas e centenas). Ou seja, as características do sistema de numeração são observadas, principalmente por meio da análise das representações numéricas e dos procedimentos de cálculo, em situações-problema.
Grande parte dos problemas no interior da Matemática e fora dela são resolvidos pelas operações fundamentais. Seria natural, portanto, que, levando em conta essa relação, as atividades para o estudo das operações se iniciassem e se desenvolvesse num contexto de resolução de problemas.
No entanto, muitas vezes se observa que o trabalho é iniciado pela obtenção de resultados básicos, seguido imediatamente pelo ensino de técnicas operatórias convencionais e finalizado pela utilização das técnicas em “problemas-modelo”, muitas vezes ligados a uma única idéia das várias que podem ser associadas a uma dada operação.
No primeiro ciclo, serão explorados alguns dos significados das operações, colocando-se em destaque a adição e a subtração, em função das características da situação.
Ao longo desse trabalho, os alunos constroem os fatos básicos das operações (cálculos com dois termos, ambos menores do que dez), constituindo um repertório que dá suporte ao cálculo mental e escrito. Da mesma forma, a calculadora será usada como recurso, não para substituir a construção de procedimentos de cálculo pelo aluno, mas para ajudá-lo a compreendê-los.
Diversas situações enfrentadas pelos alunos não encontram nos conhecimentos aritméticos elementos suficientes para a sua abordagem. Para compreender, descrever e representar o mundo em que vive, o aluno precisa, por exemplo, saber localizar-se no espaço, movimentar-se nele, dimensionar sua ocupação, perceber a forma e o tamanho de objetos e a relação disso com seu uso.
Assim, nas atividades geométricas realizadas no primeiro ciclo, é importante estimular os alunos a progredir na capacidade de estabelecer pontos de referência em seu entorno, a situar-se no espaço, deslocar-se nele, dando e recebendo instruções, compreendendo termos como esquerda, direita, distância, deslocamento, acima, abaixo, ao lado, na frente, atrás, perto, para descrever a posição, construindo itinerários. Também é importante que observem semelhanças e diferenças entre formas tridimensionais e bidimensionais, figuras planas e não planas, que construam e representem objetos de diferentes formas.
A exploração dos conceitos e procedimentos relativos a espaço e forma é que possibilita ao aluno a construção de relações para a compreensão do espaço a sua volta.
Tanto no trabalho com números e operações como no trabalho com espaço e forma, grandezas de diversas naturezas estarão envolvidas. Pela comparação dessas grandezas, em situações-problema e com base em suas experiências pessoais, as crianças deste ciclo usam procedimentos de medida e constroem um conceito aproximativo de medida, identificando quais atributos de um objeto são passíveis de mensuração.
Não é objetivo deste ciclo a formalização de sistemas de medida, mas sim levar a criança a compreender o procedimento de medir, explorando para isso tanto estratégias pessoais quanto ao uso de alguns instrumentos, como balança, fita métrica e recipientes de uso frequente. Também é interessante que durante este ciclo se inicie uma aproximação do conceito de tempo e uma exploração do significado de indicadores de temperatura, com os quais ela tem contato pelos meios de comunicação. Isso pode ser feito a partir de um trabalho com relógios de ponteiros, relógios digitais e termômetros.
Os assuntos referentes ao Tratamento da Informação serão trabalhados neste ciclo de modo a estimularem os alunos a fazer perguntas, a estabelecer relações, a construir justificativas e a desenvolver o espírito de investigação.
A finalidade não é a de que os alunos aprendam apenas a ler e a interpretar representações gráficas, mas que se tornem capazes de descrever e interpretar sua realidade, usando conhecimentos matemáticos.
Neste ciclo é importante que o professor estimule os alunos a desenvolver atitudes de organização, investigação, perseverança. Além disso, é fundamental que eles adquiram uma postura diante de sua produção que os leve a justificar e validar suas respostas e observem que situações de erro são comuns, e a partir delas também se pode aprender. Nesse contexto, é que o interesse, a cooperação e o respeito para com os colegas começa a se constituir.
O primeiro ciclo tem, portanto, como característica geral o trabalho com atividades que aproximem o aluno das operações, dos números, das medidas, das formas e espaço e da organização de informações, pelo estabelecimento de vínculos com os conhecimentos com que ele chega à escola. Nesse trabalho, é fundamental que o aluno adquira confiança em sua própria capacidade para aprender Matemática e explore um bom repertório de problemas que lhe permitam avançar no processo de formação de conceitos.

CONTEÚDOS CONCEITUAIS E PROCEDIMENTAIS

Números Naturais e Sistema de Numeração Decimal

• Reconhecimento de números no contexto diário.
• Utilização de diferentes estratégias para quantificar elementos de uma coleção: contagem, pareamento, estimativa e correspondência de agrupamentos.
• Utilização de diferentes estratégias para identificar números em situações que envolvem contagens e medidas.
• Comparação e ordenação de coleções pela quantidade de elementos e ordenação de grandezas pelo aspecto da medida.
• Formulação de hipóteses sobre a grandeza numérica, pela identificação da quantidade de algarismos e da posição ocupada por eles na escrita numérica.
• Leitura, escrita, comparação e ordenação de números familiares ou freqüentes.
• Observação de critérios que definem uma classificação de números (maior que, menor que, estar entre) e de regras usadas em seriações (mais 1, mais 2, dobro, metade).
• Contagem em escalas ascendentes e descendentes de um em um, de dois em dois, de cinco em cinco, de dez em dez, etc., a partir de qualquer número dado.
• Identificação de regularidades na série numérica para nomear, ler e escrever números menos freqüentes.
• Utilização de calculadora para produzir e comparar escritas numéricas.
• Organização em agrupamentos para facilitar a contagem e a comparação entre grandes coleções.
• Leitura, escrita, comparação e ordenação de notações numéricas pela compreensão das características do sistema de numeração decimal (base, valor posicional).

Operações com Números Naturais

• Análise, interpretação, resolução e formulação de situações-problema, compreendendo alguns dos significados das operações, em especial da adição e da subtração.
• Reconhecimento de que diferentes situações-problema podem ser resolvidas por uma única operação e de que diferentes operações podem resolver um mesmo problema.
• Utilização de sinais convencionais (+, -, x, :, =) na escrita das operações.
• Construção dos fatos básicos das operações a partir de situações problema, para constituição de um repertório a ser utilizado no cálculo.
• Organização dos fatos básicos das operações pela identificação de regularidades e propriedades.
• Utilização da decomposição das escritas numéricas para a realização do cálculo mental exato e aproximado.
• Cálculos de adição e subtração, por meio de estratégias pessoais e algumas técnicas convencionais.
• Cálculos de multiplicação e divisão por meio de estratégias pessoais.
• Utilização de estimativas para avaliar a adequação de um resultado e uso de calculadora para desenvolvimento de estratégias de verificação e controle de cálculos.

Espaço e Forma

• Localização de pessoas ou objetos no espaço, com base em diferentes pontos de referência e algumas indicações de posição.
• Movimentação de pessoas ou objetos no espaço, com base em diferentes pontos de referência e algumas indicações de direção e sentido.
• Descrição da localização e movimentação de pessoas ou objetos no espaço, usando sua própria terminologia.
• Dimensionamento de espaços, percebendo relações de tamanho e forma.
• Interpretação e representação de posição e de movimentação no espaço a partir da análise de maquetes, esboços, croquis e itinerários.
• Observação de formas geométricas presentes em elementos naturais e nos objetos criados pelo homem e de suas características: arredondadas ou não, simétricas ou não, etc.
• Estabelecimento de comparações entre objetos do espaço físico e objetos geométricos — esféricos, cilíndricos, cônicos, cúbicos, piramidais, prismáticos — sem uso obrigatório de nomenclatura.
• Percepção de semelhanças e diferenças entre cubos e quadrados, paralelepípedos e retângulos, pirâmides e triângulos, esferas e círculos.
• Construção e representação de formas geométricas.

Grandezas e Medidas

• Comparação de grandezas de mesma natureza, por meio de estratégias pessoais e uso de instrumentos de medida conhecidos — fita métrica, balança, recipientes de um litro, etc.
• Identificação de unidades de tempo — dia, semana, mês, bimestre, semestre, ano — e utilização de calendários.
• Relação entre unidades de tempo — dia, semana, mês, bimestre, semestre, ano.
• Reconhecimento de cédulas e moedas que circulam no Brasil e de possíveis trocas entre cédulas e moedas em função de seus valores.
• Identificação dos elementos necessários para comunicar o resultado de uma medição e produção de escritas que representem essa medição.
• Leitura de horas, comparando relógios digitais e de ponteiros.

Tratamento da Informação

• Leitura e interpretação de informações contidas em imagens.
• Coleta e organização de informações.
• Criação de registros pessoais para comunicação das informações coletadas.
• Exploração da função do número como código na organização de informações (linhas de ônibus, telefones, placas de carros, registros de identidade, bibliotecas, roupas, calçados).
• Interpretação e elaboração de listas, tabelas simples, de dupla entrada e gráficos de barra para comunicar a informação obtida.
• Produção de textos escritos a partir da interpretação de gráficos e tabelas.

CONTEÚDOS ATITUDINAIS

• Desenvolvimento de atitudes favoráveis para a aprendizagem de Matemática.
• Confiança na própria capacidade para elaborar estratégias pessoais diante de situações-problema.
• Valorização da troca de experiências com seus pares como forma de aprendizagem.
• Curiosidade por questionar, explorar e interpretar os diferentes usos dos números, reconhecendo sua utilidade na vida cotidiana.
• Interesse e curiosidade por conhecer diferentes estratégias de cálculo.
• Valorização da utilidade dos elementos de referência para localizar-se e identificar a localização de objetos no espaço.
• Sensibilidade pela observação das formas geométricas na natureza, nas artes, nas edificações.
• Valorização da importância das medidas e estimativas para resolver problemas cotidianos.
• Interesse por conhecer, interpretar e produzir mensagens, que utilizam formas gráficas para apresentar informações.
• Apreciação da organização na elaboração e apresentação dos trabalhos.

Critérios de avaliação de Matemática para o primeiro ciclo

Os critérios indicados apontam aspectos considerados essenciais em relação às competências que se espera que um aluno desenvolva até o final do primeiro ciclo. Apresentam-se numa forma que permite a cada professor adequá-los em função do trabalho efetivamente realizado em sua sala de aula.
 Resolver situações-problema que envolvam contagem e medida, significados das operações e seleção de procedimentos de cálculo
Espera-se que o aluno resolva problemas expressos por situações orais, textos ou representações matemáticas e utilize conhecimentos relacionados aos números, às medidas, aos significados das operações, selecionando um procedimento de cálculo pessoal ou convencional e produzindo sua expressão gráfica. Ao finalizar este ciclo, os diferentes significados das operações não estão consolidados; por isso, os problemas devem abordar os significados que já foram apropriados pelos alunos, priorizando as situações de adição e subtração.
• Ler e escrever números, utilizando conhecimentos sobre a escrita posicional
Espera-se que o aluno seja capaz de utilizar o número como um instrumento para representar e resolver situações quantitativas presentes no cotidiano, evidenciando a compreensão das regras do sistema de numeração decimal.
 Comparar e ordenar quantidades que expressem grandezas familiares aos alunos, interpretar e expressar os resultados da comparação e da ordenação
Espera-se que o aluno tenha noção de quantidade e utilize procedimentos para identificar e comparar quantidades, em função da ordem de grandeza envolvida, e seja capaz de ordenar quantidades, localizar números em intervalos, numa seqüência numérica (o “limite” da seqüência numérica é estabelecido em função do que for possível avançar, considerando-se as experiências numéricas da classe).
 Medir, utilizando procedimentos pessoais, unidades de medida não-convencionais ou convencionais (dependendo da familiaridade) e instrumentos disponíveis e conhecidos
Espera-se que o aluno saiba medir fazendo uso de unidades de medida não-convencionais, que sejam adequadas ao atributo que se quer medir. O conhecimento e uso de unidades e instrumentos convencionais não são essenciais até o final do primeiro ciclo e dependem da familiaridade que os alunos possam ter com esses elementos em situações do cotidiano. Outro aspecto a ser observado é a capacidade do aluno de realizar algumas estimativas de resultados de medições.
• Localizar a posição de uma pessoa ou um objeto no espaço e identificar características nas formas dos objetos
Espera-se que o aluno utilize elementos de posição como referência para situar-se e movimentar-se em espaços que lhe sejam familiares, assim como para definir a situação de um objeto num determinado espaço. É importante também verificar se ele é capaz de estabelecer semelhanças e diferenças entre os objetos, pela observação de suas formas. A expressão dessas observações é feita por meio de diferentes representações (gráficas, orais, com materiais, etc.).

SEGUNDO CICLO

Ensino e aprendizagem de Matemática no segundo ciclo

Muitos dos aspectos envolvendo o processo de ensino e aprendizagem abordados no item referente ao primeiro ciclo precisam também ser considerados pelos professores do segundo ciclo.
Dentre esses aspectos, destaca-se a importância do conhecimento prévio do aluno como ponto de partida para a aprendizagem, do trabalho com diferentes hipóteses e representações que as crianças produzem, da relação a ser estabelecida entre a linguagem matemática e a língua materna e do uso de recursos didáticos como suporte à ação reflexiva do aluno.
No entanto, há outros aspectos a considerar, levando-se em conta que as capacidades cognitivas dos alunos sofrem avanços significativos.
Eles começam a estabelecer relações de causalidade, o que os estimula a buscar a explicação das coisas (porquês) e as finalidades (para que servem). O pensamento ganha maior flexibilidade, o que lhes possibilita perceber transformações. A reversibilidade do pensamento permite a observação de que alguns elementos dos objetos e das situações permanecem e outros se transformam. Desse modo, passam a descobrir regularidades e propriedades numéricas, geométricas e métricas. Também aumenta a possibilidade de compreensão de alguns significados das operações e das relações entre elas. Ampliam suas hipóteses, estendendo-as a contextos mais amplos.
Assim, por exemplo, percebem que algumas regras, propriedades, padrões, que identificam nos números que lhes são mais familiares, também valem para números “maiores”.
É importante ressaltar que, apesar desses avanços, as generalizações são ainda bastante
elementares e estão ligadas à possibilidade de observar, experimentar, lidar com representações, sem chegar, todavia, a uma formalização de conceitos.
Em relação ao ciclo anterior, os alunos deste ciclo têm possibilidades de maior concentração e capacidade verbal para expressar com mais clareza suas idéias e pontos de vista. Pode-se notar ainda uma evolução das representações pessoais para as representações convencionais; em muitos casos têm condições de prescindir de representações pictóricas e podem lidar diretamente com as escritas matemáticas.
Outro ponto importante a destacar é o de que, por meio de trocas que estabelecem entre si, os alunos passam a deixar de ver seus próprios pontos de vista como verdades absolutas e a enxergar os pontos de vista dos outros, comparando-os aos seus. Isso lhes permite comparar e analisar diferentes estratégias de solução.

Objetivos de Matemática para
o segundo ciclo

Neste ciclo, o ensino de Matemática deve levar o aluno a:
• Ampliar o significado do número natural pelo seu uso em situações problema e pelo reconhecimento de relações e regularidades.
• Construir o significado do número racional e de suas representações (fracionária e decimal), a partir de seus diferentes usos no contexto social.
• Interpretar e produzir escritas numéricas, considerando as regras do sistema de numeração decimal e estendendo-as para a representação dos números racionais na forma decimal.
• Resolver problemas, consolidando alguns significados das operações fundamentais e construindo novos, em situações que envolvam números naturais e, em alguns casos, racionais.
• Ampliar os procedimentos de cálculo — mental, escrito, exato, aproximado — pelo conhecimento de regularidades dos fatos fundamentais, de propriedades das operações e pela antecipação e verificação de resultados.
• Refletir sobre procedimentos de cálculo que levem à ampliação do significado do número e das operações, utilizando a calculadora como estratégia de verificação de resultados.
• Estabelecer pontos de referência para interpretar e representar a localização e movimentação de pessoas ou objetos, utilizando terminologia adequada para descrever posições.
• Identificar características das figuras geométricas, percebendo semelhanças e diferenças entre elas, por meio de composição e decomposição, simetrias, ampliações e reduções.
• Recolher dados e informações, elaborar formas para organizá-los e expressá-los, interpretar dados apresentados sob forma de tabelas e gráficos e valorizar essa linguagem como forma de comunicação.
• Utilizar diferentes registros gráficos — desenhos, esquemas, escritas numéricas — como recurso para expressar idéias, ajudar a descobrir formas de resolução e comunicar estratégias e resultados.
• Identificar características de acontecimentos previsíveis ou aleatórios a partir de situações-problema, utilizando recursos estatísticos e probabilísticos.
• Construir o significado das medidas, a partir de situações-problema que expressem seu uso no contexto social e em outras áreas do conhecimento e possibilitem a comparação de grandezas de mesma natureza.
• Utilizar procedimentos e instrumentos de medida usuais ou não, selecionando o mais adequado em função da situação-problema e do grau de precisão do resultado.
• Representar resultados de medições, utilizando a terminologia convencional para as unidades mais usuais dos sistemas de medida, comparar com estimativas prévias e estabelecer relações entre diferentes unidades de medida.
• Demonstrar interesse para investigar, explorar e interpretar, em diferentes contextos do cotidiano e de outras áreas do conhecimento, os conceitos e procedimentos matemáticos abordados neste ciclo.
• Vivenciar processos de resolução de problemas, percebendo que para resolvê-los é preciso compreender, propor e executar um plano de solução, verificar e comunicar a resposta.

Conteúdos de Matemática
para o segundo ciclo

No segundo ciclo, os alunos ampliam conceitos já trabalhados no ciclo anterior (como o de número natural, adição, medida, etc.), estabelecem relações que os aproximam de novos conceitos como o de número racional, por exemplo), aperfeiçoam procedimentos conhecidos (contagem, medições) e constroem novos (cálculos envolvendo proporcionalidade, por exemplo).
Se no primeiro ciclo o trabalho do professor centra-se na análise das hipóteses levantadas pelos alunos e na exploração das estratégias pessoais que desenvolvem para resolver situações problema, neste ciclo ele pode dar alguns passos no sentido de levar seus alunos a compreenderem enunciados, terminologias e técnicas convencionais sem, no entanto, deixar de valorizar e estimular suas hipóteses e estratégias pessoais.
Em relação aos números naturais, os alunos têm oportunidade de ampliar idéias e procedimentos relativos a contagem, comparação, ordenação, estimativa e operações que os envolvem. Pela análise das regras de funcionamento do sistema de numeração decimal, os alunos podem interpretar e construir qualquer escrita numérica, inclusive a dos números racionais na forma decimal.
Neste ciclo, são apresentadas aos alunos situações-problema cujas soluções não se encontram no campo dos números naturais, possibilitando, assim, que eles se aproximem da noção de número racional, pela compreensão de alguns de seus significados (quociente, parte-todo, razão) e de suas representações, fracionária e decimal.
Quanto às operações, os significados já trabalhados no ciclo anterior são consolidados e novas situações são propostas com vistas à ampliação do conceito de cada uma dessas operações.
Os recursos de cálculo são ampliados neste ciclo pelo fato de o aluno ter uma compreensão mais ampla do sistema de numeração decimal, além de uma flexibilidade de pensamento para construção do seu cálculo mental.
Os procedimentos de validação de estratégias e de resultados obtidos na resolução de problemas também são aprimorados neste ciclo. Nesse contexto, a calculadora pode ser utilizada como um recurso didático, tanto para que o aluno analise resultados que lhe são apresentados, como para controlar e corrigir sua própria produção.
O trabalho com Espaço e Forma centra-se, ainda, na realização de atividades exploratórias do espaço. Assim, deslocando-se no espaço, observando o deslocamento de outras pessoas, antecipando seus próprios deslocamentos, observando e manipulando formas, os alunos percebem as relações dos objetos no espaço e utilizam o vocabulário correspondente (em cima, embaixo, ao lado, atrás, entre, esquerda, direita, no mesmo sentido, em direção contrária).
Mas é importante também que sejam incentivados a trabalhar com representações do espaço, produzindo-as e interpretando-as. O trabalho com malhas e diagramas, a exploração de guias e mapas podem constituir um recurso para a representação do espaço.
Quanto às formas, o professor estimula a observação de características das figuras tridimensionais e bidimensionais, o que lhes permite identificar propriedades e, desse modo, estabelecer algumas classificações.
Em relação às grandezas e medidas, os alunos deste ciclo podem compreender melhor como se processa uma dada medição e que aspectos do processo de medição são sempre válidos. Ou seja, percebem a necessidade de escolher uma certa “unidade”, de comparar essa unidade com o objeto que estão medindo e de contar o número de vezes que essa unidade foi utilizada.
Nesse processo, descobrem que, dependendo da unidade escolhida, o resultado da medição varia e há unidades mais adequadas que outras, em função do que se pretende medir. Relações usuais (metro, centímetro, grama, quilograma, etc.) são exploradas, sem, no entanto, exagerar no trabalho com conversões desprovidas de significado prático (quilômetro para milímetro, por exemplo).
Outra observação é que, embora os alunos possam medir usando padrões não-convencionais, é importante conhecerem os sistemas convencionais, especialmente porque facilitam a comunicação.
O trabalho com medidas evidencia as relações entre sistemas decimais de medida, sistema monetário e sistema de numeração decimal. Também neste ciclo serão ampliadas as noções referentes a tempo e temperatura.
Relativamente ao tratamento da informação, o trabalho a ser desenvolvido a partir da coleta, organização e descrição de dados possibilita aos alunos compreenderem as funções de tabelas e gráficos, usados para comunicar esses dados: a apresentação global da informação, a leitura rápida e o destaque dos aspectos relevantes.
Lendo e interpretando dados apresentados em tabelas e gráficos, os alunos percebem que eles permitem estabelecer relações entre acontecimentos e, em alguns casos, fazer previsões.
Também, ao observarem a freqüência de ocorrência de um acontecimento, ao longo de um grande número de experiências, desenvolvem suas primeiras noções de probabilidade.
A produção de textos escritos a partir da interpretação de gráficos e tabelas, e a construção de gráficos e tabelas, com base em informações contidas em textos jornalísticos e científicos, constituem um aspecto importante a que o professor deve dar especial atenção.
O segundo ciclo tem como característica geral o trabalho com atividades que permitem ao aluno progredir na construção de conceitos e procedimentos matemáticos. No entanto, esse ciclo não constitui um marco de terminalidade da aprendizagem desses conteúdos, o que significa que o trabalho com números naturais e racionais, operações, medidas, espaço e forma e o tratamento da informação deverá ter continuidade, para que o aluno alcance novos patamares de conhecimento.
Nesse trabalho, é fundamental que o aluno reafirme confiança em si próprio diante da resolução de problemas, valorize suas estratégias pessoais e também aquelas que são frutos da evolução histórica do conhecimento matemático.

CONTEÚDOS CONCEITUAIS E PROCEDIMENTAIS
Números Naturais, Sistema de Numeração Decimal
e Números Racionais

• Reconhecimento de números naturais e racionais no contexto diário.
• Compreensão e utilização das regras do sistema de numeração decimal, para leitura, escrita, comparação e ordenação de números naturais de qualquer ordem de grandeza.
• Formulação de hipóteses sobre a grandeza numérica, pela observação da posição dos algarismos na representação decimal de um número racional.
• Extensão das regras do sistema de numeração decimal para compreensão, leitura e representação dos números racionais na forma decimal.
• Comparação e ordenação de números racionais na forma decimal.
• Localização na reta numérica, de números racionais na forma decimal.
• Leitura, escrita, comparação e ordenação de representações fracionárias de uso frequente.
• Reconhecimento de que os números racionais admitem diferentes (infinitas)
representações na forma fracionária. • Identificação e produção de frações equivalentes, pela observação de representações gráficas e de regularidades nas escritas numéricas.
• Exploração dos diferentes significados das frações em situações-problema: parte-todo, quociente e razão.
• Observação de que os números naturais podem ser expressos na forma fracionária.
• Relação entre representações fracionária e decimal de um mesmo número racional.
• Reconhecimento do uso da porcentagem no contexto diário.

Operações com Números Naturais e Racionais

• Análise, interpretação, formulação e resolução de situações-problema, compreendendo diferentes significados das operações envolvendo números naturais e racionais.
• Reconhecimento de que diferentes situações-problema podem ser resolvidas por uma única operação e de que diferentes operações podem resolver um mesmo problema.
• Resolução das operações com números naturais, por meio de estratégias pessoais e do uso de técnicas operatórias convencionais, com compreensão dos processos nelas envolvidos.
• Ampliação do repertório básico das operações com números naturais para o desenvolvimento do cálculo mental e escrito.
• Cálculo de adição e subtração de números racionais na forma decimal, por meio de estratégias pessoais e pelo uso de técnicas operatórias convencionais.
• Desenvolvimento de estratégias de verificação e controle de resultados pelo uso do cálculo mental e da calculadora.
• Decisão sobre a adequação do uso do cálculo mental — exato ou aproximado — ou da técnica operatória, em função do problema, dos números e das operações envolvidas.
• Cálculo simples de porcentagens.

Espaço e Forma

• Descrição, interpretação e representação da posição de uma pessoa ou objeto no espaço, de diferentes pontos de vista.
• Utilização de malhas ou redes para representar, no plano, a posição de uma pessoa ou objeto.
• Descrição, interpretação e representação da movimentação de uma pessoa ou objeto no espaço e construção de itinerários.
• Representação do espaço por meio de maquetes.
• Reconhecimento de semelhanças e diferenças entre corpos redondos, como a esfera, o cone, o cilindro e outros.
• Reconhecimento de semelhanças e diferenças entre poliedros (como os prismas, as pirâmides e outros) e identificação de elementos como faces, vértices e arestas.
• Composição e decomposição de figuras tridimensionais, identificando diferentes possibilidades.
• Identificação da simetria em figuras tridimensionais.
• Exploração das planificações de algumas figuras tridimensionais.
• Identificação de figuras poligonais e circulares nas superfícies planas das figuras tridimensionais.
• Identificação de semelhanças e diferenças entre polígonos, usando critérios como número de lados, número de ângulos, eixos de simetria, etc.
• Exploração de características de algumas figuras planas, tais como: rigidez triangular, paralelismo e perpendicularismo de lados, etc.
• Composição e decomposição de figuras planas e identificação de que qualquer polígono pode ser composto a partir de figuras triangulares.
• Ampliação e redução de figuras planas pelo uso de malhas.
• Percepção de elementos geométricos nas formas da natureza e nas criações artísticas.
• Representação de figuras geométricas.

Grandezas e Medidas

• Comparação de grandezas de mesma natureza, com escolha de uma unidade de medida da mesma espécie do atributo a ser mensurado.
• Identificação de grandezas mensuráveis no contexto diário: comprimento, massa, capacidade, superfície, etc.
• Reconhecimento e utilização de unidades usuais de medida como metro, centímetro, quilômetro, grama, miligrama, quilograma, litro, mililitro, metro quadrado, alqueire, etc.
• Reconhecimento e utilização de unidades usuais de tempo e de temperatura.
• Estabelecimento das relações entre unidades usuais de medida de uma mesma grandeza.
• Reconhecimento dos sistemas de medida que são decimais e conversões usuais, utilizando-as nas regras desse sistema.
• Reconhecimento e utilização das medidas de tempo e realização de conversões simples.
• Utilização de procedimentos e instrumentos de medida, em função do problema e da precisão do resultado.
• Utilização do sistema monetário brasileiro em situações-problema.
• Cálculo de perímetro e de área de figuras desenhadas em malhas quadriculadas e comparação de perímetros e áreas de duas figuras sem uso de fórmulas.

Tratamento da Informação

• Coleta, organização e descrição de dados.
• Leitura e interpretação de dados apresentados de maneira organizada (por meio de listas, tabelas, diagramas e gráficos) e construção dessas representações.
• Interpretação de dados apresentados por meio de tabelas e gráficos, para identificação de características previsíveis ou aleatórias de acontecimentos.
• Produção de textos escritos, a partir da interpretação de gráficos e tabelas, construção de gráficos e tabelas com base em informações contidas em textos jornalísticos, científicos ou outros.
• Obtenção e interpretação de média aritmética.
• Exploração da ideia de probabilidade em situações-problema simples, identificando sucessos possíveis, sucessos seguros e as situações de “sorte”.
• Utilização de informações dadas para avaliar probabilidades.
• Identificação das possíveis maneiras de combinar elementos de uma coleção e de contabilizá-las usando estratégias pessoais.

CONTEÚDOS ATITUDINAIS

• Confiança em suas possibilidades para propor e resolver problemas.
• Perseverança, esforço e disciplina na busca de resultados.
• Segurança na defesa de seus argumentos e flexibilidade para modificá-los.
• Respeito pelo pensamento do outro, valorização do trabalho cooperativo e do intercâmbio de idéias, como fonte de aprendizagem.
• Apreciação da limpeza, ordem, precisão e correção na elaboração e na apresentação dos trabalhos.
• Curiosidade em conhecer a evolução histórica dos números, de seus registros, de sistemas de medida utilizados por diferentes grupos culturais.
• Confiança na própria capacidade para elaborar estratégias pessoais de cálculo, interesse em conhecer e utilizar diferentes estratégias para calcular e os procedimentos de cálculo que permitem generalizações e precisão.
• Curiosidade em conhecer a evolução histórica dos procedimentos e instrumentos de cálculo utilizados por diferentes grupos culturais.
• Valorização da utilidade dos sistemas de referência para localização no espaço.
• Sensibilidade para observar simetrias e outras características das formas geométricas, na natureza, nas artes, nas edificações.
• Curiosidade em conhecer a evolução histórica das medidas, unidades de medida e instrumentos utilizados por diferentes grupos culturais e reconhecimento da importância do uso adequado dos instrumentos e unidades de medida convencionais.
• Interesse na leitura de tabelas e gráficos como forma de obter informações.
• Hábito em analisar todos os elementos significativos presentes em uma representação gráfica, evitando interpretações parciais e precipitadas.

Critérios de avaliação de Matemática
para o segundo ciclo

Os critérios indicados apontam aspectos considerados essenciais em relação às competências que se espera que um aluno desenvolva até o final do segundo ciclo. Apresentam-se numa forma que permite a cada professor adequá-los em função do trabalho efetivamente realizado em sua sala de aula.
• Resolver situações-problema que envolvam contagem, medidas, os significados das operações, utilizando estratégias pessoais de resolução e selecionando procedimentos de cálculo
Espera-se que o aluno resolva problemas utilizando conhecimentos relacionados aos números naturais e racionais (na forma fracionária e decimal), às medidas e aos significados das operações, produzindo estratégias pessoais de solução, selecionando procedimentos de cálculo, justificando tanto os processos de solução quanto os procedimentos de cálculo em função da situação proposta.
• Ler, escrever números naturais e racionais, ordenar números naturais e racionais na forma decimal, pela interpretação do valor posicional de cada uma das ordens
Espera-se que o aluno saiba ler, escrever, ordenar, identificar sequências e localizar, em intervalos, números naturais e números racionais na forma decimal, pela identificação das principais características do sistema de numeração decimal.
 Realizar cálculos, mentalmente e por escrito, envolvendo números naturais e racionais (apenas na representação decimal) e comprovar os resultados, por meio de estratégias de verificação
Espera-se que o aluno saiba calcular com agilidade, utilizando-se de estratégias pessoais e convencionais, distinguindo as situações que requerem resultados exatos ou aproximados. É importante também avaliar a utilização de estratégias de verificação de resultados, inclusive as que fazem uso de calculadoras.
• Medir e fazer estimativas sobre medidas, utilizando unidades e instrumentos de medida mais usuais que melhor se ajustem à natureza da medição realizada
Espera-se avaliar se o aluno sabe escolher a unidade de medida e o instrumento mais adequado a cada situação, fazer previsões razoáveis (estimativas) sobre resultados de situações que envolvam grandezas de comprimento, capacidade e massa, e saiba ler, interpretar e produzir registros utilizando a notação convencional das medidas.
• Interpretar e construir representações espaciais (croquis, itinerários, maquetes), utilizando-se de elementos de referência e estabelecendo relações entre eles
Espera-se que o aluno identifique e estabeleça pontos de referência e estime distâncias ao construir representações de espaços conhecidos, utilizando adequadamente a terminologia usual referente a posições.
• Reconhecer e descrever formas geométricas tridimensionais e bidimensionais
Espera-se que o aluno identifique características das formas geométricas tridimensionais e bidimensionais, percebendo semelhanças e diferenças entre elas (superfícies planas e arredondadas, formas das faces, simetrias) e reconhecendo elementos que as compõem (faces, arestas, vértices, lados, ângulos).
• Recolher dados sobre fatos e fenômenos do cotidiano, utilizando procedimentos de organização, e expressar o resultado utilizando tabelas e gráficos
Espera-se que o aluno saiba coletar, organizar e registrar informações por meio de tabelas e gráficos, interpretando essas formas de registro para fazer previsões.

ORIENTAÇÕES DIDÁTICAS

As orientações didáticas apresentadas a seguir pretendem contribuir para a reflexão a respeito de como ensinar, abordando aspectos ligados às condições nas quais se constituem os conhecimentos matemáticos.
Analisam os conceitos e procedimentos a serem ensinados, os modos pelos quais eles se relacionam entre si, e também as formas por meio das quais as crianças constroem esses conhecimentos matemáticos.

Números Naturais e Sistema
de Numeração Decimal

Os conhecimentos a respeito dos números naturais são construídos num processo em que eles aparecem como um instrumento útil para resolver determinados problemas e como um objeto que pode ser estudado por si mesmo.
Sua utilidade é percebida pelas crianças antes mesmo de chegarem à escola; elas conhecem números de telefone, de ônibus, lidam com preços, numeração de calçado, idade, calendário. O estudo dos números como objeto matemático também deve partir de contextos significativos para os alunos, envolvendo, por exemplo, o reconhecimento da existência de diferentes tipos de números (naturais, racionais e outros) e de suas representações e classificações (primos, compostos, pares, ímpares, etc.).
A criança vem para a escola com um razoável conhecimento não apenas dos números de 1 a 9, como também de números como 12, 13, 15, que já lhe são bastante familiares, e de outros números que aparecem com freqüência no seu dia-a-dia — como os números que indicam os dias do mês, que vão até 30/31.
Desse modo, as atividades de leitura, escrita, comparação e ordenação de notações numéricas devem tomar como ponto de partida os números que a criança conhece. Esse trabalho pode ser feito por meio de atividades em que, por exemplo, o professor:
• elabora, junto com os alunos, um repertório de situações em que usam números;
• pede aos alunos que recortem números em jornais e revistas e façam a leitura deles (do jeito que sabem);
• elabora, com a classe, listas com números de linhas de ônibus da cidade, números de telefones úteis, números de placas de carros, e solicita a leitura deles;
• orienta os alunos para que elaborem fichas onde cada um vai anotar os números referentes a si próprios, tais como: idade, data de nascimento, número do calçado, peso, altura, número de irmãos, número de amigos, etc.;
• trabalha diariamente com o calendário para identificar o dia do mês e registrar a data;
• solicita aos alunos que façam aparecer, no visor de uma calculadora, números escritos no quadro ou indicados oralmente;
• pede aos alunos que observem a numeração da rua onde moram, onde começa e onde termina, e registrem o número de suas casas e de seus vizinhos;
• verifica como os alunos fazem contagens e como fazem a leitura de números com dois ou mais dígitos e que hipóteses possuem acerca das escritas desses números.
Na prática escolar, no entanto, o mais comum é tentar explicitar, logo de início, as ordens que compõem uma escrita numérica — unidade, dezena, etc. — para que o aluno faça a leitura e a escrita dos números com compreensão.
Embora isso possa parecer simples e natural do ponto de vista do adulto, que já conhece as regras de formação do sistema de numeração, o que se observa é que os alunos apresentam dificuldades nesse trabalho, deixando o professor sem compreender por que isso acontece.
No entanto, mesmo sem conhecer as regras do sistema de numeração decimal, as crianças são capazes de indicar qual é o maior número de uma listagem, em função da quantidade de algarismos presentes em sua escrita (justificam que 156 é maior que 76 porque tem mais “números”); também são capazes de escrever e interpretar números compostos por dois ou três algarismos.
Para produzir escritas numéricas, alguns alunos recorrem à justaposição de escritas que já conhecem, organizando-as de acordo com a fala. Assim, por exemplo, para representar o 128, podem escrever 100 20 8 (cem/vinte/oito) ou 100 20 e 8 (cem/vinte e oito).
É importante que o professor dê a seus alunos a oportunidade de expor suas hipóteses sobre os números e as escritas numéricas, pois essas hipóteses constituem subsídios para a organização de atividades.
Dentre as situações que favorecem a apropriação da idéia de número pelos alunos, algumas se destacam. Uma delas consiste em levá-los à necessidade de comparar duas coleções do ponto de
vista da quantidade, seja organizando uma coleção que tenha tantos objetos quanto uma outra, seja organizando uma coleção que tenha o dobro, ou o triplo, etc., de uma outra, seja completando uma coleção para que ela tenha a mesma quantidade de objetos de uma outra.
Outra situação é aquela em que os alunos precisam situar algo numa listagem ordenada, seja para lembrar da posição de um dado objeto numa linha, ou de um jogador num jogo em que se contem pontos, ou para ordenar uma seqüência de fatos, do primeiro ao último. Nessas situações, utilizarão diferentes estratégias como a contagem, o pareamento, a estimativa, o arredondamento
e, dependendo da quantidade, até a correspondência de agrupamentos.
Os procedimentos elementares de cálculo, por sua vez, também contribuem para o desenvolvimento da concepção do número. Isso ocorre, por exemplo, quando precisam identificar deslocamentos (avanços e recuos) numa pista graduada; ou então quando necessitam indicar a quantidade de elementos de coleções que juntam, separam, repartem.
Explorar as escritas pessoais elaboradas pelos alunos não exclui outro aspecto fundamental que é o de caminhar em direção às escritas convencionais, sem as quais não terão referência para se apropriarem do conhecimento socialmente estabelecido.
As características do sistema de numeração — agrupamentos de 10 em 10, valor posicional — serão observadas, principalmente, por meio da análise das representações numéricas e dos
procedimentos de cálculo em situações-problema.
É no trabalho com números “maiores” e menos freqüentes na vivência das crianças que será necessário explorar os procedimentos de leitura, associando-os à representação escrita do número.
O recurso à história da numeração e aos instrumentos como ábacos e calculadoras pode contribuir para um trabalho interessante com os números e, em especial, com o sistema de numeração.

Números Racionais

A abordagem dos números racionais no segundo ciclo tem como objetivo principal levar os alunos a perceberem que os números naturais, já conhecidos, são insuficientes para resolver determinados problemas.
Explorando situações em que usando apenas números naturais não conseguem exprimir a medida de uma grandeza ou o resultado de uma divisão, os alunos identificam nos números racionais a possibilidade de resposta a novos problemas.
A construção da idéia de número racional é relacionada à divisão entre dois números inteiros, excluindo-se o caso em que o divisor é zero. Ou seja, desde que um número represente o quociente entre dois inteiros quaisquer (o segundo não nulo), ele é um número racional. Como neste ciclo trabalha-se apenas com os naturais e ainda não com os inteiros negativos, os números racionais a serem tratados são quocientes de números naturais.
No entanto, em que pese às relações entre números naturais e racionais, a aprendizagem dos números racionais supõe rupturas com idéias construídas pelos alunos acerca dos números naturais, e, portanto, demanda tempo e uma abordagem adequada.
Ao raciocinar sobre os números racionais como se fossem naturais, os alunos acabam tendo que enfrentar vários obstáculos:
• um deles está ligado ao fato de que cada número racional pode ser representado por diferentes (e infinitas) escritas fracionárias; por exemplo, 1/3, 2/6, 3/9 e 4/12 são diferentes representações de um mesmo número;
• outro diz respeito à comparação entre racionais: acostumados com a relação 3 > 2, terão que construir uma escrita que lhes parece contraditória, ou seja, 1/3 < 1/2;
• se o “tamanho” da escrita numérica era um bom indicador da ordem de grandeza no caso dos números naturais (8.345 > 41), a comparação entre 2,3 e 2,125 já não obedece o mesmo critério;
• se ao multiplicar um número natural por outro natural (sendo este diferente de 0 ou 1) a expectativa era a de encontrar um número maior que ambos, ao multiplicar 10 por 1/2 se surpreenderão ao ver que o resultado é menor do que 10;
• se a seqüência dos números naturais permite falar em sucessor e antecessor, para os racionais isso não faz sentido, uma vez que entre dois números racionais quaisquer é sempre possível encontrar outro racional; assim, o aluno deverá perceber que entre 0,8 e 0,9 estão números como 0,81, 0,815 ou 0,87.
Ao optar por começar o estudo dos racionais pelo seu reconhecimento no contexto diário,
deve-se observar que eles aparecem no cotidiano das pessoas muito mais em sua representação decimal (números com vírgula) do que na forma fracionária.
O advento das calculadoras fez com que as representações decimais se tornassem bastante frequentes. Desse modo, um trabalho interessante consiste em utilizá-las para o estudo das representações decimais na escola. Por meio de atividades em que os alunos são convidados a dividir, usando a calculadora, 1 por 2, 1 por 3, 1 por 4, 1 por 5, etc., e a levantar hipóteses sobre as escritas que aparecem no visor da calculadora, eles começarão a interpretar o significado dessas representações decimais.
Usando a calculadora, também perceberão que as regras do sistema de numeração decimal, utilizadas para representar números naturais, podem ser aplicadas para se obter a escrita dos racionais na forma decimal, acrescentando-se novas ordens à direita da unidade (a primeira ordem) e de forma decrescente.
Além da exploração dessas escritas pelo uso da calculadora, os alunos também estabelecerão relação entre elas e as representações referentes ao sistema monetário e aos sistemas de medida.
Já o contato com representações fracionárias é bem menos freqüente; na vida cotidiana o uso de frações limita-se a metades, terços, quartos e mais pela via da linguagem oral do que das representações.
A prática mais comum para explorar o conceito de fração é a que recorre a situações em que está implícita a relação parte-todo; é o caso das tradicionais divisões de um chocolate, ou de uma pizza, em partes iguais.
A relação parte-todo se apresenta, portanto, quando um todo se divide em partes (equivalentes em quantidade de superfície ou de elementos). A fração indica a relação que existe entre um número de partes e o total de partes.
Outro significado das frações é o de quociente; baseia-se na divisão de um natural por outro (a : b = a / b; b ¹ 0). Para o aluno, ela se diferencia da interpretação anterior, pois dividir um chocolate em 3 partes e comer 2 dessas partes é uma situação diferente daquela em que é preciso dividir 2 chocolates para 3 pessoas. No entanto, nos dois casos, o resultado é representado pela mesma notação: 2/3.
Uma terceira situação, diferente das anteriores, é aquela em que a fração é usada como uma espécie de índice comparativo entre duas quantidades de uma grandeza, ou seja, quando é interpretada como razão. Isso ocorre, por exemplo, quando se lida com informações do tipo “2 de cada 3 habitantes de uma cidade são imigrantes”.
Outros exemplos podem ser dados: a possibilidade de sortear uma bola verde de uma caixa em que há 2 bolas verdes e 8 bolas de outras cores (2 em 10); o trabalho com escalas em mapas (a escala é de 1 cm para 100 m); a exploração da porcentagem (40 em cada 100 alunos da escola gostam de futebol).
A essas três interpretações, bastante interessantes de serem exploradas neste ciclo, acrescenta-se mais uma, que será trabalhada nos ciclos posteriores. Trata-se do significado da fração como operador, ou seja, quando ela desempenha um papel de transformação, algo que atua sobre uma situação e a modifica. Essa ideia está presente, por exemplo, num problema do tipo “que número devo multiplicar por 3 para obter 2”.
Esse breve resumo das interpretações mostra que a construção do conceito de número racional pressupõe uma organização de ensino que possibilite experiências com diferentes significados e representações, o que demanda razoável espaço de tempo; trata-se de um trabalho que apenas será iniciado no segundo ciclo do ensino fundamental e consolidado nos dois ciclos finais.

Operações com Números Naturais
ADIÇÃO E SUBTRAÇÃO: SIGNIFICADOS

O desenvolvimento da investigação na área da Didática da Matemática traz novas referências para o tratamento das operações. Entre elas, encontram-se as que apontam os problemas aditivos e subtrativos como aspecto inicial a ser trabalhado na escola, concomitantemente ao trabalho de construção do significado dos números naturais.
A justificativa para o trabalho conjunto dos problemas aditivos e subtrativos baseia-se no fato de que eles compõem uma mesma família, ou seja, há estreitas conexões entre situações aditivas e subtrativas. A título de exemplo, analisa-se a seguinte situação:
“João possuía 8 figurinhas e ganhou mais algumas num jogo. Agora ele tem 13 figurinhas”1.
Ao observar as estratégias de solução empregadas pelos alunos, pode-se notar que a descoberta de quantas figurinhas João ganhou, às vezes, é encontrada pela aplicação de um procedimento aditivo, e, outras vezes, subtrativo.
Isso evidencia que os problemas não se classificam em função unicamente das operações a eles relacionadas a priori, e sim em função dos procedimentos utilizados por quem os soluciona.
Outro aspecto importante é o de que a dificuldade de um problema não está diretamente relacionada à operação requisitada para a sua solução. É comum considerar-se que problemas aditivos são mais simples para o aluno do aqueles que envolvem subtração.
Mas a análise de determinadas situações pode mostrar o contrário:
— Carlos deu 5 figurinhas a José e ainda ficou com 8 figurinhas. Quantas figurinhas Carlos tinha inicialmente?
— Pedro tinha 9 figurinhas. Ele deu 5 figurinhas a Paulo. Com quantas figurinhas ele ficou?
O primeiro problema, que é resolvido por uma adição, em geral se apresenta como mais difícil do que o segundo, que freqüentemente é resolvido por uma subtração.
Pelo aspecto do cálculo, adição e subtração também estão intimamente relacionadas. Para calcular mentalmente 40 - 26, alguns alunos recorrem ao procedimento subtrativo de decompor o número 26 e subtrair primeiro 20 e depois 6; outros pensam em um número que devem juntar a 26 para se obter 40, recorrendo neste caso a um procedimento aditivo.
A construção dos diferentes significados leva tempo e ocorre pela descoberta de diferentes procedimentos de solução. Assim, o estudo da adição e da subtração deve ser proposto ao longo dos dois ciclos, juntamente com o estudo dos números e com o desenvolvimento dos procedimentos de cálculo, em função das dificuldades lógicas, específicas a cada tipo de problema, e dos procedimentos de solução de que os alunos dispõem.

1. As situações que aparecem como exemplos neste texto têm apenas a função de evidenciar os aspectos fundamentais e as diferenças existentes entre os significados das operações. No trabalho escolar, elas devem estar incorporadas a outras, mais ricas, contextualizadas, que possibilitem interpretação, análise, descoberta e verificação de estratégias.

Dentre as situações que envolvem adição e subtração a serem exploradas nesses dois ciclos, podem-se destacar, para efeito de análise e sem qualquer hierarquização, quatro grupos:
Num primeiro grupo, estão as situações associadas à ideia de combinar dois estados para obter um terceiro, mais comumente identificada como ação de “juntar”.
Exemplo:
— Em uma classe há 15 meninos e 13 meninas. Quantas crianças há nessa classe?
A partir dessa situação é possível formular outras duas, mudando-se a pergunta. As novas situações são comumente identificadas como ações de “separar/tirar”. Exemplos:
— Em uma classe há alguns meninos e 13 meninas, no total são 28 alunos. Quantos meninos há nessa classe?
— Em uma classe de 28 alunos, 15 são meninos. Quantas são as meninas?
Num segundo grupo, estão as situações ligadas à ideia de transformação, ou seja, alteração de um estado inicial, que pode ser positiva ou negativa.
Exemplos:
— Paulo tinha 20 figurinhas. Ele ganhou 15 figurinhas num jogo. Quantas figurinhas ele tem agora? (transformação positiva).
— Pedro tinha 37 figurinhas. Ele perdeu 12 num jogo. Quantas figurinhas ele tem agora? (transformação negativa).
Cada uma dessas situações pode gerar outras:
— Paulo tinha algumas figurinhas, ganhou 12 no jogo e ficou com 20. Quantas figurinhas ele possuía?
— Paulo tinha 20 figurinhas, ganhou algumas e ficou com 27. Quantas figurinhas ele ganhou?
— No início de um jogo, Pedro tinha algumas figurinhas. No decorrer do jogo ele perdeu 20 e terminou o jogo com 7 figurinhas. Quantas figurinhas ele possuía no início do jogo?
— No início de um jogo Pedro tinha 20 figurinhas. Ele terminou o jogo com 8 figurinhas. O que aconteceu no decorrer do jogo?
Num terceiro grupo, estão as situações ligadas à idéia de comparação.
Exemplo:
— No final de um jogo, Paulo e Carlos conferiram suas figurinhas. Paulo tinha 20 e Carlos tinha 10 a mais que Paulo. Quantas eram as figurinhas de Carlos?
Se se alterar a formulação do problema e a proposição da pergunta, incorporando ora dados positivos, ora dados negativos, podem-se gerar várias outras situações:
— Paulo e Carlos conferiram suas figurinhas. Paulo tem 12 e Carlos, 7. Quantas figurinhas Carlos deve ganhar para ter o mesmo número que Paulo?
— Paulo tem 20 figurinhas. Carlos tem 7 figurinhas a menos que Paulo. Quantas figurinhas tem Carlos?
Num quarto grupo, estão as situações que supõem a compreensão de mais de uma transformação (positiva ou negativa).
Exemplo:
— No início de uma partida, Ricardo tinha um certo número de pontos. No decorrer do jogo ele ganhou 10 pontos e, em seguida, ganhou 25 pontos. O que aconteceu com seus pontos no final do jogo?
Também neste caso as variações positivas e negativas podem levar a novas situações:
— No início de uma partida, Ricardo tinha um certo número de pontos. No decorrer do jogo ele perdeu 20 pontos e ganhou 7 pontos. O que aconteceu com seus pontos no final do jogo?
— Ricardo iniciou uma partida com 15 pontos de desvantagem. Ele terminou o jogo com 30 pontos de vantagem. O que aconteceu durante o jogo?
Embora todas estas situações façam parte do campo aditivo, elas colocam em evidência níveis diferentes de complexidade. Note-se que no início da aprendizagem escolar os alunos ainda não dispõem de conhecimentos e competências para resolver todas elas, necessitando de uma ampla experiência com situações-problema que os leve a desenvolver raciocínios mais complexos por meio de tentativas, explorações e reflexões.
Desse modo, o trabalho com as operações deve ser planejado coletivamente pelos professores, não apenas para ser desenvolvido nos dois primeiros ciclos, mas também na quinta e sexta séries.

MULTIPLICAÇÃO E DIVISÃO: SIGNIFICADOS

Uma abordagem freqüente no trabalho com a multiplicação é o estabelecimento de uma relação entre ela e a adição. Nesse caso, a multiplicação é apresentada como um caso particular da adição porque as parcelas envolvidas são todas iguais. Por exemplo:
— Tenho que tomar 4 comprimidos por dia, durante 5 dias. Quantos comprimidos preciso comprar?
A essa situação associa-se a escrita 5 x 4, na qual o 4 é interpretado como o número que se repete e o 5 como o número que indica a quantidade de repetições.
Ou seja, tal escrita apresenta-se como uma forma abreviada da escrita 4 + 4 + 4 + 4 + 4.
A partir dessa interpretação, definem-se papéis diferentes para o multiplicando (o número que se repete) e para o multiplicador (o número de repetições), não sendo possível tomar um pelo outro. No exemplo dado, não se pode tomar o número de comprimidos pelo número de dias. Saber distinguir o valor que se repete do número de repetições é um aspecto importante para a resolução de situações como esta.
No entanto, essa abordagem não é suficiente para que os alunos compreendam e resolvam outras situações relacionadas à multiplicação, mas apenas aquelas que são essencialmente situações aditivas.
Além disso, ela provoca uma ambiguidade em relação à comutatividade da multiplicação.
Embora, matematicamente, a x b = b x a, no contexto de situações como a que foi analisada (dos comprimidos) isso não ocorre.
Assim como no caso da adição e da subtração, destaca-se a importância de um trabalho conjunto de problemas que explorem a multiplicação e a divisão, uma vez que há estreitas conexões entre as situações que os envolvem e a necessidade de trabalhar essas operações com base em um campo mais amplo de significados do que tem sido usualmente realizado.
Dentre as situações relacionadas à multiplicação e à divisão, a serem exploradas nestes dois ciclos, podem-se destacar, para efeito de análise e sem qualquer hierarquização, quatro grupos:
Num primeiro grupo, estão as situações associadas ao que se poderia denominar multiplicação comparativa.
Exemplos:
— Pedro tem R$ 5,00 e Lia tem o dobro dessa quantia. Quanto tem Lia?
— Marta tem 4 selos e João tem 5 vezes mais selos que ela. Quantos selos tem João?
A partir dessas situações de multiplicação comparativa é possível formular situações que envolvem a divisão. Exemplo:
— Lia tem R$ 10,00. Sabendo que ela tem o dobro da quantia de Pedro, quanto tem Pedro?
Num segundo grupo, estão as situações associadas à comparação entre razões, que, portanto, envolvem a ideia de proporcionalidade.
Os problemas que envolvem essa ideia são muito freqüentes nas situações cotidianas e, por isso, são mais bem compreendidos pelos alunos.
Exemplos:
— Marta vai comprar três pacotes de chocolate. Cada pacote custa R$ 8,00. Quanto ela vai pagar pelos três pacotes? (A ideia de proporcionalidade está presente: 1 está para 8, assim como 3 está para 24.)
— Dois abacaxis custam R$ 2,50. Quanto pagarei por 4 desses abacaxis? (Situação em que o aluno deve perceber que comprará o dobro de abacaxis e deverá pagar — se não houver desconto
— o dobro, R$ 5,00, não sendo necessário achar o preço de um abacaxi para depois calcular o de 4.)
A partir dessas situações de proporcionalidade, é possível formular outras que vão conferir significados à divisão, associadas às ações “repartir (igualmente)” e “determinar quanto cabe”.
Exemplos associados ao primeiro problema:
— Marta pagou R$ 24,00 por 3 pacotes de chocolate. Quanto custou cada pacote? (A quantia em dinheiro será repartida igualmente em 3 partes e o que se procura é o valor de uma parte.)
— Marta gastou R$ 24,00 na compra de pacotes de chocolate que custavam R$ 3,00 cada um. Quantos pacotes de chocolate ela comprou? (Procura-se verificar quantas vezes 3 cabe em 24, ou seja, identifica-se a quantidade de partes.)
Num terceiro grupo, estão as situações associadas à configuração retangular.
Exemplos:
— Num pequeno auditório, as cadeiras estão dispostas em 7 fileiras e 8 colunas. Quantas cadeiras há no auditório?
— Qual é a área de um retângulo cujos lados medem 6 cm por 9 cm?
Nesse caso, a associação entre a multiplicação e a divisão é estabelecida por meio de situações tais como:
— As 56 cadeiras de um auditório estão dispostas em fileiras e colunas. Se são 7 as fileiras, quantas são as colunas?
— A área de uma figura retangular é de 54 cm 2. Se um dos lados mede 6 cm, quanto mede o outro lado?
Num quarto grupo, estão as situações associadas à ideia de combinatória.
Exemplo:
— Tendo duas saias — uma preta (P) e uma branca (B) — e três blusas — uma rosa (R), uma azul (A) e uma cinza (C) —, de quantas maneiras diferentes posso me vestir?
Analisando-se esses problemas, vê-se que a resposta à questão formulada depende das combinações possíveis; no segundo, por exemplo, os alunos podem obter a resposta, num primeiro momento, fazendo desenhos, diagramas de árvore, até esgotar as possibilidades:

(P, R), (P, A), (P, C), (B, R), (B, A), (B, C):













Esse resultado que se traduz pelo número de combinações possíveis entre os termos iniciais evidencia um conceito matemático importante, que é o de produto cartesiano.
Note-se que por essa interpretação não se diferenciam os termos iniciais, sendo compatível a interpretação da operação com sua representação escrita. Combinar saias com blusas é o mesmo que combinar blusas com saias e isso pode ser expresso por 2 x 3 = 3 x 2.
A idéia de combinação também está presente em situações relacionadas com a divisão:
— Numa festa, foi possível formar 12 casais diferentes para dançar. Se havia 3 moças e todos os presentes dançaram, quantos eram os rapazes?
Os alunos costumam solucionar esse tipo de problema por meio de tentativas apoiadas em procedimentos multiplicativos, muitas vezes representando graficamente o seguinte raciocínio:
— Um rapaz e 3 moças formam 3 pares.
— Dois rapazes e 3 moças formam 6 pares.
— Três rapazes e 3 moças formam 9 pares.
— Quatro rapazes e 3 moças formam 12 pares.
Levando-se em conta tais considerações, pode-se concluir que os problemas cumprem um importante papel no sentido de propiciar as oportunidades para as crianças, do primeiro e segundo ciclos, interagirem com os diferentes significados das operações, levando-as a reconhecer que um mesmo problema pode ser resolvido por diferentes operações, assim como uma mesma operação pode estar associada a diferentes problemas.

REPERTÓRIO BÁSICO PARA O
DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO

Uma boa habilidade em cálculo depende de consistentes pontos de apoio, em que se destacam o domínio da contagem e das combinações aritméticas, conhecidas por denominações diversas como tabuadas, listas de fatos fundamentais, leis, repertório básico, etc.
Evidentemente, a aprendizagem de um repertório básico de cálculos não se dá pela simples memorização de fatos de uma dada operação, mas sim pela realização de um trabalho que envolve a construção, a organização e, como conseqüência, a memorização compreensiva desses fatos.
A construção apóia-se na resolução de problemas e confere significados a escritas do tipo a + b = c, a x b = c. Já a organização dessas escritas e a observação de regularidades facilita a memorização compreensiva.
Ao construírem e organizarem um repertório básico os alunos começam a perceber, intuitivamente, algumas propriedades das operações, tais como a associatividade e a comutatividade, na adição e multiplicação. A comutatividade na adição é geralmente identificada antes de qualquer apresentação pelo professor. Isso pode ser notado em situações em que, ao adicionarem 4 + 7, invertem os termos para começar a contagem pelo maior número.
Também algumas regularidades, presentes nas operações, começam a ser percebidas, tais como: observar que, nas multiplicações por 2, todos os resultados são pares; que, na tabuada do cinco, os resultados terminam em zero ou em cinco, etc.
Dentre os procedimentos que os alunos costumam utilizar na construção e organização desse repertório, podem-se destacar:
— contar de dois em dois, três em três para construir as multiplicações por 2, por 3...;
— usar resultados de adições de números iguais, como 4 + 4, 7 + 7 para cálculos com números maiores como 40 + 40, 700 + 700, etc.;
— “dobrar e adicionar um” para se chegar ao resultado de 5 + 6 como sendo 5 + 5 + 1;
— adicionar pares de números iguais, como, por exemplo, 8 + 8, para calcular 7 + 9;
— adicionar 10 e subtrair 1 para somar 9;
— aplicar as adições que resultam 10 em situações como 7 + 4, calculando (7 + 3) + 1 (um dos números é decomposto de maneira a completar um outro para formar dez);
— usar regras ou padrões na construção de listas, como, por exemplo:
07 + 5 = 12 = 5 + 07
17 + 5 = 22 = 5 + 17
27 + 5 = 32 = 5 + 27
37 + 5 = 42 = 5 + 37;
— encontrar resultados de multiplicações pela adição ou pela subtração: 6 x 8 pode ser calculado como 5 x 8 + 8 = 40 + 8 = 48, e 9 x 7 como 10 x 7 - 7 = 70 - 7 = 63;
— decompor um número para multiplicá-lo, usando a propriedade distributiva da multiplicação em relação à adição: 12 x 5 = (10 x 5) + ( 2 x 5) ou (6 x 5) + (6 x 5).
A construção dos fatos da subtração e da divisão deve ser realizada, buscando-se compreender suas relações com a adição e a multiplicação, utilizando-se como recurso a exploração de estratégias semelhantes usadas no cálculo dessas operações. Nesse trabalho também é importante que os alunos observem:
— a validade da “invariância da diferença”: adicionar ou subtrair um mesmo valor aos dois termos de uma subtração não altera a diferença — 16 - 9 dá o mesmo resultado que 17 - 10;
— a validade de “simplificar” os termos de uma divisão para obter o quociente (16 : 4 dá o mesmo resultado que 8 : 2 e 4 : 1);
— a não-validade, na subtração e na divisão, de propriedades presentes na adição e na multiplicação, tais como a comutatividade e a associatividade.
O foco do trabalho de construção de um repertório básico para o desenvolvimento do cálculo consiste em identificar as estratégias pessoais utilizadas pelos alunos e fazer com que eles evidenciem sua compreensão por meio de análises e comparações, explicitando-as oralmente. Já a organização desse repertório dá-se por meio da exploração das escritas numéricas e apóia-se na contagem, no uso de materiais didáticos e da reta numérica.

AMPLIAÇÃO DOS PROCEDIMENTOS DE CÁLCULO

A construção de um repertório básico constitui suporte para a ampliação dos diferentes procedimentos e tipos de cálculos que o aluno vai desenvolver ao longo dos ciclos iniciais: cálculo mental ou escrito, exato ou aproximado.
Os diferentes procedimentos e tipos de cálculo relacionam-se e complementam-se. O cálculo escrito, para ser compreendido, apóia-se no cálculo mental e nas estimativas e aproximações. Por sua vez, as estratégias de cálculo mental, pela sua própria natureza, são limitadas. É bastante difícil, principalmente tratando-se de cálculos envolvendo números com vários dígitos, armazenar na memória uma grande quantidade de resultados. Assim, a necessidade de registro de resultados parciais acaba originando procedimentos de cálculo escrito.
Nos dois primeiros ciclos, o objetivo principal do trabalho com o cálculo consiste em fazer com que os alunos construam e selecionem procedimentos adequados à situação-problema apresentada, aos números e às operações nela envolvidos. Por exemplo: numa situação de compra em um supermercado, para saber se é possível continuar comprando ou não, em função do dinheiro de que se dispõe, basta fazer um cálculo mental aproximado; enquanto para saber qual é o saldo ou o débito em uma conta bancária recorre-se a um procedimento de cálculo exato.
Assim, é recomendável que a organização do estudo do cálculo privilegie um trabalho que explore concomitantemente procedimentos de cálculo mental e cálculo escrito, exato e aproximado, de tal forma que o aluno possa perceber gradativamente as relações existentes entre eles e com isso aperfeiçoar seus procedimentos pessoais, para torná-los cada vez mais práticos, aproximando os aos das técnicas usuais.
A importância do estudo do cálculo, em suas diferentes modalidades desde as séries iniciais, justifica-se pelo fato de que é uma atividade básica na formação do indivíduo, visto que:
— possibilita o exercício de capacidades mentais como memória, dedução, análise, síntese, analogia e generalização;
— permite a descoberta de princípios matemáticos como a equivalência, a decomposição, a igualdade e a desigualdade;
— propicia o desenvolvimento de conceitos e habilidades fundamentais para aprofundar os conhecimentos matemáticos;
— favorece o desenvolvimento da criatividade, da capacidade para tomar decisões e de atitudes de segurança para resolver problemas numéricos cotidianos.

Cálculo mental

Os procedimentos de cálculo mental constituem a base do cálculo aritmético que se usa no cotidiano.
De forma simples, pode-se dizer que se calcula mentalmente quando se efetua uma operação, recorrendo-se a procedimentos confiáveis, sem os registros escritos e sem a utilização de instrumentos.
Por exemplo, a adição entre 43.000 e 19.000 pode ser calculada de formas diferentes, como, por exemplo:
43.000 mais 10.000, que é igual a 53.000              43.000 mais 20.000, que é igual a 63.000
53.000 mais 9.000 que é igual a 62.000                 63.000 menos 1.000 que é igual a 62.000

O cálculo mental apóia-se no fato de que existem diferentes maneiras de calcular e pode-se escolher a que melhor se adapta a uma determinada situação, em função dos números e das operações envolvidas. Assim, cada situação de cálculo constitui-se um problema aberto que pode ser solucionado de diferentes maneiras, recorrendo-se a procedimentos originais para chegar ao resultado.
No cálculo mental, a reflexão centra-se no significado dos cálculos intermediários e isso facilita a compreensão das regras do cálculo escrito. O exercício e a sistematização dos procedimentos de cálculo mental, ao longo do tempo, levam-no a ser utilizado como estratégia de controle do cálculo escrito.

Aproximações e estimativas

Grande parte do cálculo realizado fora da escola é feito a partir de procedimentos mentais, que nem sempre são levados em conta no trabalho escolar.
Nas situações práticas, freqüentemente, não se dispõe de lápis e papel, tampouco é necessário, pois a maioria das respostas não precisa ser exata, basta uma aproximação. Existem ainda as balanças e as calculadoras que informam resultados com precisão.
Por essas razões, uma das finalidades atuais do ensino do cálculo consiste em fazer com que os alunos desenvolvam e sistematizem procedimentos de cálculo por estimativa e estratégias de verificação e controle de resultados.
Para atender a esse objetivo, é primordial que aprendam a reconhecer se certos resultados relacionados a contagens, medidas, operações são ou não razoáveis em determinadas situações.
A estimativa constrói-se juntamente com o sentido numérico e com o significado das operações e muito auxilia no desenvolvimento da capacidade de tomar decisões. O trabalho com estimativas supõe a sistematização de estratégias. Seu desenvolvimento e aperfeiçoamento depende de um trabalho contínuo de aplicações, construções, interpretações, análises, justificativas e verificações a partir de resultados exatos.
Desde as primeiras experiências com quantidades e medidas, as estimativas devem estar presentes em diversas estratégias que levem os alunos a perceber o significado de um valor aproximado, decidir quando é conveniente usá-lo e que aproximação é pertinente a uma determinada situação, como, por exemplo, identificar unidades de medida adequadas às grandezas.
Identificando intervalos, que tornam uma estimativa aceitável ou não, os alunos aprendem a justificar e comprovar suas opiniões e vão refinando suas habilidades em cálculo. Por isso as estimativas devem ir além da simples identificação das relações “maior que”, “menor que” e centrar-se na relação “estar entre”.
O uso associado das calculadoras e dos procedimentos de estimativa é de grande importância, porque oferece aos alunos informações para que eles percebam se utilizaram corretamente o instrumento e se o resultado obtido é razoável. Assim, a utilização da estimativa pode reduzir a incidência de erros e evitar o uso mecânico desse instrumento.
Os procedimentos de cálculo por estimativa desenvolvem-se concomitantemente aos processos de cálculo mental: pelo reconhecimento da grandeza numérica, por meio de decomposições dos números, pelo estabelecimento de relações de dobro e metade, entre outros.
O cálculo por estimativas apóia-se em aspectos conceituais referentes aos números e às operações (ordem de grandeza, valor posicional, proporcionalidade e equivalência), em procedimentos (como decompor, substituir, arredondar, compensar), na aplicação de estratégias de cálculo mental.
Alguns exemplos de atividades que exploram aproximações e estimativas:
— estimar um produto arredondando um dos fatores (3 x 29 é um resultado próximo de 3 x 30);
— posicionar um número racional entre números naturais (0,7 está entre 0 e 1);
— ao resolver 45 - 19 ajuda saber que 45 - 20 = 25? De que serve pensar que 19 é o mesmo que 15 + 4? Seguir contando de 19 a 45 ajuda a obter o resultado? Esse é um procedimento prático?

Cálculo escrito

Na atividade de resolução de problemas é comum que os alunos construam registros numéricos para expressar os procedimentos de cálculo mental que utilizam. A análise desses registros evidencia, muitas vezes, o domínio de conhecimentos matemáticos que são a base para o cálculo escrito e particularmente para a compreensão das técnicas de cálculo que usualmente são ensinadas na escola.
Por exemplo, se para multiplicar 14 por 7 o aluno faz 7 x 7 + 7 x 7 isso mostra que, nessa situação, ele recorre à decomposição de um dos termos e à distributividade para encontrar o resultado, de uma forma bastante simples. Partindo desse raciocínio é possível fazer com que ele verifique que existe uma outra forma de decompor o número que também leva à obtenção do resultado: 10 x 7 + 4 x 7. Esta forma de decomposição — nas unidades das diversas ordens que compõem o número — é utilizada na técnica usual da multiplicação.
Assim como outros procedimentos de cálculo, as técnicas operatórias usualmente ensinadas na escola também apoiam-se nas regras do sistema de numeração decimal e na existência de propriedades e regularidades presentes nas operações. Porém, muitos dos erros cometidos pelos alunos são provenientes da não-disponibilidade desses conhecimentos ou do não-reconhecimento de sua presença no cálculo. Isso acontece, provavelmente, porque não se exploram os registros pessoais dos alunos, que são formas intermediárias para se chegar ao registro das técnicas usuais.
Alguns recursos podem auxiliar a compreensão das técnicas operatórias:
— A escrita decomposta dos números ajuda a evidenciar o estabelecimento de correspondência entre as unidades das diversas ordens, no registro da técnica da adição e da subtração; também evidencia o “transporte”, no caso da adição, e o “empréstimo”, no caso da subtração, à ordem imediatamente superior.
   200      50      5
+100       40      8
__________________
  300    + 90 + 13
  300  + 100   + 3
  400      + 3

  200      140      15
  300        50        5
____________________
-100         60        8
  100      + 80    + 7

— A aplicação da invariância da diferença — adicionar (ou subtrair) um mesmo número aos dois termos de uma subtração não altera a diferença — permite a compreensão de uma das técnicas utilizadas para subtrair.
300     150     15
200       70
_____________________
-100      60      8
100    + 80   + 7

— A explicitação de que a propriedade distributiva da multiplicação em relação à adição é a base da técnica operatória da multiplicação dá o apoio necessário ao entendimento da técnica.

              20                 4
x            10                 2
              40                 8
200        40
_______________________
200     + 80             + 8

— A obtenção de quocientes parciais que depois são adicionados é uma forma de efetuar a
divisão:


O cálculo deve ser incentivado nas mais diferentes situações de aprendizagem. O recurso às calculadoras é uma delas. Na elaboração de atividades envolvendo o uso de calculadoras é importante que a criança seja colocada diante de desafios e estimulada a explicitar, verbalmente ou por escrito, os procedimentos que utiliza. A título de exemplo, apresentam-se algumas atividades que podem ser feitas usando a calculadora:
— A partir de um número registrado no visor da calculadora, sem apagá-lo, fazer aparecer um outro número; por exemplo, transformar:
a) 459 em 409
b) 7.403 em 7.003
c) 354 em 9.054
— Eliminar o “7” das seguintes escritas numéricas, sem apagá-las: 3.074, 32.479, 879.
— Descobrir o resultado das operações, nas condições dadas:
a) 273 + 129, sem usar a tecla que indica adição;
b) 1.000 : 43, usando só a tecla que indica a adição; só a tecla que indica a multiplicação; só a tecla que indica a divisão;
c) partindo do número 572, com uma única operação, obter: 502; 5.720; 57, 2.
Operações com Números Racionais

OS SIGNIFICADOS

Muitos dos significados das operações, analisados em situações que envolvem números naturais, podem ser estendidos às situações com números racionais.
Assim, a adição e a subtração são exploradas em situações de transformação, de combinação, de comparação. Também a multiplicação e a divisão são exploradas em diferentes situações como razão, comparação, configuração retangular. Apenas o significado da multiplicação como procedimento combinatório não é extensivo aos números racionais não-inteiros.

O CÁLCULO COM NÚMEROS RACIONAIS

Assim como se podem estender as regras do sistema de numeração decimal para facilitar a compreensão dos números racionais na forma decimal, os procedimentos de cálculo empregados nos cálculos com números naturais também podem ser utilizados como recursos para realizar cálculos envolvendo números decimais.
Além disso, é importante que as atividades de cálculo com números decimais estejam sempre vinculadas a situações contextualizadas, de modo que seja possível fazer uma estimativa ou enquadramento do resultado, utilizando números naturais mais próximos.
Assim, por exemplo, diante da situação: “Qual é o valor do perímetro de uma figura retangular que mede 13,2 cm de um lado e 7,7 cm do outro?”, o aluno pode recorrer a um procedimento por estimativa, calculando um resultado aproximado ( 2 x 13 + 2 x 8), que lhe dará uma boa referência para conferir o resultado exato, obtido por meio de um procedimento de cálculo escrito.
Outra recomendação é que os alunos desenvolvam uma boa base em leitura e escrita de números decimais e acompanhem a realização do cálculo escrito, com verbalizações que auxiliem a perceber o valor posicional das ordens que compõem os números com os quais estão operando.
Também a compreensão de deslocamentos da vírgula, uma, duas, três ordens para a direita ou para a esquerda, nos números decimais, pode ser facilitada se os alunos souberem dividir e multiplicar mentalmente por 10, 100 ou 1.000.
Em relação ao cálculo de porcentagem nos dois primeiros ciclos, alguns recursos mais simples e evidentes para as crianças podem ser explorados, deixando para os ciclos posteriores a apresentação de técnicas convencionais.
Partindo de um trabalho em que o aluno compreenda o significado da expressão “dez por cento”, ele pode, por exemplo, calcular 35% de 120, achando 10% de 120 (12), 5% de 120 (metade de 12) e adicionando as parcelas: 12 + 12 + 12 + 6 = 42.

Espaço e Forma

Estudos sobre a construção do espaço pela criança destacam que a estruturação espacial se inicia, desde muito cedo, pela constituição de um sistema de coordenadas relativo ao seu próprio corpo. É a fase chamada egocêntrica, no sentido de que, para se orientar, a criança é incapaz de considerar qualquer outro elemento, que não o seu próprio corpo, como ponto de referência. Aos poucos, ela toma consciência de que os diferentes aspectos sob os quais os objetos se apresentam para ela são perfis de uma mesma coisa, ou seja, ela gradualmente toma consciência dos movimentos de seu próprio corpo, de seu deslocamento.
Essa capacidade de deslocar-se mentalmente e de perceber o espaço de diferentes pontos de vista são condições necessárias à coordenação espacial e nesse processo está a origem das noções de direção, sentido, distância, ângulo e muitas outras essenciais à construção do pensamento geométrico.
Num primeiro momento, o espaço se apresenta para a criança de forma essencialmente prática: ela constrói suas primeiras noções espaciais por meio dos sentidos e dos movimentos.
Esse espaço percebido pela criança — espaço perceptivo, em que o conhecimento dos objetos resulta de um contato direto com eles — lhe possibilitará a construção de um espaço representativo
— em que ela é, por exemplo, capaz de evocar os objetos em sua ausência.
O ponto, a reta, o quadrado não pertencem ao espaço perceptivo. Podem ser concebidos de maneira ideal, mas rigorosamente não fazem parte desse espaço sensível. Pode-se então dizer que a Geometria parte do mundo sensível e o estrutura no mundo geométrico — dos volumes, das superfícies, das linhas e dos pontos.
A questão que se pode levantar, então, é: como passar de um espaço a outro?
É multiplicando suas experiências sobre os objetos do espaço em que vive que a criança aprenderá a construir uma rede de conhecimentos relativos à localização, à orientação, que lhe permitirá penetrar no domínio da representação dos objetos e, assim, distanciar-se do espaço sensorial ou físico. É o aspecto experimental que colocará em relação esses dois espaços: o sensível e o geométrico. De um lado, a experimentação permite agir, antecipar, ver, explicar o que se passa no espaço sensível, e, de outro, possibilita o trabalho sobre as representações dos objetos do 82 espaço geométrico e, assim, desprender-se da manipulação dos objetos reais para raciocinar sobre representações mentais.
A localização é apontada como um fator fundamental de apreensão do espaço e está ligada inicialmente à necessidade de levar em conta a orientação. Para orientar-se no espaço é preciso começar por se orientar a partir de seu próprio corpo. O conhecimento do corpo procede do conhecimento do espaço e, ao mesmo tempo, o torna possível.
No primeiro ciclo, é fundamental propor atividades para que o aluno seja estimulado a progredir na capacidade de estabelecer pontos de referência em seu entorno, para efeito de localização.
Isso pode ser feito por meio de atividades em que o aluno se situe no espaço, desloque-se nele, dê e receba instruções de localização, compreenda e utilize termos como esquerda, direita, giro, distância, deslocamento, acima, abaixo, ao lado, na frente, atrás, perto.
Outro trabalho rico que deve ser explorado é o de construção de itinerários, a partir de instruções dadas. É interessante que os alunos relatem oralmente como é o trajeto do lugar onde moram até a escola, desenhem o itinerário que fazem, sempre dando pontos de referência.
No segundo ciclo, o trabalho de localização pode ser aprofundado por meio de atividades que mostram a possibilidade de utilizarem-se malhas, diagramas, tabelas e mapas.
O estudo do espaço na escola pode ser feito a partir de atividades que tenham a ver com outras áreas, como a Geografia, a Astronomia, a Educação Física e a Arte.
Com relação às formas, experiências mostram que as crianças discriminam algumas formas geométricas bem mais cedo do que as reproduzem.
O pensamento geométrico desenvolve-se inicialmente pela visualização: as crianças conhecem o espaço como algo que existe ao redor delas. As figuras geométricas são reconhecidas por suas formas, por sua aparência física, em sua totalidade, e não por suas partes ou propriedades.
Por meio da observação e experimentação elas começam a discernir as características de uma figura, e a usar as propriedades para conceituar classes de formas.
Os objetos que povoam o espaço são a fonte principal do trabalho de exploração das formas.
O aluno deve ser incentivado, por exemplo, a identificar posições relativas dos objetos, a reconhecer no seu entorno e nos objetos que nele se encontram formas distintas, tridimensionais e bidimensionais, planas e não planas, a fazer construções, modelos ou desenhos do espaço (de diferentes pontos de vista) e descrevê-los.
Um trabalho constante de observação e construção das formas é que levará o aluno a perceber semelhanças e diferenças entre elas. Para tanto, diferentes atividades podem ser realizadas: compor e decompor figuras, perceber a simetria como característica de algumas figuras e não de outras, etc.
Dessa exploração resultará o reconhecimento de figuras tridimensionais (como cubos, paralelepípedos, esferas, cilindros, cones, pirâmides, etc.) e bidimensionais (como quadrados, retângulos, círculos, triângulos, pentágonos, etc.) e a identificação de suas propriedades.
Uma das possibilidades mais fascinantes do ensino de Geometria consiste em levar o aluno a perceber e valorizar sua presença em elementos da natureza e em criações do homem. Isso pode ocorrer por meio de atividades em que ele possa explorar formas como as de flores, elementos marinhos, casa de abelha, teia de aranha, ou formas em obras de arte, esculturas, pinturas, arquitetura, ou ainda em desenhos feitos em tecidos, vasos, papéis decorativos, mosaicos, pisos, etc.
As atividades geométricas podem contribuir também para o desenvolvimento de procedimentos de estimativa visual, seja de comprimentos, ângulos ou outras propriedades métricas das figuras, sem usar instrumentos de desenho ou de medida. Isso pode ser feito, por exemplo, por meio de trabalhos com dobraduras, recortes, espelhos, empilhamentos, ou pela modelagem de formas em argila ou massa.
Construir maquetes e descrever o que nelas está sendo representado é também uma atividade muito importante, especialmente no sentido de dar ao professor uma visão do domínio geométrico de seus alunos.
O uso de alguns softwares disponíveis também é uma forma de levar o aluno a raciocinar geometricamente.

Grandezas e Medidas

Nas situações cotidianamente vivenciadas pelos alunos, a existência de grandezas de naturezas diversas e a freqüente necessidade de estabelecer comparação entre elas, ou seja, de medi-las, justificam a necessidade do trabalho com este conteúdo.
A comparação de grandezas de mesma natureza que dá origem à ideia de medida e o desenvolvimento de procedimentos para o uso adequado de instrumentos, tais como balança, fita métrica e relógio, conferem a este conteúdo um acentuado caráter prático.
O trabalho com medidas dá oportunidade para abordar aspectos históricos da construção desse conhecimento, uma vez que, desde a Antiguidade, praticamente em todas as civilizações, a atividade matemática dedicou-se à comparação de grandezas.
Assim, por exemplo, a utilização do uso de partes do próprio corpo para medir (palmos, pés) é uma forma interessante a ser utilizada com os alunos, porque permite a reconstrução histórica de um processo em que a medição tinha como referência as dimensões do corpo humano, além de destacar aspectos curiosos como o fato de que em determinadas civilizações as medidas do corpo do rei eram tomadas como padrão.
No mundo atual, o Sistema Internacional de Unidades fundamenta-se a partir de unidades de base como: para massa, o quilograma; para comprimento, o metro; para tempo, o segundo; para temperatura, o kelvin; para intensidade elétrica, o ampère, etc.
É no contexto das experiências intuitivas e informais com a medição que o aluno constrói representações mentais que lhe permitem, por exemplo, saber que comprimentos como 10, 20 ou 30 centímetros são possíveis de se visualizar numa régua, que 1 quilo é equivalente a um pacote pequeno de açúcar ou que 2 litros correspondem a uma garrafa de refrigerante grande.
Essas representações mentais favorecem as estimativas e o cálculo, evitam erros e permitem aos alunos o estabelecimento de relações entre as unidades usuais, ainda que não tenham a compreensão plena dos sistemas de medidas.
Desde muito cedo as crianças têm experiências com as marcações do tempo (dia, noite, mês, hoje, amanhã, hora do almoço, hora da escola) e com as medidas de massa, capacidade, temperatura, etc., mas isso não significa que tenham construído uma sólida compreensão dos atributos mensuráveis de um objeto, nem que dominem procedimentos de medida. Desse modo, é importante que ao longo do ensino fundamental os alunos tomem contato com diferentes situações que os levem a lidar com grandezas físicas, para que identifiquem que atributo será medido e o que significa a medida.
Estruturas conceituais relativas às medidas são desenvolvidas por meio de experiências em que se enfatizam aspectos, tais como:
— o processo de medição é o mesmo para qualquer atributo mensurável; é necessário escolher uma unidade adequada, comparar essa unidade com o objeto que se deseja medir e, finalmente,
computar o número de unidades obtidas;
— a escolha da unidade é arbitrária, mas ela deve ser da mesma espécie do atributo que se deseja medir. Há unidades mais e menos adequadas e a escolha depende do tamanho do objeto e da precisão que se pretende alcançar;
— quanto maior o tamanho da unidade, menor é o número de vezes que se utiliza para medir um objeto;
— se, por um lado, pode-se medir usando padrões não-convencionais, por outro lado, os sistemas convencionais são importantes, especialmente em termos de comunicação.
Resolvendo situações-problema, o aluno poderá perceber a grandeza como uma propriedade de uma certa coleção de objetos; observará o aspecto da “conservação” de uma grandeza, isto é, o fato de que mesmo que o objeto mude de posição ou de forma, algo pode permanecer constante, como, por exemplo, sua massa. Reconhecerá também que a grandeza pode ser usada como um critério para ordenar uma determinada coleção de objetos: do mais comprido para o mais curto ou do mais pesado para o mais leve.
Finalmente, o estabelecimento da relação entre a medida de uma dada grandeza e um número é um aspecto de fundamental importância, pois é também por meio dele que o aluno ampliará seu domínio numérico e compreenderá a necessidade de criação de números fracionários, negativos, etc.

Tratamento da Informação

É cada vez mais freqüente a necessidade de se compreender as informações veiculadas, especialmente pelos meios de comunicação, para tomar decisões e fazer previsões que terão influência não apenas na vida pessoal, como na de toda a comunidade.
Estar alfabetizado, neste final de século, supõe saber ler e interpretar dados apresentados de maneira organizada e construir representações, para formular e resolver problemas que impliquem o recolhimento de dados e a análise de informações.
Essa característica da vida contemporânea traz ao currículo de Matemática uma demanda em abordar elementos da estatística, da combinatória e da probabilidade, desde os ciclos iniciais.
Nos dois primeiros ciclos, as atividades podem estar relacionadas a assuntos de interesse das crianças. Assim, por exemplo, trabalhando com datas de aniversário pode-se propor a organização de uma lista com as informações sobre o assunto. Um critério para organizar essa lista de nomes precisa ser definido: ordem alfabética, meninos e meninas, etc. Quando a lista estiver pronta, as crianças a analisam e avaliam se as informações podem ser encontradas facilmente. O professor pode então propor a elaboração de uma outra forma de comunicar os aniversariantes de cada mês, orientando-as, por exemplo, a construir um gráfico de barras.
Na construção de gráficos é importante verificar se os alunos conseguem ler as informações neles representadas. Para tanto, deve-se solicitar que deem sua interpretação sobre gráficos e propor que pensem em perguntas que possam ser respondidas a partir deles.
Outros dados referentes aos alunos, como peso, altura, nacionalidade dos avós, times de futebol de sua preferência, podem ser trabalhados e apresentados graficamente.
A construção de tabelas e gráficos que mostram o comportamento do tempo durante um período (dias ensolarados, chuvosos, nublados) e o acompanhamento das previsões do tempo pelos meios de comunicação indicam a possibilidade de se fazer algumas previsões, pela observação de acontecimentos. Pela observação da freqüência de ocorrência de um dado acontecimento, e um número razoável de experiências, podem-se desenvolver algumas noções de probabilidade.

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FICHA TÉCNICA

Coordenação
Ana Rosa Abreu, Maria Cristina Ribeiro Pereira, Maria Tereza Perez Soares, Neide Nogueira.

Elaboração
Aloma Fernandes Carvalho, Ana Amélia Inoue, Ana Rosa Abreu, Antonia Terra, Célia M. Carolino Pires, Circe Bittencourt, Cláudia R. Aratangy, Flávia I. Schilling, Karen Muller, Kátia L. Bräkling, Marcelo Barros da Silva, Maria AmábileMansutti, Maria Cecília Condeixa, Maria Cristina Ribeiro Pereira, Maria F. R. Fusari, Maria Heloisa C.T. Ferraz, Maria Isabel I. Soncini, Maria Tereza Perez Soares, Marina Valadão, Neide Nogueira, Paulo Eduardo Dias de Melo, Regina Machado, Ricardo Breim, Rosaura A. Soligo, Rosa Iavelberg, Rosely Fischmann, Silvia M. Pompéia, Sueli A. Furlan, Telma Weisz, Thereza C. H. Cury, Yara Sayão, Yves de La Taille.

Consultoria
César Coll
Délia Lerner de Zunino

Assessoria
Adilson O. Citelli, Alice Pierson, Ana M. Espinosa, Ana Teberosky, Artur Gomes de Morais, Guaraciaba Micheletti, Helena H. Nagamine Brandão, Hermelino M. Neder, Iveta M. B. Ávila Fernandes, Jean Hébrard, João Batista Freire, João C. Palma, José Carlos Libâneo, Ligia Chiappini, Lino de Macedo, Lúcia L. Browne Rego, Luis Carlos Menezes, Osvaldo Luiz Ferraz, Yves de La Taille e os 700 pareceristas - professores de universidades e especialistas de todo o País, que contribuíram com críticas e sugestões valiosas para o enriquecimento dos PCN.

Projeto gráfico
Vitor Nozek

Revisão e Copydesk
Cecilia Shizue Fujita dos Reis e Lilian Jenkino.

AGRADECIMENTOS

Alberto Tassinari, Ana Mae Barbosa, Anna Maria Lamberti, Andréa Daher, Antônio José Lopes, Aparecida Maria Gama Andrade, Barjas Negri, Beatriz Cardoso, Carlos Roberto Jamil Curi, Celma Cerrano, Cristina F. B. Cabral, Elba de Sá Barreto, Eunice Durham, Heloisa Margarido Salles, Hércules Abrão de Araújo, JocimarDaolio, Lais Helena Malaco, Lídia Aratangy, Márcia da Silva Ferreira, Maria Cecília Cortez C. de Souza, Maria Helena Guimarães de Castro, Marta Rosa Amoroso, Mauro Betti, Paulo Machado, Paulo Portella Filho, Rosana Paulillo, Sheila Aparecida Pereira dos Santos Silva, Sonia Carbonel, Sueli Teixeira Mello, ThéaStanderski, Vera Helena S. Grellet, Volmir Matos, Yolanda Vianna, Câmara do Ensino Básico do CNE, CNTE, CONSED e UNDIME.

Apoio

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Projeto BRA 95/014
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura UNESCO
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